Por Sérgio Guimarães*
Na segunda-feira, 21 de outubro de 2024, teve início em Londres o julgamento de uma ação histórica: cerca de 620 mil pessoas atingidas pelo rompimento da barragem da Samarco, em Mariana (MG), processam a mineradora BHP, uma das controladoras da empresa. Entre os promotores da ação estão municípios, comunidades indígenas, igrejas e empresas, que pleiteiam uma indenização estimada em R$ 266 bilhões. Se deferida, será a maior indenização já vista na Justiça britânica e uma das maiores do mundo em casos ambientais.
Esse evento destaca bem a dimensão dos danos e dos dramas pessoais e econômicos provocados por desastres ambientais causados, muitas vezes por descasos e negligencias de quem desconsidera evidências e o bom senso, voltados apenas para interesses econômicos. Muitas vezes, como nesse caso e em outros semelhantes, o resultado são milhares vidas, cidades setores econômicos devastados, gerando prejuízos literalmente incalculáveis.
Essas situações são agravadas ainda mais pelas mudanças climáticas. Somente no Brasil em 2024 ocorreu uma série de desastres climáticos: enchentes devastadoras no Rio Grande do Sul, incêndios incontroláveis em várias regiões do país, seca histórica na Amazônia e chuvas torrenciais em São Paulo. Eventos causaram não apenas perdas de vidas, mas também prejuízos econômicos bilionários. Por exemplo, o impacto econômico da enchente no Rio Grande do Sul, de acordo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), foi de R$ 87 bilhões. Os prejuízos dos outros desastres ainda estão sendo calculados.
O fato é que os custos de resposta a esses desastres são astronômicos e crescem continuamente. A grande questão é até quando e até quanto a economia global será capaz de sustentar essa drenagem de recursos destinados à reconstrução de infraestruturas destruídas, ao pagamento de indenizações, ao reforço necessário de políticas públicas de saúde e educação, além dos incentivos econômicos a reconstrução da uma economia. O redirecionamento de recursos de outras áreas cruciais para responder a crises imediatas cria um ciclo que ameaça a própria estabilidade das nações.
Diante desse cenário, a mera resposta emergencial aos desastres não é mais suficiente. É preciso ir além da restauração de serviços e de medidas de adaptação a esses eventos e até mesmo das necessárias políticas de mitigação que buscam reduzir sua frequência e intensidade. Devemos agir nas raízes profundas da crise climática, revisando os princípios que regem nossa relação com o meio ambiente. Essa mudança deve envolver não apenas ações políticas e econômicas, mas também uma transformação ética e cultural nos princípios básicos que alicerçam nossa sociedade, redefinindo como interagimos uns com os outros e com a natureza.
Sem essa mudança estrutural, continuaremos presos em um ciclo vicioso de “enxugar gelo”, enfrentando eventos cada vez mais extremos e sustentando um modelo insustentável que gera custos cada vez mais difíceis de suportar por governos, empresas e cidadãos. Só com uma mudança radical nos fundamentos de nossa sociedade e economia poderemos evitar um futuro de crises cada vez mais frequentes e de custos impagáveis. Isso também é emergencial!
*Sérgio Guimarães é engenheiro civil, especialista em políticas ambientais.