O evento, idealizado pelo senador Zequinha Marinho (Podemos), que procurava discutir a implementação da linha férrea EF-170 (Ferrogrão) entre os estados do Pará e Mato Grosso foi ocupado por mais um protesto contra essa ferrovia. Em estudos já publicados aqui no site do GT Infra realizados pelo CPI/PUC-RJ estima-se que mais de 2 mil quilômetros de floresta amazônica sejam desmatados. Além disso, a EF-170 impactaria áreas de conservação e 16 territórios indígenas. O GT Infra produziu um infográfico com algumas razões que demonstram claramente a inviabilidade do projeto. Você pode conhecer aqui.
Os indígenas, Munduruku, Apiaká e Kayapó chegaram em frente ao local do evento às 9h, com faixas denunciando os impactos do projeto e a necessidade de cumprir os protocolos de consulta, conforme estabelece a Convenção 169 da OIT. As mensagens traziam palavras de ordem: “Ferrogrão é a destruição da floresta e dos povos indígenas”; “Ferrogrão não é boa para o povo! Só para Cargill, Bunge, ADM, Dreyfus, etc”; “Trilho que terá sangue indígena”; “Vozes do povo Apiaká do Médio Tapajós exigem respeito ao protocolo de consulta”.
“Um dia depois da derrubada dos vetos ao Marco Temporal, este evento tenta legitimar um projeto que coloca em risco os povos da Amazônia e a própria floresta. Ele atropela os nossos direitos. Não ocorreu a consulta segundo os protocolos de cada povo, conforme estabelece a convenção 169 da OIT. Eles discutem destruir as nossas terras e não falam com a gente. Falam de megaprojetos, mas não falam de demarcação. Quem lucra com isso não é o povo, são as grandes empresas como a Cargill, Bunge, ADM, Dreyfus, etc. Estamos aqui protestando, porque a nossa preocupação é que sigam discutindo este projeto deixando os povos indígenas de lado”, afirma a liderança indígena Alessandra Munduruku.
Em um momento em que se discute a conservação da Amazônia e das florestas como saída para evitar o aquecimento global e a mudança climática, o projeto vai na contramão de todo esforço que lideranças sociais e políticas têm despendido para evitar um colapso socioambiental. “A Ferrogrão é um projeto sem viabilidade, que ignora alternativas logísticas, e ameaça não apenas a Amazônia e seus povos, mas o futuro de toda a humanidade”, afirma Pedro Charbel, assessor de campanhas da Amazon Watch, “Já passou da hora das comunidades tradicionais e povos indígenas afetados serem consultados, é vergonhoso e ilegal que isso ainda não tenha acontecido. O simples anúncio do projeto da Ferrogrão já agravou as pressões e violações nos territórios.”
A Ferrogrão está acoplada a um projeto de infraestrutura maior chamado Corredor Logístico Tapajós-Xingu, que inclui ainda a rodovia BR-163, hidrovias e a construção de terminais de carga. Dados da PUC-Rio e Climate Policy Initiative (CPI) estimam que, caso não seja efetiva a mitigação dos problemas derivados do projeto, haja uma perda equivalente a mais de 285.000 campos de futebol de vegetação natural – o que corresponde a emissão de mais de 75 milhões de toneladas de carbono. Além de outros impactos como a diminuição da biodiversidade ou a redução dos serviços ecossistêmicos provenientes do bioma.
A Medida Provisória editada por Temer para viabilizar a Ferrogrão pretendeu excluir cerca de 862 hectares do Parque Nacional do Jamanxim. Este fato ensejou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) do PSOL, que gerou uma liminar que suspendeu o desenvolvimento do projeto em 2021. Em maio de 2023, o Ministro Alexandre de Moraes autorizou a retomada dos estudos sobre a Ferrogrão, os quais foram incluídos no Programa de Aceleramento do Crescimento (PAC) publicado em agosto.
Atualmente há um grupo de trabalho criado pelo Ministério dos Transportes que está levantando informações para avaliar a viabilidade da obra. O GT Infraestrutura promoveu um encontro com especialistas e vai apresentar a esse GT do Ministério dados contundentes sobre a inviabilidade econômica e os imensos impactos socioambientais que poderiam ser provocados caso o projeto siga adiante. Seriam bilhões de dólares investidos em uma ferrovia inviável, comprometendo investimentos públicos que poderiam melhorar a infraestrutura brasileira com mais eficiência e em menor tempo.
Ainda em tempo queremos lembrar que o GT Infra estuda a questão há anos e produziu uma Carta de alerta ao pretensos financiadores desse desastre ambiental que pode ser acessada nesse link.
(texto produzido com apoio da assessoria)