A recuperação econômica depende da construção de mais infraestrutura?
Ouvir vozes de povos e comunidades tradicionais e encontrar caminhos para tornar suas demandas efetivas é fundamental para repensar o nosso modelo de desenvolvimento A política e a economia brasileira têm se transformado numa velocidade vertiginosa e em poucas ocasiões a voz dos territórios foi incorporadas às análises sobre esses fenômenos. No GT Infraestrutura, a pergunta sobre qual infraestrutura queremos tem animado as discussões. Por isso, acreditamos que a perspectiva dos sujeitos políticos nos territórios precisa fazer parte das discussões sobre infraestrutura e recuperação econômica do Brasil. Esse foi o foco do debate no webinar “Renovação Verde da Economia e Infraestrutura na Pós-Pandemia: oportunidades, riscos e desafios”, realizado pelo GT Infraestrutura, no último dia 19 de agosto. Um redirecionamento será fundamental para que o país saia da crise no pós-pandemia e pensar caminhos para isso foi o desafio de Ailton Krenak, Ricardo Abramovay e Diana Aguiar, convidados para esse primeiro debate do Ciclo WebGTInfra.“Tanto o Inesc quanto o GT Infraestrutura e as organizações que o compõem se comprometem publicamente com a divulgação e valorização da cosmovisão de povos e comunidades tradicionais que, nós acreditamos, devem sim ter voz nas discussões e debates sobre o futuro da economia e da comunidade mais ampla em que todos nós nos encontramos, vivemos e compartilhamos”, iniciou a assessora política do Instituto de Estudos Socioeconomicos (Inesc), Tatiana Oliveira, que moderou o encontro. “Cada vez mais a infraestrutura na Amazônia serve à todo o processo de devastação no Cerrado”, pontuou a Assessora da Campanha Nacional em Defesa do Cerrado, Diana Aguiar. Ela explicou que o escoamento da soja produzida pelo agronegócio passa pelos portos da região Norte e que a infraestrutura construída para essa logística não atende nem respeita a população da região. “Infraestrutura é frequentemente associada a desenvolvimento, mas uma coisa que nunca se fala é pra que e pra quem”, destacou, lembrando que, historicamente, esses projetos servem apenas para viabilizar atividades econômicas que colaboram para destruir o meio ambiente. Que sustentabilidade é essa? O escritor e professor do Programa de Ciência Ambiental Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo, Ricardo Abramovay, acredita que o crescimento econômico é necessário, mas ele não pode mais continuar sendo incentivado à qualquer custo. Ele lembrou que infraestrutura não é apenas o que é construído, mas também os recursos naturais, que as empresas usam sem pagar. “Só que esses custos não fazem parte do sistema de preços. E a gente paga por eles constatando a destruição.” Ele destacou que o tipo de moldagem de infraestrutura tradicionalmente instalada é equivocado porque cria uma dependência desse caminho e, além disso, trata pequenas reduções de emissão de gases do efeito estufa como sustentabilidade. “Essa é uma visão errada. Sustentabilidade é um valor, é a maneira como se processa a relação entre sociedade e natureza.” Para o líder indígena, ambientalista e escritor, Ailton Krenak, a infraestrutura tal qual vemos hoje precisa ser repensada. “A voz dos territórios nunca foi ouvida dentro de um contexto vasto colonial e colonizante. Nós não temos uma infraestrutura cogitada para esse continente”, afirmou. Segundo ele, a América do Sul apenas recepcionou projetos que vêem os povos como uma plataforma extrativista. Ele destacou que a Amazônia precisa ser pensada dentro do contexto do planeta e levando em conta tudo o que acontece no organismo inteiro. Segundo o escritor, mudar a nossa relação com a natureza, com os países vizinhos e, consequentemente, com a infraestrutura é fundamental e urgente. Porque a verdadeira infraestrutura de que necessitam os povos é a própria natureza e a floresta em pé. Para Krenak, se ouvíssemos os territórios já saberíamos disso há muito tempo. O debate completo pode ser acessado no canal do GT Infraestrutura no Youtube. Ciclo WebGTInfra O debate inaugura para o público o Ciclo WebGTInfra, promovido pelo GT Infraestrutura e parceiros, pensado para promover reflexões sobre sustentabilidade tendo sempre a infraestrutura como norte. A intenção é que os encontros sempre tratem do assunto priorizando a visão inclusiva das comunidades e populações da Amazônia. Serão 12 encontros e o próximo, com o tema “Sem social não tem ambiental: Saúde, Saneamento e as Políticas Sociais para o Desenvolvimento Regional”, já está marcado para o dia 2 de setembro, às 16h.
