ARTIGO: Precisamos olhar para as cidades médias da Amazônia

É mais do que hora de repensar o papel urbano na organização do imenso território amazônico

Por Fabio Ferraz e Claudio de Oliveira*

Os modelos de produção e consumo próprios da economia moderna – ao longo dos últimos 250 anos – se, por um lado, melhoraram o padrão de vida dos seres humanos, por outro, geraram um mapa de desigualdades socioespaciais e impactaram significativamente o meio ambiente em diversos níveis, degradando ecossistemas e causando um aumento na temperatura global com mudanças climáticas imprevisíveis.

As chamadas novas economias, que recebem tantos nomes – circular, de baixo carbono, verde, azul, bioeconomia, compartilhada e colaborativa, de negócios e impacto sociais, digital e do conhecimento –, se orientam por competitividade, inovação e empreendedorismo, mas também por princípios de sustentabilidade, governança e responsabilidade social e nos oferecem novas perspectivas para equilibrar conservação ambiental, geração de valor e qualidade de vida às populações.

No entanto, para mudar o rumo da história do planeta que nos anuncia uma sucessão de tragédias precisamos, urgentemente, modificar estruturas e mecanismos sociais e econômicos que reproduzem os atuais modelos insustentáveis (business as usual). Mas mudar abruptamente ou por meio de ajustes? Por uma ampla, geral e irrestrita revolução ou por reformas homeopáticas?

São diversas as dimensões dessas mudanças: socioculturais, econômico-produtivas, político-institucionais, científico-tecnológicas, educacionais e simbólico-ideológicas. Isso implica em mudanças de currículos e projetos pedagógicos, mas também em regulações. Implica em esforços de governança multinível, tanto quanto em compromissos pessoais e locais. Quando falamos em multinível queremos dizer que há estruturas governamentais e privadas que devem atuar sinergicamente.

A Amazônia e seu modelo de desenvolvimento estão no centro desses dilemas: como equilibrar conservação ambiental, geração de trabalho e renda e bem-estar social no seu imenso território?
É importante considerar que grande parte da população da Amazônia Legal vive em cidades e que as cidades são instrumentos de ordenamento e de gestão do território – de recursos econômicos, de unidades de conservação, de apoio a populações ribeirinhas e povos originários, de toda a infraestrutura para o desenvolvimento sustentável.

Um novo modelo de desenvolvimento para Amazônia – com justiça socioambiental – deve necessariamente dar à rede urbana e, mais especificamente, às cidades médias, um papel de destaque na medida em que são essas que podem servir de apoio às políticas públicas e aos fluxos econômicos, de ligação entre as metrópoles (regionais e/ou nacionais) e as áreas isoladas ou de mais difícil acesso.

Para isso, obviamente, tais cidades e municípios precisam ter suas capacidades institucionais, administrativas e financeiras fortalecidas para que possam desempenhar um papel de liderança na governança multinível sobre o território. Nesse processo, a participação da sociedade civil organizada de base local é condição sine qua non como forma de democratizar as políticas públicas urbanas e ambientais e de assegurar os interesses de suas populações.

No momento em que o Governo Federal se abre à proposição de novas políticas públicas – em especial os Ministérios do Meio Ambiente, das Cidades, do Desenvolvimento Regional e dos Povos Originários – é mister que coloquemos em discussão uma nova perspectiva de convívio harmônico das populações da Amazônia com seu bioma, em que as atividades econômicas e culturais e os serviços ambientais beneficiem aos amazônidas, ao país e a todo o Planeta Terra.

*Fábio Ferraz e Claudio de Oliveira são membros do GT Infraestrutura, uma rede de mais de 50 organizações engajadas em prol de um Brasil com mais justiça socioambiental

Este artigo foi publicado, originalmente, no Um Só Planeta.

foto: depositphotos

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