O desmatamento da Amazônia e o Sistema Cantareira

Reservatório depende de “rios voadores” que saem da floresta. Entenda Sérgio Guimarães, diretor executivo do GT Infra No início de janeiro de 2021, o Sistema Cantareira, que abastece a região metropolitana de São Paulo, voltou a operar em alerta, com pouco mais de 35% de sua capacidade. A redução do volume de chuva sobre a região têm a ver com isso, claro, mas uma das causas do problema está a milhares de quilômetros de distância: na Amazônia. Em 2020, segundo o INPE, a Amazônia teve recordes de focos de incêndio e de área desmatada. Foram derrubados 11,1 mil km² de Amazônia Legal de agosto de 2019 até julho de 2020, quase 10% a mais que o mesmo período do ano anterior. O que isso tem a ver com a Cantareira? Tudo! É que boa parte das chuvas que chegam à região Sudeste do país vem da Amazônia que, inclusive, produz umidade que gera chuvas até mesmo em outros países da América do Sul, como Uruguai e Paraguai. É o fenômeno conhecido como “Rios Voadores”, que são grandes fluxos aéreos de água alimentados pela umidade produzida pela maior floresta tropical do mundo. Rios voadores? Os rios voadores são, como o nome sugere, fluxos de vapor de água invisíveis, que podem transportar mais água que o próprio iio Amazonas. Como isso acontece? Por evapotranspiração, as árvores bombeiam a água das chuvas, que fica retida em suas copas, de volta para a atmosfera. As árvores também conseguem puxar a umidade dos oceanos para o continente. De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpe), uma árvore de grande porte pode transpirar de 300 a 1000 litros de água por dia. Se lembrarmos que estamos falando de um bioma com mais de 600 milhões de árvores podemos entender a relevância do fenômeno: cerca de 20 trilhões de litros de água são enviados para a atmosfera todos os dias. Tudo está interligado O relatório “O Futuro Climático da Amazônia”, publicado em 2014 pelo Inpe em parceria com a Articulação Regional Amazônica (ARA) , mostra como a floresta é importante para regular o Clima de todo o planeta. Um dos motivos é que os rios voadores influenciam no regime de chuvas e na temperatura das regiões às quais chegam. A tragédia é que, quanto mais destruímos a floresta, mais o clima vai sofrer. Não é só o desmatamento anual que diminui os rios voadores, mas também o acumulado dos últimos anos. Voltando ao Cantareira, se um sistema está no limite, menos volume de água nos rios voadores, pode causar um desabastecimento. Segundo a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), responsável pelo Reservatório, pode ser que as chuvas, esperadas para os próximos meses, sejam um alívio, evitando uma nova crise hídrica grave. Mas, as chuvas dependem da floresta. Para a gente preservar o Sistema Cantareira precisamos preservar a Amazônia também. É por isso que diversos segmentos da sociedade no Brasil e em todo o mundo estão preocupados com a nossa floresta, especialmente quando o assunto é conter o avanço das mudanças climáticas e garantir as metas do Acordo de Paris para manter o aumento da temperatura abaixo de 2°C. O clima está todo conectado, não podemos separar uma coisa da outra. Por isso é tão importante que a sociedade atue para conter a crise climática. A mitigação e a adaptação às mudanças climáticas exigem planejamento, implantação de medidas de proteção e sistemas de informação e de alerta preventivo, bem como novos investimentos. Caso contrário, os efeitos dela estarão cada vez mais perto de nós. O Sistema Cantareira é só um exemplo. Este artigo foi originalmente publicado no Climatempo.