Organizações, entre elas o GT Infraestrutura, pedem liberação de R$ 2 bi dos fundos socioambientais sob a gestão do BNDES para combater os efeitos da pandemia
Nesta terça-feira (4), 50 organizações da sociedade civil apresentarão uma Carta Aberta ao BNDES, às 15h, em evento com a participação de Luciano Coutinho, ex-presidente do BNDES; e Arthur Koblitz, presidente da Associação dos Funcionários do BNDES, entre outros. Brasília, 04 de agosto – Cinquenta organizações da sociedade civil divulgam hoje uma Carta Aberta ao BNDES para cobrar da instituição a liberação dos recursos de mais de R$ 2 bilhões parados no Fundo Amazônia, Fundo Clima e Fundo Social. Pedem, ainda, novas medidas para o Banco do Estado bloquear o financiamento a projetos em áreas com desmatamento ilegal e maior rigor no empréstimo a negócios que causam impacto social e ambiental. O pedido ocorre em meio à pandemia, quando uma instituição criada para o desenvolvimento social é fundamental para a recuperação econômica. A carta será apresentada durante evento conjunto da Frente Parlamentar Ambientalista, Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas e Frente Parlamentar dos ODS Frente Parlamentar Ambientalista que ocorre hoje 15 horas. O evento contará com as presenças do Sr. Luciano Coutinho, presidente do BNDES no período de maio de 2007 a maio de 2016, e do Sr. Arthur Koblitz, presidente da Associação dos Funcionários do BNDES. Para as organizações, nas últimas décadas, o BNDES vinha adotando um padrão de investimento que reforçava as desigualdades sociais, violava direitos de comunidades e explorava ecossistemas de forma insustentável, como foi visto nos empréstimos concedidos às obras de Usinas Hidrelétricas na Amazônia. “Diante da pandemia, o País assiste à incapacidade do governo federal no enfrentamento da crise sanitária, aos Estados e municípios aprofundando seu endividamento e às políticas públicas fragilizadas pela falta de recursos. (…) E essa escassez exige um Banco de Estado a serviço do gigantesco desafio de mudar o paradigma do próprio desenvolvimento, superando modelos ultrapassados de crescimento econômico, que ignoram impactos sociais e ambientais, afetando especialmente os grupos mais vulneráveis”, diz a Carta Aberta. O documento acrescenta que, neste momento, há uma grande oportunidade de fazer diferente. “Milhões de pessoas estão sendo jogadas na pobreza e extrema pobreza; com a população negra sendo proporcionalmente ainda mais afetada; centenas de negócios cuja base é a única fonte de rendadas famílias estão deixando de existir e junto deles milhares de ocupações e empregos”. A carta é assinada por mais de cinquenta organizações, entre elas o GT Infraestrutura, Instituto de Estudos Socioeconômicos, Conectas Direitos Humanos, International Rivers, Instituto Sociedade, População e Natureza, Instituto de Defesa do Consumidor, Observatório do Clima, Instituto Socioambiental. O documento conclui que, neste momento, é fundamental que o BNDES promova o desenvolvimento social, de fato. “Existe uma rica economia de base local e comunitária, com forte conteúdo identitário e criativo – feminista, indígena, preta, jovem, periférica – que precisa ser estimulada e fortalecida”, reforça o texto. —– Os Fundos do BNDES Valor administrado pelo banco, voltado a investimentos socioambientais Nome Patrimônio Característica Investimentos em 2019 Fundo Amazônia Mais de R$ 2 bilhões Preservação