Um pouco de história e os gols de 2023

Foto de capa: Michel Dantas/Observatório BR-319

Desde 2012, o GT Infraestrutura tem atuado como rede de entidades da sociedade civil brasileira voltada para a incorporação de uma ótica de justiça socioambiental entre políticas, programas e projetos de infraestrutura, especialmente nos setores de transporte e energia, com destaque para a região amazônica. 

Roda de conversa em Santarém, a construção do conhecimento é coletiva

A criação do GT Infra foi uma resposta da sociedade civil brasileira a problemas crônicos de grandes obras de infraestrutura na Amazônia, tais como planejamento autoritário, sub-dimensionamento de riscos socioambientais e da invisibilização de comunidades tradicionais, o que têm resultado em fenômenos como o desmatamento acelerado e graves conflitos socioambientais. A rede conta hoje com mais de 50 membros entre entidades socioambientais e movimentos sociais, além de observadores, cientistas convidados e outros aliados.

Assim, as estratégias de atuação do GT Infra têm se organizado em dois eixos interligados:

  • a viabilização de uma agenda estruturante de mudanças entre políticas públicas, voltada para o fortalecimento de instrumentos e processos decisórios na área de infraestrutura de transportes e energia, especialmente na fase de planejamento setorial, sob uma ótica de justiça socioambiental; 
  • o enfrentamento de ameaças de grandes projetos de alto risco socioambiental – tipicamente megaprojetos planejados, financiados e executados em contextos de baixa governança – com foco em ação preventiva de danos.

Nesses dois eixos estratégicos, uma característica fundamental da atuação do GT Infra tem sido as parcerias com comunidades e movimentos de base, objetivando i) o fortalecimento de iniciativas em defesa de territórios e direitos frente às ameaças e impactos socioambientais de grandes projetos, ii) a valorização de suas contribuições em debates sobre mudanças estruturantes entre políticas públicas e iii) apoio para iniciativas inovadoras de infraestrutura sustentável, voltadas ao ‘bem-viver’ das comunidades locais.

Com a chegada de um novo governo federal no Brasil em janeiro de 2023, num contexto de resiliência de instituições democráticas no país e, ao mesmo tempo, a persistência de contradições numa coalizão política de ‘frente ampla`, tem surgido novas oportunidades e desafios para avançar em agendas estratégicas do GT Infra.  Essa conjuntura destaca a relevância de uma atuação estratégica do GT Infra que envolve: i) esforços de cooperação com o Poder Público na implementação de uma agenda de mudanças estruturantes entre instrumentos e processos decisórios nas políticas de infraestrutura sob uma ótica de sustentabilidade socioambiental, especialmente, na fase de planejamento setorial, e ii) o fortalecimento de iniciativas de comunidades e movimentos locais na defesa de territórios e direitos, frente às ameaças e danos de grandes projetos de infraestrutura que ainda persistem, especialmente a ação preventiva frente a empreendimentos de alto risco socioambiental no ‘pipeline’ governamental.

Reunião com a ministra Marina Silva, uma das muitas realizadas junto ao governo federal

Destaques de 2023

Nesse contexto político-institucional – e mesmo com restrições severas de recursos financeiros – cabe destacar os seguintes avanços no ano de 2023:

