Por que precisamos ouvir os indígenas na COP26

Os povos originários são nossa melhor aposta para conservar 80% da biodiversidade que o planeta ainda tem

Quem esteve de olho no noticiário nos últimos meses viu que voltou à pauta do Supremo Tribunal Federal a discussão do Marco Temporal Indígena, julgamento que é central para o futuro dos povos originários no Brasil porque legisla sobre o direito mais fundamental: a terra. Mulheres indígenas de 150 etnias organizaram protestos em Brasília contra o projeto e a COP26, que acontece em Glasgow, está recebendo a maior delegação de lideranças brasileiras da história da conferência. Eles estão lá para pautar a demarcação de terras indígenas e a importância dos povos tradicionais para criar e promover soluções climáticas efetivas baseadas na natureza e nas comunidades que vivem em harmonia com ela há séculos.

Precisamos reconhecer a contribuição desses povos para a preservação ambiental e para isso é fundamental demarcar seus territórios. “Nos colocamos contra falsas soluções baseadas em inovações tecnológicas elaboradas a partir da mesma lógica desenvolvimentista e produtivista que provoca as mudanças climáticas. Criticamos soluções que não reconheçam os povos indígenas e comunidades locais como o ponto central na defesa das florestas, da diminuição do desmatamento e das queimadas, e como essenciais para a garantir que a meta declarada de manter o aquecimento global abaixo de 1,5 graus Celsius”, destaca trecho da mensagem da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) aos líderes mundiais, empresários, gestores públicos e organizações da COP26.

Sônia Guajajara, destacada líder indigena brasileira, conhecida no Brasil e em todo o mundo e coordenadora da APIB, está em Glasgow, numa delegação coordenada pelos assessores estratégicos internacionais, Marcus Vinicius Ribeiro & Zachary Kuipers, do 4H5H MEDIA. “Não há solução para a crise climática sem a demarcação dos nossos territórios”, destaca, lembrando que, comparados às demais terras públicas, os territórios indígenas são os que mais contribuem para o equilíbrio climático. “Então nós precisamos que o mundo inteiro escute o que os povos indígenas têm a dizer”, completa, em entrevista para o novo episódio do podcast Infraestrutura Sustentável.

Os povos indígenas são um exemplo de convivência e de relação de respeito com a floresta e uma riqueza cultural maior que qualquer minério ou produto que podemos extrair das regiões onde vivem. “Preservar os seus direitos é mais importante que qualquer grande obra”, ressalta Sérgio Guimarães, secretário executivo do GT Infraestrutura, uma rede de 40 organizações unidas para debater modelos sustentáveis de desenvolvimento baseados na justiça socioambiental. Ele explica que a floresta é a principal infraestrutura da Amazônia: faz chover na maior parte do Brasil, estabiliza o clima, abriga enorme biodiversidade, garante a sobrevivência dos povos originários e é base para o desenvolvimento do Brasil.

Demarcar os territórios indígenas é importante, mas não basta. “É preciso respeitar o modo de vida dos povos indígenas porque é exatamente ele que garante essa preservação que a gente tanto fala. Se hoje nós indígenas somos 5% da população mundial e conseguimos preservar 82% da biodiversidade que ainda resta no planeta é porque nós temos muito a ensinar. E a sociedade inteira precisa entender, respeitar e se reconectar com a Mãe Terra”. Se queremos continuar vivendo neste planeta, deveríamos aprender com quem faz isso desde sempre. Por sorte, essas pessoas estão dispostas a compartilhar esse conhecimento com o mundo. Se os líderes da COP26 derem a seus representantes o destaque que merecem, todo o planeta ganha.

Este artigo foi escrito por Alexandre Mansur e Angélica Queiroz e publicado, originalmente, na Exame.

Foto: Sonia Guajajara com Principe Charles (APIB/Divulgação)

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