Principais bancos estão contribuindo com US$ 395 bilhões para o colapso da biodiversidade desde o Acordo de Paris 

Novos relatórios revelam o financiamento crescente a setores destrutivos e destacam a necessidade urgente de regulamentações para que o setor financeiro contribua com as Metas Globais de Biodiversidade. Brasil lidera em financiamentos a setores com risco de desmatamento São Francisco (USA), 16 de outubro de 2024 – Com a aproximação da 16ª Conferência das Partes (COP16) da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), novos dados e análises divulgados hoje pela Coalizão Florestas e Finanças — um grupo de dez organizações internacionais da sociedade civil — revelam que os maiores bancos do mundo destinaram mais de US$ 395 bilhões em crédito a setores que impulsionam a destruição das florestas e violações de direitos humanos em florestas tropicais desde a adoção do Acordo de Paris.  Somente no período mais recente de análise, janeiro de 2023 a junho de 2024, foram US$ 77 bilhões em crédito. A pesquisa destaca que os governos têm pautado a omissão em conter essa tendência, apesar de terem adotado o Marco Global de Biodiversidade (GBF) há quase dois anos. Os resultados evidenciam a necessidade urgente de medidas regulatórias robustas para alinhar as práticas financeiras com as metas globais de biodiversidade. O relatório “Financiando o Colapso da Biodiversidade” é a análise mais abrangente sobre o papel das finanças globais na destruição das florestas tropicais —  um estudo inicial publicado em dezembro de 2023. O relatório deste ano examina bancos e investidores que financiam 300 empresas operando em seis setores de commodities de alto risco — carne bovina, óleo de palma, celulose e papel, borracha, soja e madeira — de desmatamento, perda de biodiversidade e violações de direitos humanos no Sudeste Asiático, América Latina e África Central e Ocidental. Lançado em conjunto, o relatório “Regulamentação Financeira para a Biodiversidade” revela, juntamente com o estudo principal, que a maior parte do financiamento vem do Brasil, China, Indonésia, União Europeia e Estados Unidos. O Brasil, em particular, ocupa um papel central no financiamento desses setores destrutivos, sendo responsável por 72% de todo o crédito mundial destinado à produção e ao processamento primário das seis commodities com risco de desmatamento dos biomas brasileiros. “O setor financeiro precisa avançar na transparência de seus negócios, para que suas políticas corporativas de sustentabilidade sejam de fato escrutinadas por órgãos reguladores e a sociedade civil. Do ponto de vista da política pública, precisamos de marcos legais nacionais e internacionais mais fortes, evitando o financiamento de projetos predatórios. A governança das cadeias produtivas de commodities ainda é muito frágil. Sem mudanças, violações de direitos e a destruição de biomas continuarão a ocorrer”, afirma Marcel Gomes, secretário executivo da ONG Repórter Brasil, membro da Coalizão. Entre 2016 e junho de 2024, bancos brasileiros destinaram US$ 188 bilhões a essas empresas de risco à biodiversidade. No período mais recente de 18 meses (janeiro de 2023 a junho de 2024), apenas os três maiores bancos do país – Banco do Brasil, Bradesco e Itaú Unibanco – forneceram US$ 35 bilhões, principalmente para os setores de soja e carne bovina. “Os governos estão inertes enquanto os bancos continuam a financiar a destruição das florestas e violações de direitos humanos, sem qualquer restrição ou consequência”, afirma Tom Picken, diretor da campanha Florestas e Finanças da organização Rainforest Action Network (RAN), membro da Coalizão. “Com a COP16 se aproximando, é o momento de uma ação transformadora. A verdadeira ‘lacuna de financiamento’ para a conservação é, na verdade, uma lacuna regulatória para impedir que bancos e investidores continuem alimentando a crise de biodiversidade.” Brasil: epicentro do financiamento para setores que destroem a biodiversidade O programa de Crédito Rural do Brasil desempenhou um papel importante no crescimento desses setores, com um aumento de US$ 10,7 bilhões para o setor de soja e US$ 9,8 bilhões para o setor de carne bovina entre 2016 e 2023.  Além disso, os investimentos no setor aumentaram bastante por meio de instrumentos financeiros como Fiagros, CRAs, e LCAs. As regulamentações sobre esses produtos de investimento, vendidos a investidores privados, praticamente não possuem critérios socioambientais associados. Esses produtos são amplamente utilizados para financiar o setor agrícola e se tornaram uma fonte de capital fundamental para a expansão das atividades. Dados governamentais mostram que, em julho de 2024, o valor total dos instrumentos financeiros destinados ao setor agrícola brasileiro alcançou US$ 187 bilhões. “Sem mudanças regulatórias que imponham requisitos socioambientais mais rígidos e a responsabilização dos financiadores, o setor financeiro brasileiro continuará impulsionando a destruição das florestas e colocando em risco as metas de biodiversidade” disse Tarcísio Feitosa – articulador da Coalizão Florestas e Finanças para o Brasil. Enquanto incêndios florestais devastam a Amazônia durante uma das piores temporadas de queimadas já registradas, o relatório “Financiando o Colapso da Biodiversidade” detalha como a JBS, a maior empresa de processamento de carne do mundo, tem contribuído para a destruição de terras indígenas na Amazônia, apoiada por US$ 1,1 bilhão em crédito de grandes instituições financeiras. Apesar dos compromissos para práticas éticas, a JBS continua perpetuando o desmatamento e as violações de direitos humanos. Além disso, os relatórios apontam que as iniciativas voluntárias de sustentabilidade dos bancos estão falhando. Mais da metade dos 30 maiores bancos com risco de desmatamento florestal do mundo são membros de pelo menos uma iniciativa de sustentabilidade, como os Princípios para a Responsiabilidade Bancária (UNPRB), a Aliança Bancária por Zero Emissões Líquidas (NZBA) e a Força-Tarefa sobre Divulgações Financeiras Relacionadas à Natureza (TNFD). No entanto, tais compromissos não impediram a continuidade do financiamento para a destruição das florestas e as violações de direitos humanos. Sistemas de certificação como o Forest Stewardship Council (FSC) e a Mesa Redonda sobre Óleo de Palma Sustentável (RSPO) também não conseguiram evitar o desmatamento nem proteger os direitos humanos. “Bancos e investidores que dependem de esquemas de certificação falhos, como o FSC e a RSPO, são cúmplices do greenwashing e contribuem para as crises climática, de biodiversidade e de direitos humanos. As instituições financeiras devem assumir a responsabilidade pelos impactos de seus financiamentos e conduzir rigorosa diligência e verificação independente do cumprimento das políticas ambientais e sociais de seus clientes”, disse Jeff