  • Com base em uma carta aberta ao novo governo (março de 2023) acompanhada por cartas específicas para ministérios setoriais (MME, MT, MPOR) e, logo em seguida, uma nota técnica elaborada com parceiros sobre critérios de análise e classificação de projetos de infraestrutura no PPA e PPI (junho de 2023), abriu-se uma série de diálogos de alto nível com o governo federal, envolvendo a Secretaria Geral da Presidência da República, o Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO), o Ministério da Fazenda (MF), o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Ministério de Minas e Energia (MME), Ministério dos Transportes (MT), Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria Geral da União (CGU), dentre outros.   
Junto com lideranças dos territórios em uma parceria com o IBRAOP e Transparência Internacional Brasil
  • Junto ao Ministério de Minas e Energia, o GT Infra e redes parceiras têm participado de diálogos iniciais sobre a metodologia de elaboração de um Plano Nacional de Transição Energética, anunciado no último trimestre de 2023. Enquanto isso, tem ocorrido avanços no diálogo sobre propostas para setores específicos, como a hidroeletricidade e energias renováveis (solar, eólica).
  • Junto ao Ministério da Fazenda, tem ocorrido diálogos sobre a construção do Plano de Transformação Ecológica, liderado por esse ministério, o que inclui “Transição Energética” e “Nova Infraestrutura Verde e Adaptação” entre seus seis eixos.
  • No ano de 2023, o GT Infra intensificou e ampliou parcerias com movimentos sociais em torno de estratégias de proteção de territórios e direitos socioambientais frente às ameaças de grandes empreendimentos de infraestrutura, com destaque para o Corredor Tapajós/Xingu[2],envolvendo a pavimentação da rodovia BR-163, hidrovias e portos e a proposta de construção da Ferrogrão (EF-170)[3]. Houve colaborações pontuais com movimentos sociais e outros parceiros: i) na bacia do Madeira, em torno do  inventário hidrelétrico binacional na fronteira com Bolívia, UHE Tabajara e pavimentação da BR-319, ii) na bacia do Tocantins, em torno do derrocamento do Pedral de Lourenço e dragagem do rio para a implantação de uma hidrovia para o agronegócio e mineração entre Marabá e Barcarena, iii) sobre PCHs e hidrovia no Pantanal / bacia do Alto Paraguai e iv) a ferrovia FIOL e a construção do Porto Sul em Ilhéus, no sul da Bahia
  • Em nível regional da Panamazônia, o GT Infraestrutura desempenhou um importante papel entre organizações e redes de sociedade civil na construção de propostas para a Cúpula da Amazônia realizada em Belém em agosto de 2023, especialmente sobre obras de infraestrutura e sustentabilidade socioambiental.[4] Entre outros resultados, a mobilização da sociedade civil contribuiu para a inclusão de um capítulo sobre infraestrutura sustentável (itens 68-70) na Declaração de Belém, assinada pelos presidentes dos países amazônicos. Você pode ver o vídeo produzido pelo GT Infra e o Fundo Casa Socioambiental e outros parceiros, nesse link ou abaixo.
Direção do vídeo Todd Southgate
A Cúpula tomou as ruas de Belém e foi um movimento de resistência. Foto: Todd Southgate
  • Em termos de atuação junto a bancos públicos de desenvolvimento, envolvidos no financiamento de grandes obras de infraestrutura nos setores de energia e transportes, destacou-se em 2023 a retomada de uma agenda de cooperação com o BNDES em torno do fortalecimento de salvaguardas socioambientais para projetos de infraestrutura, com destaque para energias renováveis, assim como o apoio para iniciativas em base comunitária, com a previsão de reconstituição de um fórum permanente de diálogo com a sociedade civil, em novas bases. 
  • Por meio do Grupo de Trabalho sobre o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), coordenado pelo Bank Information Center (BIC), membros e aliados do GT Infra têm contribuído para diálogos, inclusive com o novo presidente do banco, sobre questões chave, como o apoio a iniciativas participativas de ‘upstream planning’ de infraestrutura na nova estratégia institucional do banco e seu envolvimento em iniciativas relacionadas a infraestrutura de transportes e energia na América do Sul, especialmente na Panamazônia, a exemplo da iniciativa Amazônia para Sempre e a ‘Coalizão Verde’ de instituições financeiras, liderada pelo BID e BNDES, para o financiamento de desenvolvimento sustentável na Amazônia.
  • No que se refere a iniciativas de infraestrutura na América do Sul com envolvimento de bancos públicos de desenvolvimento, cabe ressaltar que foi lançado no último trimestre de 2023, pelo governo brasileiro, uma proposta para promover cinco rotas de integração sul-americana, três das quais na Panamazônia, contando com o apoio do BNDES, BID, CAF e FONPLATA, o que representa um desafio para a atuação do GT Infra e aliados em nível regional, de forma articulada a outras iniciativas como a incidência em torno do PPCDAM e a OTCA / Declaração de Belém.
  • Por fim, cabe destacar que, em nível regional e global, membros e parceiros do GT Infra participaram ativamente em 2023 de espaços como a COP 28 em Dubai, contribuindo para debates sobre temas fundamentais como a garantia de direitos de comunidades locais em territórios impactados por projetos de mitigação, adaptação e transição ‘justa’ nos setores de energia e transportes. E, no final de 2023, o GT Infra participou da criação de uma coalizão de organizações da sociedade civil, voltada para potencializar oportunidades em torno da realização da COP 30, a ser realizado em Belém do Pará em novembro de 2025.

[1] Veja a versão preliminar do plano de ação sobre o tema “transparência e participação em grandes projetos de infraestrutura” aqui

[2] Veja, por exemplo, os documentos produzidos em oficinas coorganizadas com movimentos sociais em Sinop (MT)  (maio de 2023) e Santarém (PA) (setembro de 2023).

[3] Sobre a Ferrogrão, veja, por exemplo, a carta encaminhada em dezembro de 2023 ao Grupo de Trabalho criado pelo Ministério de Transportes (Portaria no. 994 de 17 de outubro de 2023)  para subsidiar a tomada de decisões governamentais sobre a viabilidade socioambiental e econômico-financeira do empreendimento.

[4] Veja também o documento “Notas para subsidiar debates no seminário do Itamaraty em preparação para a Cúpula da Amazônia” (maio de 2023).  Sobre a Cúpula da Amazônia, veja também o mini-documentário produzido pelo GT Infraestrutura, Fundo CASA Socioambiental e redes parceiras.

Compartilhe:

Facebook
Twitter
Pinterest
LinkedIn