ambiental, combate ao desmatamento. Nenhum novo projeto aprovado desde 2019, desembolsos dos contratos já assinados em ritmo lento. Fundo Social O BNDES não disponibilizou essa informação Apoio não-reembolsável a projetos de geração de emprego e renda e ao desenvolvimento social. Sem novas chamadas desde 2018 Fundo Clima (Fundo Nacional de Mudança Climática) R$ 250 milhões* Apoio reembolsável, mediante empréstimo do BNDES ou apoio não-reembolsável a projetos de mitigação da mudança do clima ou à adaptação das pessoas a esses efeitos, sob responsabilidade do MMA. Sem chamadas em 2019 e, para 2020, também não houve aprovação do Plano Anual de Aplicação de Recursos pelo Ministério do Meio Ambiente. (*)Esse total poderia ser maior se o governo realizasse as transferências autorizadas na lei orçamentária de 2020, equivalentes a R$ 232,84 milhões. Informações à Imprensa: Guilherme Coelho (11) 98503-6622 Assessoria de comunicação do GT Infraestrutura As ações urgentes demandadas na Carta Aberta: Utilização massiva e imediata de recursos do Fundo Social Retomada operações do Fundo Amazônia, reativação da estrutura anterior do Comitê Orientador do Fundo Amazônia (COFA) e suspensão das novas regras que dificultam o cadastramento. Execução dos recursos do Fundo Clima e maior transparência, fim dos gargalos operacionais. 4.Novos critérios para as operações diretas e indiretas de crédito agropecuário, com o uso do CAR para detectar áreas irregulares, a exigência da adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA), o maior controle das empresas sobre suas cadeias produtivas e outros. Audiência pública para discutir a reconstrução da economia pós COVID-19 sob uma ótica de sustentabilidade ambiental, justiça social e combate ao racismo. As demandas de aperfeiçoamento das políticas de transparência e salvaguardas socioambientais: Exigência de Consultas Livres Prévias e Informadas, nos termos da Convenção 169 da OIT, incluindo eventuais protocolos de consulta dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais. Participação das comunidades no processo de construção e supervisão dos projetos. Transparência ativa e passiva de informações essenciais sobre operações e projetos em análise, com a construção de um comitê de especialistas, externo e isento, para orientar ações da instituição. Novo sistema para resolver eventuais controvérsias, considerando a atual ineficiência da figura Ombudsman. Revisão da Política Socioambiental para o Setor de Mineração. Revisão do Guia Socioambiental de Pecuária Bovina de Corte, com novas diretrizes para as condições de trabalho diante dos impactos da Covid-19, nos frigoríficos e a partir deles. Abertura de diálogo com organizações da sociedade civil sobre o desenho do Plano de Implementação da versão atualizada da PRSA, aprovada pelo Conselho de Administração em novembro de 2019, considerando que o Plano de Implementação vigente alcança o período de 2018-2020. A Carta é aberta à sociedade e endereçada a: Paulo Roberto Nunes Guedes – Ministro da Economia; Rodrigo Felinto Ibarra Epitácio Maia – Presidente da Câmara dos Deputados; David Samuel Alcolumbre Tobelem – Presidente do Senado Federal; Luís Roberto Barroso – Ministro do Supremo Tribunal Federal; Rosa Weber – Ministro do Supremo Tribunal Federal; Gustavo Montezano – Presidente do BNDES; Ricardo Barros – Diretor de Operações; Bianca Nasser – Diretora de Finanças; Bruno Laskowsky – Diretor