Bancos de desenvolvimento, ajudem-nos a apagar os incêndios em nossa casa

Ilan Zugman* Neste novembro, enquanto enormes áreas naturais do Brasil recuperam-se de uma catastrófica temporada de incêndios, executivos de mais de 450 instituições financeiras de todo o planeta participaram, entre os dias 9 e 12, do primeiro encontro global de bancos públicos de desenvolvimento, o Finance in Common (FiC). O cenário de terra arrasada do Pantanal brasileiro, com suas chocantes carcaças de animais incinerados e sua vegetação virando cinzas, pode parecer distante dos debates sobre fluxos financeiros. Porém, um tem tudo a ver com o outro. A relação se dá à medida em que os bancos de desenvolvimento do Brasil e de todo o mundo definem, em certo grau, o “pipeline” — para usar uma expressão típica do mercado —, de investimentos e de projetos cruciais para a economia. Suas escolhas podem direcionar a sociedade para uma recuperação justa e equitativa ou para o velho normal do pré-pandemia. Em termos climáticos, isso significa que os fluxos financeiros controlados por essas instituições podem contribuir para estimular as iniciativas de resiliência de que os países tanto precisam ou agravar severamente os extremos climáticos, como as secas históricas que, somadas a outros fatores, propiciam o cenário ideal para os incêndios descontrolados em nossos biomas. Por isso, ativistas de mais de 300 instituições da sociedade civil em diversos países aproveitaram o encontro inédito das instituições financeiras para enviar um recado simples: queremos que o dinheiro do contribuinte pare de alimentar as chamas que estão destruindo nossa casa comum e passem a ser usados em projetos de adaptação aos extremos climáticos, redução das emissões de gases do efeito estufa e promoção urgente de justiça social e racial. O desafio é grande, mas as oportunidades também são. O volume de atividades dos bancos públicos de desenvolvimento chega a US$ 2 trilhões por ano, o equivalente a 10% de todo o investimento realizado no mundo, segundo os organizadores do FiC. O Brasil, aliás, é o campeão mundial em número de bancos de desenvolvimento: são 21 instituições desse tipo no país. No entanto, uma parte significativa dos recursos dessas instituições ainda é alocada nos setores que nos trouxeram à crise climática que vivemos, os de petróleo, gás e carvão. Segundo relatório divulgado em outubro deste ano pela ONG alemã Urgewald, só o Banco Mundial emprestou mais de US$ 12 bilhões a projetos de combustíveis fósseis desde 2015, quando o Acordo de Paris foi assinado. Um caso emblemático foi a aprovação, em maio de 2020, de um empréstimo de US$ 38 milhões para a implementação da política brasileira de exploração de petróleo e gás. Em plena pandemia, enquanto o mundo debatia pacotes de recuperação baseados em apoio a energias limpas e a pequenos negócios, o banco escolheu direcionar recursos para uma atividade que agrava a emergência climática, concentra ganhos nas mãos de algumas poucas empresas e gera desastres ambientais que prejudicam as comunidades mais pobres. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a mais conhecida instituição desse tipo no Brasil, também tem muito a melhorar nesse sentido. Um cálculo da 350.org feito com base em dados do próprio banco mostra que os empréstimos da instituição para projetos de petróleo, gás e carvão, entre 2009 e 2019, somaram mais de R$ 90 bilhões. Francamente, é uma cifra vergonhosa para um banco que destaca o desenvolvimento social em seu nome. A falta de ambição e a ambiguidade de vários bancos de desenvolvimento nos fazem questionar: a preocupação com o meio ambiente e a assistência às comunidades mais vulneráveis não deveriam ser uma prioridade e, sobretudo, um tema transversal e obrigatório nas escolhas de financiamento, especialmente quando esses empréstimos são feitos com dinheiro público? Não se trata, aqui, de negar os esforços que essas instituições cultivam ou os diversos projetos louváveis que viabilizam. Trata-se, isso sim, de dizer aos bancos públicos que a sociedade civil está farta do jogo duplo que as instituições financeiras ainda fazem e que o tempo para a hipocrisia climática acabou. Pelos “tubos” que os bancos públicos de desenvolvimento controlam podem passar tanto a água que apagará os incêndios em nossos biomas quanto o combustível que nos levará a um cenário ainda mais infernal de extremos climáticos. A pressão da sociedade para que façam a escolha certa está aumentando. É hora de transformar os discursos bem intencionados em realidade. *diretor interino da 350.org Foto: Lucas Landau/ Ação em frente ao BNDES – ativistas pedem que parem de financiar combustíveis fósseis Esse artigo foi originalmente publicado no Jornal Correio Braziliense, em 15 de novembro de 2020.