Organizações da sociedade civil apresentam propostas para uma transição energética com justiça socioambiental em evento do G20, mas você sabe como funciona o G20?

O G20 é o grupo das nações mais ricas do planeta, nele está representado 80% do PIB mundial, mas também como lembrou André Corrêa do Lago, Secretário do Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério Das Relações Exteriores (MRE) do Brasil, “também é responsável por 80% das emissões [de GEE] mundiais”. A fala se deu no âmbito da reunião do Grupo de Trabalho de Transição Energética criado para discutir esse processo de forma justa e equilibrada. O G20 não é uma organização internacional como a ONU ou o FMI, mas um mecanismo de diálogo informal que possui uma presidência rotativa que trabalha em forma de Troika, um grupo que reúne o presidente anterior, o atual e o futuro presidente, a atual é composta pela Índia (2023), Brasil (2024) e pela África do Sul (2025), respectivamente. O grupo nasceu com a expansão do G7, quando houve a percepção clara de que o mundo havia mudado e apenas os sete países mais ricos do mundo não tinham mais a representatividade ou habilidade de conduzir o planeta para uma harmonia, inicialmente, financeira. O grupo sempre teve essa vinculação com a economia, mas com as sucessivas crises, dos anos noventa e, também, dos anos 2000, sobretudo 2008, o escopo do trabalho ampliou-se. Atualmente, o G20 atua em duas “trilhas” Sherpas[1] e Finanças. A Sherpas é organizada pelos MREs dos membros e é chefiada por emissários diretos dos líderes do G20 e a de Finanças, onde os ministros de finanças e presidentes dos Bancos Centrais se encontram em reuniões para discutir os temas da área. A Trilha Financeira é composta por seis Grupos Técnicos, uma Força-tarefa e uma iniciativa sobre Tributação Internacional. Os grupos são: Assuntos do Setor Financeiro; Arquitetura Financeira Internacional; Economia Global; Finanças Sustentáveis; Inclusão Financeira; Infraestrutura. Já a Força-tarefa Conjunta de Finanças e Saúde foi concebida em 2021, no ápice da pandemia de Covid-19. Foi desenvolvida como um fórum para aperfeiçoar o diálogo e a cooperação global em Prevenção, Preparação e Resposta (PPR) a pandemias. Confira abaixo a ilustração com as trilhas do G20. Atualmente, a Trilha de Sherpas se organiza em quinze Grupos de Trabalho. São eles: anticorrupção; comércio e investimentos; cultura; desenvolvimento; economia digital; educação; trabalho; transições energéticas; turismo; empoderamento de mulheres; pesquisa e inovação; redução do risco de desastres; saúde; agricultura; sustentabilidade climática e ambiental. Além disso, essa Trilha tem duas Forças-tarefa – Mobilização Global contra a Mudança do Clima (coordenada pelo Ministério de Relações Exteriores e compartilhada com a Trilha Financeira) e a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza (coordenada pelo MRE e o Ministério de Desenvolvimento, Assistência Social, Família e Combate à Fome) – e a Iniciativa de Bioeconomia, que se concentra em três eixos temáticos: ciência, tecnologia e inovação; o uso sustentável da biodiversidade e o papel da bioeconomia no desenvolvimento sustentável. Para melhor compreensão precisamos explicar como funcionam minimamente esses grupos. Há dois tipos de grupos de trabalho no G20; os GTs propriamente, que são organizados e conduzidos sobretudo por autoridades e membros de governo e ministérios e os Grupos de Engajamento que envolvem a sociedade civil, suas organizações, pesquisadores e empresas entre outros atores para fornecer perspectivas e recomendações diversificadas durante o processo de formulação de políticas. Em relação aos Grupos de Engajamento temos: Business20 (B20); Civil20 (C20); Labour20 (L20); Think20 (T20); Urban20 (U20); Youth20 (Y20); Woman20 (W20) que podem ser facilmente entendidos pelos seus respectivos títulos, o menos óbvio talvez seja o Labour, que representa diferentes sindicatos e o Think que se refere aos Think Tanks mundiais. Agora que está mais clara a atuação do G20, vamos aos fatos Para um exemplo prático de trabalho podemos citar a reunião realizada recentemente pelo grupo de trabalho intitulado GT sobre Transição Energética e Sustentabilidade Climática (ETWG & CSWG) que foi organizada nos dias 27 a 29 de maio, em Belo Horizonte. Nessa reunião para debater a transição energética o C20[3], teve um espaço para expor a síntese dos trabalhos que vem desenvolvendo com as mais de 700 organizações que compõem o grupo. A carta apresentada pelo grupo pode ser acessada aqui em inglês e aqui em português. Considerando que promover uma transição energética justa, acessível e inclusiva, com devida atenção à sua dimensão social, é uma prioridade máxima do G20 deste ano, sob a presidência do Brasil, o C20 trouxe as recomendações focadas em cinco pontos principais: Em resumo, os elementos-chave desse processo de governança incluem: i) respeito pelos direitos dos povos indígenas e comunidades locais à autodeterminação, incluindo garantias de seus direitos territoriais e o direito ao consentimento livre, prévio e informado, ii) participação comunitária precoce nos processos de tomada de decisão, e iii) garantias de mecanismos eficazes para queixas e reparações. A carta foi entregue em mãos pelas representantes do C20, Priscilla Papagiannis (Observatório do Clima) e Natalia Tsuyama (Engajamundo), para Mariana Espécie, assessora especial do Ministro de Minas e Energia e coordenadora do ETWG no G20, e o Embaixador André Corrêa do Lago, Secretário do Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério de Relações Exteriores. (foto acima) Para saber mais sobre essa participação da sociedade civil confira a matéria publicada no site do C20. Mais informações sobre o Grupo de Trabalho (WG3) do C20 sobre “Meio Ambiente, Justiça Climática e Transição Energética”: priscillapapagiannis@outlook.com Outras referências: https://www.g20.org/pt-br/noticias/o-brasil-no-g20-e-a-lideranca-na-transicao-energetica https://www.g20.org/pt-br/noticias/se-conseguirmos-reduzir-as-emissoes-ganhamos-o-debate-afirma-coordenadora-do-gt-em-ultimo-de-dia-de-reuniao https://www.youtube.com/watch?v=aiPqk5vQGPc Entrevista coletiva com o Ministro de Minas e Energia do Brasil, Alexandre Silveira [1] Os “sherpas” são guias experientes originários do Nepal, notáveis por liderar expedições nas áreas montanhosas do Himalaia, desempenhando um papel vital para o sucesso das jornadas. [2] Material produzido e usado como subsídio para esse texto de autoria de BRICS Policy Center, Jubileu Sul Brasil e ABONG e pode ser acessado aqui. [3] O C20 foi oficializado como Grupo de Engajamento do G20 em 2013, e desde então, a cada ano procura garantir que os líderes mundiais escutem as recomendações e demandas da sociedade civil organizada, buscando proteger o meio ambiente, e promovendo desenvolvimento social e econômico, além de direitos humanos

