GT Infra encaminha contribuições ao Ministério dos Transportes sobre a consulta pública das debêntures

O Ministério dos Transportes abriu em maio de 2024 uma consulta pública para recebimento de contribuições à proposta de portaria que disciplina requisitos e procedimentos para enquadramento e acompanhamento de projetos de investimento prioritários no setor de infraestrutura de transportes rodoviário e ferroviário para fins de emissão de debêntures incentivadas e de debêntures de infraestrutura. É sabido que os recursos públicos exclusivos, são insuficientes para fomentar o desenvolvimento de setores estratégicos para o país, em especial, em momentos de restrição fiscal. Por isso o governo vem adotando esse expediente e quer por meio da consulta pública aperfeiçoar o procedimento. Para Mariel Nakane, assessora técnica do ISA, as contribuições da sociedade civil na consulta pública são muito importantes: “O governo tem sinalizado que a agenda ambiental deve ser transversal às políticas públicas. Por isso, temos cobrado maior coerência entre os instrumentos da política de transportes e a política ambiental, como a exigência de licença prévia para emissão de debêntures de infraestrutura.”

As debêntures incentivadas são uma criação recente cujo objetivo é mobilizar o mercado de capitais para o investimento em infraestrutura. No que tange à sua definição, debêntures são títulos de dívida cujos recursos são destinados a empreendimentos específicos, inclusive projetos de infraestrutura considerados prioritários, com prazos pré-estabelecidos para a sua execução e, consequentemente, a remuneração do investidor.

Conforme dados do Ministério da Fazenda, entre os anos de 2012 e 2022, o volume total distribuído em debêntures incentivadas de infraestrutura foi de R$190,4 bilhões. Os dois principais setores beneficiados no período foram o de energia (65,5%) e o de transporte e logística (25,6%). No entanto, diante de mudanças regulatórias e consolidação de arranjos, outros setores também vêm se destacando no uso do instrumento. As emissões de debêntures com origem no BNDES também vêm crescendo. Do lado da demanda por esse tipo de título, é possível observar a diversificação dos principais tomadores – isto é, dos que buscam as debêntures como investimento – que incluem pessoas físicas, fundos de investimentos e gestores de ativos, entre outros atores financeiros. A fim de incentivar a maior participação de investidores externos, foi aprovada a Lei 14.801 de 09/01//2024, seguida pelo Decreto 11.964 de 26/03/2024, que regulamenta os critérios e as condições para emissão de debêntures e debêntures incentivadas.

Estudos recentes demonstram um crescimento relativo dos investimentos privados no setores de infraestrutura, com a consolidação de um padrão de financiamento centrado em títulos de dívida, ou seja, com menor participação de empréstimos bancários – sobretudo de instituições públicas – e de financiamento direto vindo do orçamento público. Esta é a principal mudança nos últimos anos. Por isso, congratulamos o Ministério dos Transportes pela importante iniciativa de colocar em consulta a já referida portaria. Trata-se de regramento incontornável para garantir a aplicabilidade do princípio da precaução, bem como a transparência e o controle social de investimentos que detém, desde o seu
planejamento, potencial significativo para provocar danos ambientais e sociais, por vezes irreparáveis, a povos e territórios onde tais investimentos venham a se instalar.

Segundo Tatiana Oliveira, assessora política do INESC, “no contexto de crescimento do investimento privado em projetos voltados a infraestrutura, sobretudo na Amazônia, a iniciativa do Ministério dos Transportes é bem-vinda e mostra disposição para que o Brasil dê um passo na direção de investimentos responsáveis social e ambientalmente, ainda que, como mostramos na nossa carta, ainda falte um longo caminho para percorrer.” Oliveira lembra ainda do protagonismo brasileiro “no país da COP 30 (2025) não é mais possível tratar esses investimentos como um fato consumado, prejudicando o meio ambiente e passando por cima dos direitos de consulta dos povos e comunidades tradicionais.”

Com o intuito de contribuir para um aperfeiçoamento da política pública o GT infraestrutura encaminhou uma carta com suas recomendações e exposição de motivos ao Ministério e entre os pontos mais importantes citamos:

  1. A inclusão e exigência de prévia licença ambiental como condição para a emissão de debêntures incentivadas de infraestrutura, prevista no art. 4º, aqui, considerada benéfica para a credibilidade do investimento, bem como medida de precaução (i) ao cometimento de danos ambientais irreparáveis; (ii) ao cumprimento das metas climáticas estabelecidas nacionalmente; e (iii) à segurança jurídica e financeira de empresas e investidores;
  2. Que art. 4º, seja alterado de forma a abranger todos os projetos de investimento previstos no Art. 3º, e não apenas os que estiverem no escopo de um contrato de autorização ferroviária e que seja incluída a verificação do cumprimento do direito à Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) conforme estabelecido pelo Decreto nº 10.088/2019 que internaliza a Convenção n. 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT);
  3. Que no art. 5º, seja incluído um dispositivo para estabelecer que os mecanismos institucionais de gestão de impactos contemplem medidas estabelecidas no licenciamento ambiental, no âmbito do planejamento setorial e do projeto de investimento e outras exigências legais, inclusive referentes à governança territorial.
  4. Em relação ao art. 6º, entendemos que a emissão de debêntures incentivadas e de debêntures de infraestrutura para projetos de investimento considerados prioritários pelo Poder Público no setor de infraestrutura de transportes rodoviário e ferroviário deve, como requisito de elegibilidade, ser atrelado ao Planejamento Integrado de Transportes (PIT), instituído pelo Decreto nº 12.022/2024 e regulamentado pela Portaria nº 123/2021, e aos Planos Setoriais Rodoviário e Ferroviário.

A Carta pode ser lida na íntegra aqui. O ofício encaminhado foi baseado num documento referencial para a participação de membros do GT Infra na consulta pública, elaborado pelo Instituto Socioambiental – ISA e pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC.

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