Sérgio Guimarães, diretor executivo do GT Infra
A pandemia do Covid-19, com grande número de infectados e mortos – mais de 210 mil só no Brasil – expôs de forma inédita uma série de fragilidades sociais e econômicas, escancarando ainda mais a imensa desigualdade social existente em nosso país. Além da saúde, os impactos atingem em cheio a economia e os empregos, desafiando a capacidade do estado apoiar as populações mais desfavorecidas. Não é à toa que a palavra de ordem em todo o mundo é a retomada da economia, incluindo-se aí, de forma definitiva, as dimensões da sustentabilidade social e ambiental.
Há uma forte convergência de que investimento em infraestrutura é um dos pilares para essa retomada. Mas, qual é a infraestrutura que não leva às mesmas contradições, à concentração de renda e às crises social e ambiental? Aquela que tenha como foco a geração de empregos e renda, a melhoria dos serviços essenciais para a população e a sustentabilidade ambiental, particularmente o enfrentamento da crise climática, e contribua para o alcance dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Na Amazônia, quando se fala em infraestrutura, logo pensamos em mega obras, sejam grandes hidrelétricas ou estradas que “viabilizem a exploração” dos recursos naturais, sem considerar os impactos sobre as populações locais e o meio ambiente. Mas, será que é disso mesmo que a região precisa? A quem servem esses empreendimentos? Será que que contribuem para melhorar de alguma forma a vida das comunidades rurais e urbanas?
O questionamento que deve ser feito é que infraestrutura pode contribuir efetivamente para a retomada da economia regional, reduzindo os impactos negativos sobre o meio ambiente com base em cadeias produtivas regionais, visando a construção de uma economia que valorize a floresta, em vez de destruí-la, que gere benefícios para as comunidades, em vez de impactá-las.
É uma pergunta que ainda não está totalmente respondida, mas existem alguns pontos fundamentais que, necessariamente, precisam ser considerados:
- Uma infraestrutura voltada para a Amazônia, deve contribuir para reduzir impactos negativos sobre o clima e a biodiversidade e, ao mesmo tempo, para melhorar as condições de vida das populações locais, precisa ter como referência os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Gestão de resíduos sólidos, saneamento básico, acesso à saúde, universalização da energia elétrica, educação, melhoria nos transportes e internet de qualidade são alguns dos componentes de uma infraestrutura voltada para as pessoas e seus produtos.
- A participação social é fundamental em todas as fases dos projetos e esses devem incluir no total dos custos os componentes sociais e ambientais. As definições e decisões devem passar, necessariamente, por ouvir as populações locais, protagonistas e verdadeiros interessados, que podem indicar os caminhos da infraestrutura necessária e mais efetiva para a região e suas populações rurais e urbanas.
Nesse sentido, uma pesquisa de percepção da população local realizada em outubro de 2020 pelo Ideia Big Data para os Institutos O Mundo que Queremos e Clima e Sociedade mostra importantes indicadores das carências regionais, das prioridades das populações locais, e traz resultados bem interessantes:
- A área mais carente é a saúde, indicada por 74% dos entrevistados, seguida da educação (50%) e geração de empregos.
- A preservação ambiental é condição fundamental para o desenvolvimento econômico na avaliação de 86% dos brasileiros que vivem na Amazônia.
- A atividade econômica com maior potencial a ser desenvolvida na Amazônia é o turismo (oportunidade de lucro sem necessidade de desmatamento). Por outro lado, apenas 8% dos entrevistados acreditam que a preservação ambiental interfere no crescimento econômico do país.
- Para 66% dos entrevistados a floresta representa o maior bem da humanidade para 66%, sendo a principal ameaça à natureza atualmente o desmatamento das florestas (56%).
- Quase metade dos entrevistados (49%) afirmam ainda que a opinião da população não é levada em consideração pelos políticos locais.
Temos aí fortes indicadores do caminho a seguir. Uma visão muito distante das políticas públicas e decisões tomadas para a região por diferentes governos, desde os militares até o PT. É hora de ouvir as populações locais e construir uma nova economia para a região, em benefício do Brasil e sua população.
Este artigo foi, originalmente, publicado no site Plurale.
*A pesquisa foi realizada entre os dias 11 a 23 de outubro de 2020, com 1400 entrevistados. A margem de erro é de três pontos percentuais.
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