Os critérios para análise e classificação de empreendimentos de infraestrutura são apresentados no ENAOP 2024

A nota, intitulada “Critérios para análise e classificação de empreendimentos de infraestrutura no Plano Plurianual (PPA) e no Programa de Parcerias de Investimento (PPI)”, que já foi apresentada a diversos ministérios (Ministério da Fazenda, do Meio Ambiente, do Planejamento e Orçamento), além da Secretaria Geral da Presidência da República para, em nível federal, é um documento construído de forma coletiva com o intuito de defendermos a necessidade de um bom planejamento da infraestrutura. O processo de construção da nota técnica foi possível com a parceria das organizações da sociedade civil (Transparência Internacional-Brasil; GT Infra; IEMA; ISA) em conjunto com o IBRAOP. Com a realização do Encontro Técnico Nacional de Auditoria de Obras Púbicas (ENAOP), que concluiu dia 15 de junho, foi possível compartilhar essa produção junto aos diversos órgãos que atuam nas obras públicas no Brasil, o que pode auxiliar no aperfeiçoamento das atividades de Auditoria de Obras Públicas e na defesa de um consistente planejamento da infraestrutura no Brasil. Essa temática adveio de um projeto do Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas – IBRAOP para a elaboração dos procedimentos de auditoria de riscos e impactos socioambientais de planos, projetos e execução de investimento em infraestrutura (https://www.ibraop.org.br/procedimentos-socioambientas/). Perguntas simples nortearam o estudo e troca de conhecimento: Como o planejamento de infraestrutura pode resultar em melhores escolhas, em termos de maiores benefícios socioeconômicos para a sociedade?  Como evitar intervenções que levem ao desperdício do dinheiro público e graves danos socioambientais? De acordo com o diretor-presidente do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), André Luis Ferreira, foram questões como essas que motivaram a elaboração da nota técnica “Critérios para análise e classificação de empreendimentos de infraestrutura propostos para inclusão no Plano Plurianual 2024-2027 e no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI)”. O documento contém um conjunto de critérios para a análise prévia de alternativas de investimentos em infraestrutura e uma proposta de categorias de diagnóstico e de classificação com o objetivo de contribuir com a escolha de projetos incluídos no planejamento do governo. “Lançada no ano passado, essa nota é um esforço coletivo de cinco entidades: a IEMA, o Ibraop, a Transparência Internacional-Brasil, o Instituto Socioambiental (ISA) e o GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental. É uma tentativa de fazer com que a administração pública considere o interesse público quando da definição da sua agenda de projetos”, concluiu Ferreira. O GT Infraestrutura entende, na opinião do secretário executivo Sérgio Guimarães: “que precisamos atuar para aperfeiçoar o planejamento de infraestrutura no país, não é discutir obra a obra, mas saber aonde queremos chegar e traçar quais os melhores caminhos considerando os aspectos de justiça socioambiental”. Clique e confira a íntegra da Nota Técnica do IBRAOP/TI BRASIL/GT INFRA/IEMA/ISA!

