Ciclo WebGTInfra - Capítulo 8

Arco Norte e a logística de transporte

O panorama do transporte de mercadorias na região

O panorama do transporte de mercadorias na Amazônia Legal brasileira passou por significativas mudanças na última década. Grãos, milho e soja consolidaram-se como os principais produtos de exportação escoados pelos portos da região do Arco Norte. O assunto foi tema do webinar “O Arco Norte e a Busca por Novos Cenários de Logística”, realizado pelo GT Infra e pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA).

MODERADORA

Isis Diniz

Jornalista do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA)

Convidado

André Luis Ferreira

Diretor-presidente do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA)

Convidado

Marcelo dos Santos Cremer

Analista de Projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA)

Convidado

Bernardo Figueiredo

Ex-diretor geral da agência nacional de transportes terrestres (ANTT) e ex-presidente da empresa de planejamento e logística (EPL)

Ideias-chave

  • As demandas de transporte na região Norte estão em constante mudança, com previsão de crescimento significativo, principalmente na produção de grãos.
  • A logística do Arco Norte e suas falhas revelam um jogo político por trás do processo decisório de implementação de rodovias, ferrovias e portos.
  • A sugestão dos especialistas do IEMA é que a malha de transporte seja analisada de forma interconectada, sem separar demandas, para que não haja déficit de uma mercadoria específica.
Panorama de transportes na região
Dando início à apresentação, André Luis Ferreira apresentou os portos do Arco Norte, citando as especificidades e principais funções de cada um e mostrando o crescimento dos grãos entre os produtos que saem de seus seis portos. “Estamos falando de quase 35 mil toneladas embarcadas”, observou. Numa comparação do Arco Norte com outros dos principais portos exportadores de grãos do Brasil, como Santos e Paranaguá, a participação relativa dos pontos de escoamento da região, especialmente nos últimos quatro anos, só cresce.
Complementando os dados apresentados, Marcelo dos Santos Cremer destacou informações técnicas sobre o fluxo atual de mercadorias em rodovias, ferrovias e portos da região. “Hoje, a Amazônia Legal responde por 36% da produção de grãos do Brasil como um todo”, informou o analista de projetos do IEMA. O especialista lembrou que, segundo projeções do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a maioria das microrregiões da floresta vai experimentar um crescimento significativo na produção de grãos até 2035.

A seguir, suas observações sobre as tendências no Arco Norte:

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Aqui, é o que a gente fez, foi pegar os dados que já estavam disponíveis na Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) até setembro de 2020, e comparar em termos de porcentagem, que aí a gente não consegue comparar em termos absolutos, porque o ano não fechou, mas em termos de porcentagem, quando a gente olha só para esses portos do interior, que não conseguem exportar diretamente, como Porto Velho, no corredor do Madeira, e de Itaituba, no corredor do Tapajós, a gente vê que já teve uma mudança. Itaituba hoje já está com o maior embarque de soja e milho do que o porto de Porto Velho em Rondônia. Já teve uma ultrapassagem em 2020 e aí vai ser da ordem de mais de um milhão e meio de toneladas a mais em Itaituba do que em Porto Velho, deve ficar em torno disso quando o ano se encerrar. Então, é uma tendência que só vem se confirmando ao longo do tempo, do crescimento do Arco Norte como um todo, mas especificamente do crescimento do uso do corredor Tapajós como corredor de exportação de grãos.
Conflitos de interesses
Bernardo Figueiredo, ex-presidente da EPL, acredita que o plano de logística nacional foi construído em cima de interesses de agentes que pressionam o governo, como empresas e bancadas.

“Nós não temos um planejamento de transportes que tenha uma lógica e siga uma base técnica”, avaliou. A seguir, suas colocações sobre o cenário:

Provavelmente, se você pegar a soja produzida no Mato Grosso, ela não justificaria ter três projetos de corredores ferroviários na Amazônia. A soja representa 12% da demanda total de transporte do país. Nós temos o minério, a soja e a carga geral que representa hoje 50% do mercado. É uma carga que está totalmente em cima do caminhão e não tem nenhum projeto voltado para esse transporte, por quê? A carga geral é uma coisa pulverizada, o setor industrial como um todo não tem o interesse focado. Por exemplo, a Ferrogrão é um projeto feito pelas tradings para o Governo, quer dizer, a origem dela é uma TMI das três, que as três fizeram para criar uma alternativa e pressionar a Rumo a baixar as tarifas. Aí a Rumo reage e decide competir. Porque quando a Rumo fala que vai estender a ferrovia, ela gera um risco adicional para a Ferrogrão, que se ela baixar a tarifa, não sobe nenhuma carga, desce tudo para Santos. Então, hoje tem um jogo político, a Rumo tentando neutralizar a construção da Ferrogrão, jogando uma ameaça de estender essa ferrovia até encontrar o mesmo mercado da Ferrogrão e aí sinalizar o risco adicional para o eventual investidor da Ferrogrão. Ninguém no mercado acredita que a Ferrogrão seja um projeto que fica de pé.
Caminhos a seguir
Para os especialistas do IEMA, é necessário pensar em cenários alternativos para a logística na Amazônia, com outras opções para o escoamento de mercadorias. A fim de alcançar essa meta, os projetos de infraestrutura precisam ser analisados em conjunto, e não de maneira isolada. “Senão a gente perde a oportunidade de discutir a pertinência de determinadas obras e subir a régua para pensar em outras alternativas”, explicou Ferreira. “Precisamos pensar em uma rede e em alternativas para ela que tragam melhores custos sociais e ambientais e isso precisa ser debatido com a sociedade.”
“O que a gente vem insistindo é que essas discussões não podem ser feitas sobre um projeto isolado da rede de infraestrutura, porque a gente perde a oportunidade de discutir a pertinência de determinadas obras e as alternativas logísticas”, acrescentou Cremer.