Carta Aberta ao Novo Governo: Infraestrutura para o Desenvolvimento com Sustentabilidade Socioambiental

Aos Exmos. Senhores Luiz Inácio Lula da Silva, Presidente da República Geraldo Alckmin, Vice Presidente da República e Ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços Com cópia para os Exmos. Senhores Márcio Macedo, Ministro da Secretaria Geral/PR Rui Costa, Ministro da Casa Civil/PR Simone Tebet, Ministra do Planejamento Marina Silva, Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima Alexandre Silveira, Ministro de Minas e Energia Renan Filho, Ministro dos Transportes Márcio França, Ministro de Portos e Aeroportos Sônia Guajajara, Ministra dos Povos Indígenas Silvio Almeida, Ministro dos Direitos Humanos Flávio Dino, Ministro da Justiça Anielle Franco, Ministra da Igualdade Racial Margareth Menezes, Ministra da Cultura Nísia Trindade, Ministra da Saúde Fernando Haddad, Ministro da Fazenda Paulo Teixeira, Ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar Waldez Góes, Ministro da Integração e Desenvolvimento Regional Aloizio Mercadante, Presidente do BNDES    O Grupo de Trabalho Infraestrutura e Justiça Socioambiental (GT Infra) é uma rede de organizações da sociedade civil brasileira que vem atuando desde 2012 em prol da sustentabilidade socioambiental em políticas, programas e projetos de infraestrutura, especialmente nos setores de transporte e energia, com destaque para a região amazônica.   Considerando os compromissos assumidos pelo Presidente Lula e seus ministros com a abordagem transversal de temas ambientais como política de governo, inclusive com vistas ao desmatamento zero na Amazônia e outras medidas de enfrentamento da crise das mudanças climáticas, apresentamos, a seguir, um conjunto de recomendações de ações estratégicas para avançar efetivamente nessa direção.   Ressaltamos que esta Carta Aberta traz uma atualização da correspondência enviada a Vossas Excelências e sua equipe de transição governamental em 25/11/22 subscrita por cerca de 100 membros e aliados do GT Infraestrutura. Ademais, a presente carta vem acompanhada por três correspondências com propostas específicas para os setores de transportes e energia, que estão sendo encaminhadas simultaneamente aos titulares das respectivas pastas.   Uma nova visão sobre a infraestrutura para o desenvolvimento sustentável É preciso superar a velha ideia, ainda predominante, de que a infraestrutura é sinônimo de grandes obras de engenharia, caríssimas, altamente visíveis, definidas e executadas pelo governo e por grandes empresas, sem a necessidade de transparência e participação ativa da sociedade.   Nesse sentido, membros e aliados do GT Infra têm trabalhado junto com comunidades locais, especialmente na Amazônia, para buscar respostas à pergunta: qual é a infraestrutura que precisamos para melhorar a nossa qualidade de vida e conservar nosso meio ambiente?   Entendemos que uma nova conceituação sobre a infraestrutura  é essencial para colocar em prática a política do novo governo sobre a transversalidade de temas ambientais, abordando as seguintes questões fundamentais: A natureza como Infraestrutura – lembrando das palavras de Maura Arapiun, secretária do Conselho Indígena Tapajós-Arapiuns: “A principal infraestrutura da Amazônia é a floresta em pé”. As Soluções baseadas na Natureza (SbN) tratam a natureza como uma infraestrutura viva e essencial. Portanto, é preciso buscar soluções baseadas na convivência com os ecossistemas e os biomas endêmicos; A infraestrutura voltada para a qualidade de vida das populações locais: os bens e serviços da infraestrutura devem priorizar melhorias na qualidade de vida dos indivíduos, famílias e comunidades que compõem as populações locais, à luz dos objetivos e metas da Agenda 2030 da ONU, contemplando: a) as atividades produtivas que contribuam para a segurança e soberania alimentar, e para a geração de emprego e renda, valorizando a sociobiodiversidade como caminho para diversificar a oferta de alimentos, fibras e materiais, com a criação de novas oportunidades de negócios e, b) serviços de saúde, educação, mobilidade, conectividade, conforto térmico e habitação, com atenção especial para as crianças e para as pessoas mais frágeis, ressaltando o lema adotado pelas Nações Unidas de “não deixar ninguém para trás”. Nesse esforço, é preciso que os investimentos em infraestrutura tenham efeitos duradouros sobre serviços e organização coletiva, onde as comunidades e suas organizações atuem como protagonistas centrais do desenvolvimento sustentável.  