Infraestrutura, Desmatamento e Ações Necessárias

Consequências e Causas do desmatamento. São amplamente conhecidas as consequências diretas e indiretas do desmatamento da Amazônia; sobre a floresta, suas comunidades e o clima regional e global. Está evidenciado também, segundo a quase unanimidade dos cientistas, que a continuidade dessa dinâmica levará a floresta ao ponto de “não retorno”, a partir do qual pode se desencadear processos irreversíveis de degradação,  perdendo a capacidade de se regenerar por si mesma. O que na prática pode significar o fim da floresta enquanto bioma capaz de contribuir para a estabilidade do clima, agravando de forma dramática e até mesmo imprevisível situações climáticas extremas já vivenciadas em todo Brasil, como fortes secas e inundações. Contexto em que se tornarão inócuos todos os esforços que estão sendo feitos pelo Brasil e outros países para reverter a situação. Por isso mesmo, existe um consenso entre cientistas, setores do governo e importantes segmentos da sociedade, especialmente as comunidades da região, que é urgente reduzir e zerar o desmatamento na Amazônia. Nesse sentido, o Brasil tem compromissos internos e internacionais bem claros de desmatamento zero até 2030 – sem esquecer a necessidade de investir forte em restauração florestal. Na Cop26 em Glasgow, por exemplo, o país se comprometeu a zerar o desmatamento ilegal até 2028 e neutralizar as emissões de carbono até 2050.[1] Grandes obras de infraestrutura são historicamente e continuam sendo, um dos principais vetores de desmatamento; rodovias, ferrovias e hidrelétricas têm se constituído ao longo dos anos, mesmo com medidas compensatórias estabelecidas (nem sempre cumpridas), em uma das causas fundamentais de desmatamento na região amazônica; pois viabilizam a ocupação do território e a expansão da agropecuária que impõem mudanças de uso do solo na região, principalmente considerando as condições de governança territorial. Desde a BR 364, que impulsionou a ocupação de Rondônia, (iniciada no governo de Juscelino Kubitscheck e concluída a ligação entre Cuiabá e Porto Velho, em 1966), a BR  230, conhecida como Transamazônica, até a BR 163 (Cuiabá – Santarém), todas se constituíram no fator decisivo do processo de devastação na região. A BR-163 por exemplo continua sendo o principal vetor do desmatamento em toda sua área de influência  e causando enormes danos.[2] Da mesma forma, grandes hidrelétricas como Tucuruí no rio Tocantins, Belo Monte no rio Xingu, Santo Antônio e Jirau no rio Madeira e quatro barragens construídas simultaneamente no  rio Teles Pires (afluente do Tapajós) além dos impactos diretos na floresta, na fauna aquática, no regime hídrico de grandes rios e nas comunidades ribeirinhas, também contribuem para o desmatamento, emissões de metano e outros gases de efeito estufa e a ocupação desordenada da região, incentivando a migração para cidades da região que já padecem de enormes déficits de infraestruturas básicas. A perspectiva de um grande número de novos empreendimentos de infraestrutura[3] nos setores de transporte e energia, anunciadas em diferentes programas governamentais, têm um gigantesco potencial de impacto. Na grande maioria dos casos, os estudos realizados subestimam os riscos socioambientais, os impactos cumulativos entre diversos projetos no mesmo território e, sequer, avaliam alternativas. A título de exemplo, estudo realizado pelo CPI, centro de pesquisa ligado à PUC/RJ, mostra que somente a pavimentação da BR 319 tem uma área de influência de 300 mil Km² com enorme potencial de desmatamento. Para se ter uma ideia da dimensão desse território, o Estado de São Paulo  tem 248 mil Km² de superfície.[4] Grandes projetos têm sido apresentados sem estudos suficientes para uma tomada de decisão com base técnica. Em sua maioria têm sido definidos a partir de interesses políticos e de setores econômicos diretamente envolvidos e que aprofundam o modelo de desenvolvimento que tem causado todo o processo de desmatamento na região.  Citamos aqui a Ferrogrão (um projeto de ferrovia de 933 km² de extensão, entre Sinop (MT) e Santarém (PA) passando por áreas extremamente sensíveis),[5] hidrelétricas no Rio Madeira, hidrovia no Tocantins e mais recentemente a proposta de Corredores de Integração Sul Americana.[6] Esse conjunto de empreendimentos, se implementados nas atuais condições de governança territorial, agravarão ainda mais os impactos sobre a floresta, suas comunidades e o clima regional e global e certamente, contribuirão para inviabilizar o alcance das metas de redução do desmatamento previstas, tanto internamente, (sintetizadas no PPCDAm)[7], bem como, o cumprimento dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil[8] em relação às emissões de gases GEE. Acordos que estabelecem uma redução de 48,4% em relação às emissões de 2005, já em 2025, e de 53,1% em 2030. O aumento vertiginoso de eventos extremos no Brasil e em todo o mundo não deixa dúvidas da necessidade de cumprimento dessas metas. A urgência de combater e zerar o desmatamento – o que é preciso ser feito Importantes esforços estão sendo desenvolvidos nessa agenda, tanto por organizações da sociedade, com a realização de estudos e ações de incidência; quanto pelo próprio governo, com a implementação do PPCDAm[9] e em alguns casos, alcançando resultados significativos[10], porém ainda, largamente insuficientes diante da magnitude dos desafios. Portanto, é urgente ampliar e fortalecer as diversas frentes de ação para reduzir os riscos socioambientais e econômicos de grandes obras de infraestrutura. Uma estratégia de atuação efetiva deve ter como meta principal a proteção da floresta, dos sistemas hídricos e ao mesmo tempo respeitar as comunidades e beneficiar a economia regional e a vida no planeta como um todo, especialmente, em termos de biodiversidade, e equilíbrio climático. Deve estabelecer espaços de diálogo entre o poder público, organizações da sociedade, movimentos sociais e seus aliados, assim como de outros stakeholders-chaves; tanto para tratar de casos emblemáticos nos territórios, quanto para estabelecer mecanismos que fortaleçam as políticas públicas e os processos de tomada de decisão. Para superar problemas crônicos, sobretudo, relacionados aos riscos socioambientais e ao desrespeito de direitos de comunidades locais, é preciso que a participação ocorra desde o início do processo decisório dos grandes empreendimentos. É fundamental garantir o direito à Consulta Livre, Prévia e Informada das comunidades potencialmente atingidas. A falta de transparência e participação da sociedade contribuem para a escolha de mega-projetos que atendem principalmente os interesses de

Mais duas vitórias na bacia do Juruena: governo federal promete desistir de vez da UHE Castanheira

De Rede Juruena Vivo O GT Infra, a Rede Juruena Vivo e parceiros articularam reuniões no MME e na Casa Civil e as conquistas precisam ser comemoradas: depois do arquivamento do licenciamento, governo retira Castanheira do Plano Decenal de Energia (PDE) e promete saída do Plano de Parcerias e Investimentos (PPI).  Por Larissa Silva (Rede Juruena Vivo) e Andreia Fanzeres (OPAN) Após uma longa batalha liderada pela Rede Juruena Vivo, a construção da Usina Hidrelétrica (UHE) de Castanheira, proposta para barrar o rio Arinos, afluente do Juruena, e o arquivamento do processo de licenciamento ambiental do projeto pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso (SEMA-MT), o Ministério de Minas e Energia (MME) anunciou em reunião em Brasília que vai retirar o projeto da nova versão do Plano Decenal de Energia (PDE). A decisão foi anunciada diante de lideranças indígenas e da sociedade civil durante o Acampamento Terra Livre (ATL) no dia 25 de abril. E representa um marco na proteção dos direitos das comunidades afetadas e na preservação do meio ambiente, depois de anos de preocupações e resistência. O projeto da UHE Castanheira foi previsto para o rio Arinos, no município de Juara, no noroeste de Mato Grosso, e teve estudos conduzidos pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Mas, por causa da sua potência irrisória (140MW) e por se localizar num rio estadual, seu licenciamento ambiental, que teve início em 2013, ficou a cargo da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA).  Desde então, o projeto enfrentou forte oposição da comunidade local devido aos seus potenciais impactos ambientais, culturais e socioeconômicos. Estudos mostraram que a construção da usina afetaria cinco diferentes povos indígenas: Rikbaktsa, Munduruku, Apiaká, Kawaiwete e Tapayuna, que não foram consultados de forma livre, prévia e informada, como manda a legislação. Além disso, os Tapayuna nunca foram chamados para a discussão sobre o empreendimento, que se localiza em seu território de ocupação tradicional. Os danos no ecossistema do rio Arinos, vital para a sobrevivência dessas comunidades, geraram preocupação quanto à reprodução física e cultural de suas populações. Durante a reunião no MME, Dilma Maria Mani, liderança do Povo Kawaiwete, destacou a importância do rio Arinos para as comunidades indígenas: “A água não é mercadoria para nós, a água é vida! Nós não queremos um rio contaminado, nós queremos água limpa. A gente precisa viver com água limpa. Porque quando a gente tem água limpa, a gente tem uma vida saudável”. “Nós não queremos essa usina que vai estragar o rio que pertence ao nosso povo, onde nós buscamos a nossa alimentação, tiramos o nosso sustento para alimentar nossos filhos. É ali que a gente toma banho, que temos as nossas festas, os nossos rituais, é onde buscamos o que oferecer, nós precisamos ter o nosso rio, o lugar de lavar nossas almas. Então hoje pedimos aqui para as autoridades do ministério que retirem do PDE, que não deixem que essa usina seja colocada lá. Quem vai sofrer somos nós. Será que o nosso rio vai ficar só na história? Não, nós queremos o nosso rio vivo!” continuou Dilma. Além dos impactos sobre as comunidades indígenas, o projeto também enfrentou críticas quanto ao aspecto socioeconômico. Produtores rurais das comunidades de Pedreira e Palmital, que teriam suas propriedades alagadas, temem que suas atividades sejam prejudicadas ou impossibilitadas com a construção da usina. Além disso, a viabilidade econômica do empreendimento é questionada, visto seu alto custo e baixa capacidade de geração de energia. Na reunião no MME, representantes da Rede Juruena Vivo apresentaram um documento solicitando a retirada do projeto da UHE Castanheira do PDE, destacando a necessidade de respeito aos direitos indígenas, à proteção ambiental e à consulta prévia, livre e informada das comunidades afetadas. Diante dos argumentos apresentados, Thiago Vasconcellos Barral Ferreira, secretário nacional de transição energética e planejamento do MME, informou que a UHE Castanheira seria excluída do PDE 2024-2034. Brent Millikan, do GT Infraestrutura, avalia que a promessa deverá mesmo ser cumprida: “O PDE é reeditado anualmente e, em tese, o governo poderia tentar retomar o projeto.  No entanto, com toda oposição dos movimentos de base e todos os indícios técnicos de que o projeto é muito ruim em termos sociais, ambientais e econômicos – e considerando ainda o arquivamento do licenciamento ambiental pela SEMA  – não é provável que o governo federal tente retomar o projeto, pelo menos nos próximos anos”.  Apesar disso, o projeto ainda permanece no Plano de Parcerias e Investimentos (PPI) do governo federal. Régis Fontana Pinto, diretor do PPI, recebeu a Rede Juruena Vivo, a Coalizão Pelos Rios e a Operação Amazônia Nativa (OPAN) na Casa Civil da Presidência da República no dia seguinte, 26 de abril, e garantiu que o pedido pela retirada do projeto da UHE Castanheira do programa será cuidadosamente analisado, mas não deu prazo para a decisão final.