Cuidados com médios e grandes projetos de infraestrutura: uma nova visão sobre infraestrutura para o desenvolvimento sustentável tem importantes implicações para o planejamento, licenciamento e financiamento de médias e grandes obras de infraestrutura, que incluem, entre outras: i) fortalecimento de instrumentos de análise prévia sobre impactos socioambientais (inclusive cumulativos) e viabilidade econômica, abordando cenários e investimentos alternativos, utilizando metodologias robustas, com participação cidadã e transparência, ii) respeito aos direitos de povos indígenas, comunidades tradicionais e outros grupos vulneráveis, e iii) articulação com estratégias de desenvolvimento local e regional com sustentabilidade socioambiental.  Estes e outros pontos chave são abordados nas propostas a seguir.   Fortalecimento do planejamento estratégico de políticas e programas setoriais Uma prioridade fundamental no processo de tomada de decisão sobre políticas e projetos de infraestrutura é a criação e/ou fortalecimento de instrumentos de planejamento na fase pré-projetos, especialmente nos setores de transportes e energia. Tal esforço deve envolver instrumentos inovadores de análise multicriterial, como Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) com  a utilização de metodologias participativas para a análise de oportunidades e riscos socioambientais, facilitando a identificação de melhores alternativas para a sociedade brasileira – incluindo as comunidades locais – em termos econômicos, sociais e ambientais, descartando-se iniciativas que não se justificam sob a ótica do interesse público – considerando fatores como o nível de degradação ambiental e impactos adversos sobre comunidades locais, inclusive violações de seus direitos. Nessa direção, propomos a criação de um Grupo de Trabalho Interministerial, com a participação dos ministérios do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Planejamento, Transportes, Minas e Energia, Povos Indígenas e Direitos Humanos, e com envolvimento de organizações da sociedade civil, para desenvolver um sistema robusto de critérios, indicadores e instrumentos para a avaliação de oportunidades, riscos socioambientais e alternativas no planejamento estratégico de obras de infraestrutura, na fase pré-projetos.  É fundamental que, antes do anúncio e da definição e tomada de decisão sobre quaisquer programas e projetos, o governo federal, em conjunto com governos estaduais, considere e avalie profundamente as diferentes alternativas – por exemplo,  diferentes rotas e modais no setor de transportes, e alternativas de transição energética no setor de energia – com análise antecipada de questões socioambientais e econômicas, inclusive necessidades

Organizações apontam caminhos para que Brasil priorize investimentos em infraestrutura com sustentabilidade socioambiental

Liderada pelo GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental, carta aberta assinada por mais de 100 organizações traz propostas de ação estratégica para o governo Lula e sua equipe O governo federal está discutindo a proposta de um novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) que deve injetar recursos na infraestrutura brasileira, incluindo projetos de rodovias, portos, aeroportos e também em áreas como saúde e educação. Neste momento, em que é fundamental pensar em que tipo de infraestrutura o país deve priorizar, um grupo de mais de 100 organizações da sociedade civil acaba de endereçar ao presidente Lula e equipe, incluindo ministros e o presidente do BNDES, uma carta com propostas para que os investimentos mirem um desenvolvimento com sustentabilidade socioambiental. “Considerando os compromissos assumidos pelo Presidente Lula e seus ministros com a abordagem transversal de temas ambientais como política de governo, inclusive com vistas ao desmatamento zero na Amazônia e outras