Organizações da sociedade civil cobram da Cargill o cumprimento de promessas para evitar o desmatamento

Novo relatório cita fornecedores existentes da gigante do agronegócio envolvidas em ilegalidades Foto de capa: Raissa Azeredo Minneapolis, MN — Hoje, a Stand.earth, em parceria com a AidEnvironment e 13 outras organizações brasileiras e internacionais, divulgou um novo relatório detalhando um conjunto de políticas e práticas necessárias para que a multinacional Cargill Inc. cumpra com o compromisso anunciado em novembro de 2023 de manter a sua cadeia de fornecedores de commodities agrícolas – incluindo soja, milho, trigo e algodão –  livre de desmatamento e conversão de florestas, tanto no Brasil, como no Uruguai e na Argentina, até o ano de 2025. Além de um roteiro de dez etapas, foi apresentado um dossiê com detalhes sobre fornecedores da atual cadeia de abastecimento da Cargill que violam as políticas existentes da empresa relacionadas ao desmatamento e outras formas de destruição da natureza. A Stand.earth, juntamente com a Amazon Watch, a Rainforest Action Network, a International Rights Advocates, a GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental, a Mighty Earth, a Eko, a Global Witness, a Friends of the Earth e outras organizações brasileiras e internacionais solicitam à Cargill, como demonstração de boa fé, que retire estas empresas de sua cadeia de  fornecedores. “Através de nossa investigação, conseguimos identificar meios para a Cargill começar a cumprir imediatamente com compromissos assumidos pela empresa sobre a proteção de alguns dos ecossistemas mais críticos da América do Sul”, disse Joana Faggin, investigadora sénior da AidEnvironment. “Cabe à família Cargill-MacMillian colocá-los em ação”. O relatório vem um mês depois que a Stand.earth, em coordenação com a Repórter Brasil, lançou um relatório revelando violações recorrentes da legislação ambiental e de direitos humanos, inclusive de povos indigenas,  no Brasil, em contraste com compromissos que afirmam o contrário. Com ambos os relatórios, a família Cargill-MacMillan, proprietária da Cargill, tem elementos contundentes para entender melhor a destruição que sua empresa vem causando na América do Sul e os passos necessários para cumprir com os compromissos públicos assumidos pela empresa. “É hora de a família Cargill-MacMillan garantir que sua empresa cumpra seus compromissos e deixe um legado de liderança em vez de promessas não cumpridas”, disse Mathew Jacobson, diretor da campanha Burning Legacy da Stand.earth. “Eles precisam implementar os passos delineados no relatório, cancelar contratos com empresas que violam suas políticas existentes e retirar o seu apoio à construção de uma ferrovia para a exportação de grãos que atravessaria a Floresta Amazónica.” Infelizmente, o compromisso anunciado em novembro passado não é o primeiro do género assumido pela Cargill. De fato, a Cargill assumiu já assumiu diversos compromissos ao longo dos anos em relação ao desmatamento e aos direitos humanos que não cumpriu. Fornecer uma lista suja de fornecedores dá à família e à empresa a capacidade de agir de acordo com os seus compromissos, retirando-os imediatamente da sua atual cadeia de abastecimento. “A Cargill precisa atualizar suas políticas de cadeia de fornecimento, levando em conta as dinâmicas do desmatamento em áreas como a Amazônia, onde a expansão do agronegócio tem sido associada à extração ilegal de madeira, à grilagem de terras públicas e a conflitos com comunidades tradicionais”, disse Brent Millikan, membro da Secretaria Executiva do GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental, uma rede de organizações da sociedade civil brasileira. “Seus investimentos em transporte e infraestrutura portuária têm contribuído para conflitos socioambientais”. O relatório está sendo lançado enquanto se aguarda uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a construção da “Ferrogrão”, uma ferrovia para o transporte de soja e outras mercadorias do agronegocio com quase mil quilómetros de extensão.  Promovida pela Cargill, a ferrovia atravessaria o coração da Amazônia brasileira, afetando terras indígenas e unidades de conservação – o que contrasta  com o recente compromisso da Cargill sobre a manutenção de uma cadeia de abastecimento livre do desmatamento.  O projeto proposto transportaria grãos entre Sinop (MT), no bioma do Cerrado no Brasil Central, e os rios Tapajós e Amazonas para exportação para a Europa e China.  A gigante norte-americana Cargill cobra publicamente a retomada do projeto e alega que quem se opõe à Ferrogrão é “irresponsável“. Os povos indígenas e outras comunidades amazónicas, juntamente com organizações ambientais e de direitos humanos, dizem que isto é inconsistente com o atual compromisso da Cargill e exigem que a Cargill retire o apoio ao projeto. Pedem também ao governo brasileiro que cancele o projeto de forma a proteger a Amazónia e os meios de vida de povos indígenas e de outras comunidades locais. “A agricultura industrial é um dos maiores responsáveis pela crise das mudança climáticas”, afirmou Todd Paglia, Diretor Executivo da Stand.earth. “A família Cargill-MacMillian pode orientar a empresa para que implemente de fato o novo compromisso de não contribuir para o desmatamento, mas a prova está nas ações, não nas palavras. Estamos ansiosos para ver a Cargill tomar as medidas concretas que delineámos para tornar a sua política real.“ A Cargill é a maior empresa privada dos Estados Unidos e a maior empresa agroindustrial do mundo. Oitenta e oito por cento[1] da empresa é propriedade da família Cargill-MacMillan – cerca de 20 pessoas, divididas em dois ramos, os Cargills e os MacMillans. São a quarta família mais rica da América,[2] com mais bilionários do que qualquer outra família na Terra.[3] A família ganhou bilhões de dólares com a destruição de ecossistemas esssenciais, a violação dos direitos de povos indígenas e relações abusivas de trabalho nas suas plantações e em propriedades de fornecedores. Link para acessar o novo relatório “Promises to Keep” e o dossiê “Bad Apples” (inglês) está aqui. ### A Stand.earth (anteriormente ForestEthics) é uma organização ambiental internacional sem fins lucrativos, com escritórios no Canadá e nos Estados Unidos, conhecida pela sua investigação inovadora e campanhas bem sucedidas de envolvimento de empresas e cidadãos para criar novas políticas e padrões industriais na proteção das florestas, na defesa dos direitos dos povos indígenas e na proteção do clima. Visite-nos em www.stand.earth e siga-nos no Twitter @standearth. A AidEnvironment é uma organização sem fins lucrativos de investigação, estratégia e implementação da sustentabilidade trabalhando para conseguir uma

Um pouco de história e os gols de 2023

Foto de capa: Michel Dantas/Observatório BR-319 Desde 2012, o GT Infraestrutura tem atuado como rede de entidades da sociedade civil brasileira voltada para a incorporação de uma ótica de justiça socioambiental entre políticas, programas e projetos de infraestrutura, especialmente nos setores de transporte e energia, com destaque para a região amazônica.  A criação do GT Infra foi uma resposta da sociedade civil brasileira a problemas crônicos de grandes obras de infraestrutura na Amazônia, tais como planejamento autoritário, sub-dimensionamento de riscos socioambientais e da invisibilização de comunidades tradicionais, o que têm resultado em fenômenos como o desmatamento acelerado e graves conflitos socioambientais. A rede conta hoje com mais de 50 membros entre entidades socioambientais e movimentos sociais, além de observadores, cientistas convidados e outros aliados. Assim, as estratégias de atuação do GT Infra têm se organizado em dois eixos interligados: Nesses dois eixos estratégicos, uma característica fundamental da atuação do GT Infra tem sido as parcerias com comunidades e movimentos de base, objetivando i) o fortalecimento de iniciativas em defesa de territórios e direitos frente às ameaças e impactos socioambientais de grandes projetos, ii) a valorização de suas contribuições em debates sobre mudanças estruturantes entre políticas públicas e iii) apoio para iniciativas inovadoras de infraestrutura sustentável, voltadas ao ‘bem-viver’ das comunidades locais. Com a chegada de um novo governo federal no Brasil em janeiro de 2023, num contexto de resiliência de instituições democráticas no país e, ao mesmo tempo, a persistência de contradições numa coalizão política de ‘frente ampla`, tem surgido novas oportunidades e desafios para avançar em agendas estratégicas do GT Infra.  Essa conjuntura destaca a relevância de uma atuação estratégica do GT Infra que envolve: i) esforços de cooperação com o Poder Público na implementação de uma agenda de mudanças estruturantes entre instrumentos e processos decisórios nas políticas de infraestrutura sob uma ótica de sustentabilidade socioambiental, especialmente, na fase de planejamento setorial, e ii) o fortalecimento de iniciativas de comunidades e movimentos locais na defesa de territórios e direitos, frente às ameaças e danos de grandes projetos de infraestrutura que ainda persistem, especialmente a ação preventiva frente a empreendimentos de alto risco socioambiental no ‘pipeline’ governamental. Destaques de 2023 Nesse contexto político-institucional – e mesmo com restrições severas de recursos financeiros – cabe destacar os seguintes avanços no ano de 2023: [1] Veja a versão preliminar do plano de ação sobre o tema “transparência e participação em grandes projetos de infraestrutura” aqui [2] Veja, por exemplo, os documentos produzidos em oficinas coorganizadas com movimentos sociais em Sinop (MT)  (maio de 2023) e Santarém (PA) (setembro de 2023). [3] Sobre a Ferrogrão, veja, por exemplo, a carta encaminhada em dezembro de 2023 ao Grupo de Trabalho criado pelo Ministério de Transportes (Portaria no. 994 de 17 de outubro de 2023)  para subsidiar a tomada de decisões governamentais sobre a viabilidade socioambiental e econômico-financeira do empreendimento. [4] Veja também o documento “Notas para subsidiar debates no seminário do Itamaraty em preparação para a Cúpula da Amazônia” (maio de 2023).  Sobre a Cúpula da Amazônia, veja também o mini-documentário produzido pelo GT Infraestrutura, Fundo CASA Socioambiental e redes parceiras.