medidas de enfrentamento da crise das mudanças climáticas, apresentamos, a seguir, um conjunto de recomendações de ações estratégicas para avançar efetivamente nessa direção”, diz um trecho do documento, que vem acompanhado por correspondências com propostas específicas para os setores de transportes e energia, também encaminhadas aos titulares das respectivas pastas. A carta, coordenada pelo GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental (GT Infra), conta com a assinatura de organizações de base e movimentos sociais, redes da sociedade civil, entidades socioambientais, instituições de pesquisa e ensino e também de parceiros nacionais e internacionais. A intenção é apresentar propostas de ação estratégica para o novo governo, em termos de políticas, programas e projetos de infraestrutura, numa visão de transversalidade com as questões socioambientais. “O grupo propõe a adoção de conceitos inovadores, como o reconhecimento da importância da Natureza como infraestrutura, a infraestrutura voltada para a qualidade de vida das populações locais, com redução de desigualdades sociais, e cuidados com médios e grandes projetos, em termos de seus riscos e impactos socioambientais”, explica Sérgio Guimarães, secretário executivo da rede. O documento destaca as seguintes questões prioritárias: o fortalecimento de instrumentos de planejamento estratégico de infraestrutura nas áreas de energia, transportes e cidades, começando com a fase anterior a projetos, com a análise comparativa de  alternativas em termos de benefícios e riscos socioambientais e econômicos; a ampliação e fortalecimento de espaços de participação cidadã, inclusive em conselhos de tomada de decisão sobre políticas, programas e projetos de infraestrutura, e o respeito ao direito de consulta livre, prévia e informada de povos indígenas e de outras populações tradicionais; a construção de interfaces entre a infraestrutura e o fortalecimento da governança territorial, como parte de um conjunto de ações antecipadas; a necessidade de uma estratégia clara sobre o tema da infraestrutura dentro dos planos de ação voltados para a prevenção e controle do desmatamento na Amazônia e em outros biomas. novas abordagens sobre a infraestrutura voltada para qualidade de vida ou ‘bem viver’ de comunidades locais, destacando questões como a saúde, o saneamento básico, a segurança alimentar e a geração de emprego e renda com cadeias produtivas pautadas no uso sustentável da biodiversidade e na resiliência climática; o fortalecimento de políticas socioambientais de instituições públicas financeiras, associado ao aprimoramento de instrumentos e processo de tomada de decisão de outras esferas do poder público para o setor de infraestrutura. Junto com a carta aberta ao novo governo, os membros e aliados do GT Infraestrutura enviaram correspondências com propostas específicas sobre políticas, programas e projetos nos setores de transporte e energia, endereçadas aos ministros Alexandre Silveira (Minas e Energia), Renan Filho (Transportes) e Márcio França (Portos e  Aeroportos). Como parte de uma agenda positiva de infraestrutura sustentável no país, as cartas ao novo governo chamam atenção para alguns projetos previstos de alto risco socioambiental, como a exploração de óleo e gás no Pantanal e na Foz do Rio Amazonas, que, segundo o grupo, devem ser reconsiderados. Também lembram que existe a necessidade de mitigação e reparação de danos socioambientais provocados por projetos existentes que têm envolvido violações de direitos de comunidades locais, como no caso do Complexo Hidrelétrico Belo Monte no rio Xingu. Os membros e aliados do GT Infraestrutura já iniciaram diálogos com o novo governo sobre a implementação das propostas apresentadas nas cartas, começando com a Secretaria Geral e Casa Civil da Presidência da República e o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Saiba mais no artigo. Acesse as cartas, na íntegra, abaixo: Carta Aberta ao Novo Governo: Infraestrutura para o Desenvolvimento com Sustentabilidade Socioambiental Carta ao Ministro de Minas e Energia Carta ao Ministro de Transportes Carta ao Ministro de Portos e Aeroportos Foto: divulgação/ Brasília, 6 de abril de 2022