Organizações da sociedade civil propõem suspensão do projeto da Ferrogrão

Entidades defendem nova concepção sobre a infraestrutura para a Amazônia, priorizando a qualidade de vida de populações locais, a redução das desigualdades sociais e o apoio a arranjos produtivos da sociobiodiversidade, gerando emprego e renda. Brasília, DF – O GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental, uma rede de mais de 50 organizações da sociedade civil brasileira, enviou na quarta-feira (20) uma carta ao grupo de trabalho criado pelo Ministério dos Transportes para analisar a viabilidade econômica e socioambiental do projeto da Ferrogrão (EF-170), a polêmica ferrovia proposta para incentivar a exportação de soja e outros grãos do agronegócio matogrossense por vias terrestres conectadas a terminais portuários e uma hidrovia no rio Tapajós, em plena Amazônia.   A Ferrogrão foi idealizada por um grupo de ‘tradings’ do agronegócio (Amaggi, ADM, Bunge, Cargill e Dreyfus) para baratear os custos de transporte de grãos destinados à exportação, envolvendo a construção de uma ferrovia de 933 km entre Sinop (MT) e Miritituba (PA). Seus defensores argumentam que a Ferrogrão deve receber incentivos como projeto ‘verde’, por reduzir a utilização de combustíveis fósseis, em comparação com o atual transporte da soja por caminhões na rodovia BR-163.   Por meio da Portaria nº 994 de 17/10/2023, o Ministério dos Transportes criou um Grupo de Trabalho para acompanhar os processos e estudos relacionados ao projeto, com foco nos aspectos de viabilidade socioambiental e econômica. Além de instâncias do Ministério dos Transportes, participam o Instituto Kabu, Rede Xingu+, e os autores da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no. 6553, que questionou a redução do Parque Nacional de Jamanxim para abrir caminho a um trecho da ferrovia.   Citando graves problemas de viabilidade econômico-financeira e riscos socioambientais da Ferrogrão, identificados em estudos técnico-científicos, o GT Infraestrutura conclui pela necessidade de suspensão do projeto, argumentando que o governo deve rever o atual sistema de planejamento de logística de transporte na região, no sentido de permitir a identificação de alternativas com maiores benefícios socioeconômicos para a sociedade, e menores riscos socioambientais.    Segundo a carta do GT Infra, os estudos preliminares da Ferrogrão demonstram um forte ‘viés otimista’, superestimando a viabilidade econômica do projeto, enquanto subestimam seus riscos socioambientais e financeiros. Os estudos preliminares da Ferrogrão estimaram investimentos de bens de capital (CAPEX) de R$10,68 bilhões com um tempo de implantação do projeto de nove anos. Em contraste, um estudo independente demonstrou que o CAPEX da Ferrogrão seria, na realidade, da ordem de R$34 a 40 bilhões, e que o tempo de implantação do empreendimento teria uma duração de 22 a 24 anos. Para viabilizar financeiramente a Ferrogrão, seria necessário um investimento de R$30 a 37 bilhões do Tesouro Nacional, prejudicando o atendimento de prioridades como a recuperação da precária malha rodoviária existente no país.   Outra falha grave de planejamento apontada é que os estudos preparatórios da Ferrogrão, assim como a atual versão do Plano Nacional de Logística (PNL 2035), não consideraram a concorrência com outras rotas de escoamento de grãos que afetaria a sua lucratividade, a exemplo da FICO (Ferrovia de Integração do Centro-Oeste), da extensão da Ferronorte e da FIOL (Ferrovia de Integração Oeste-Leste). Além das evidências de inviabilidade econômico-financeira da Ferrogrão, a carta aponta uma série de riscos socioambientais do projeto que foram subestimados, envolvendo o aumento do desmatamento e conflitos fundiários na Amazônia, em contraste com as prioridades de governo relacionadas à proteção da Amazônia, redução das desigualdades e respeito aos direitos humanos. Por fim, a carta chama atenção para a falta de respeito dos empreendedores da Ferrogrão para o direito dos povos indígenas e outras populações tradicionais a processos de consulta livre, prévia e informada, levando em conta os protocolos de consulta, antes da tomada de decisões políticas que afetem seus territórios e direitos. Para Sérgio Guimarães, Secretário Executivo do GT Infra, “as inconsistências do projeto da Ferrogrão, e sua inclusão no  PPI e no novo PAC, são um reflexo de problemas crônicos do atual sistema de planejamento da logística de transportes, voltado para atender interesses de grrandes grupos econômicos, sem considerar alternativas de investimento, em termos de custo-benefício social, econômico e ambiental. Precisamos de uma nova concepção de infraestrutura para a Amazônia, priorizando serviços que contribuam para a qualidade de vida e a redução de desigualdades sociais, com destaque para o apoio a arranjos produtivos da sociobiodiversidade, gerando renda e emprego, e o fortalecimento da segurança alimentar”, completou.   O GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental vem acompanhando e contribuindo para debates públicos sobre a Ferrogrão nos últimos anos, tendo apresentado uma carta de alerta a potenciais financiadores do empreendimento, em conjunto com a produção de material educativo: https://gt-infra.org.br/9-alertas-ferrograo/,   Leia na íntegra a carta ao Grupo de Trabalho da Ferrogrão aqui