Carta aberta ao presidente do Senado pela suspensão da apreciação de matérias polêmicas enquanto durar pandemia Covid-19

Organizações, coletivos e redes assinam carta aberta conjuntamente na qual requerem ao presidente do Senado e do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre, a suspensão de apreciação e votação de matérias polêmicas, de relevante interesse público e que possam causar efeitos deletérios ao meio ambiente, à economia e à sociedade brasileira, enquanto durarem as restrições de acesso às dependências do Senado, excetuadas as matérias de urgência relativas ao enfrentamento da crise associada aos impactos da pandemia Covid-19 (coronavírus). Leia a íntegra da carta.

Nova Hidrovia Paraguai-Paraná: uma análise abrangente

O estudo apresentado objetivou analisar a mais recente proposta da Hidrovia Paraguai-Paraná: um estudo de viabilidade elaborado pelo Instituto Tecnológico de Transportes e Infraestrutura da Universidade Federal do Paraná, encomendado pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), sob seus aspectos econômicos e socioambientais, além de sua interface com outros instrumentos de planejamento, como o Plano de Recursos Hídricos da Bacia do Rio Paraguai. Tece reflexões a partir de consultas a organizações da sociedade civil e órgãos públicos, em relação à hidrovia. A análise foi feita por meio do programa Corredor Azul, da Wetlands International, que tem como objetivo salvaguardar a saúde e conectividade das áreas úmidas do Sistema Paraná-Paraguai. Coordenado pelo escritório da América Latina e Caribe, na Argentina, o programa é executado em três áreas úmidas icônicas do sistema: Pantanal, no Brasil, e Esteros de Iberá e Delta do Paraná, na Argentina. O Programa Corredor Azul conta com o apoio de DOB Ecology. Para acessar a análise completa, clique aqui.

Análise jurídica do Projeto de Lei 1962/2015: flexibilização e retrocessos no licenciamento ambiental das Pequenas Centrais Hidrelétricas

O Projeto de Lei 1962/2015 propõe a simplificação do procedimento para licenciamento ambiental de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e Centrais Geradoras de Energia (CGHs), comumente consideradas obras de baixo impacto ambiental. Especialistas, no entato, afirmam que os efeitos cumulativos destes empreendimentos são proporcionais aos das grandes usinas hidrelétricas. Eles dividem os impactos em duas categorias. O primeiro deles, chamado de aditivo, é a somatória de impactos de mesma natureza. Um exemplo é a modificação do regime hidrológico decorrente de construção de pequenas hidrelétricas em cascata em uma determinada bacia hidrográfica. Já os impactos sinérgicos são os decorrentes de ações distintas e que resultam em impactos de natureza diferente e de consequências e implicações mais abrangentes. Eles podem ser verificados se observadas transformações hidrológicas, aumento da temperatura da água, contaminação dos rios etc. Por esses motivos, a International Rivers, uma das organizações que compõem o GT Infraestrutura, elaborou uma análise jurídica do PL 1962/2015. Para acessar, clique aqui.

Lei Geral do Licenciamento Ambiental: Análise e propostas do GT Infraestrutura

O Projeto de Lei n° 3729/2004 inspirou dezenas de debates no cenário político nacional envolvendo, além dos parlamentares, ambientalistas, entidades da sociedade civil, órgãos de controle e setores econômicos como a indústria e agronegócio. A proposta em discussão é encontrar consenso acerca das regras do licenciamento ambiental para assegurar o desenvolvimento socioeconômico sem que haja danos ambientais. Por esse motivo, o Grupo de Trabalho (GT) Infraestrutura organizou este documento no qual elenca os pontos que considera essenciais de serem alterados e/ou acrescidos ao texto apresentado. Neste documento detalhamos e apresentamos soluções que consideramos importantes para buscar o consenso sobre a Lei Geral de Licenciamento Ambiental, de forma a garantir níveis razoáveis de segurança jurídica, socioambiental e econômica para os empreendimentos. Clique aqui e veja todas as análises e propostas.

Declaração de organizações da sociedade civil sobre a crise do desmatamento e queimadas na Amazônia brasileira

Uma declaração conjunta sobre a crise do desmatamento e queimadas na Amazônia, assinada por 110 organizações da sociedade civil, incluindo redes, e movimentos sociais e parlamentares do Congresso Nacional, foi entregue à Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP25), em Madri, na Espanha, em dezembro de 2019. O documento é uma crítica ao desmonte das políticas públicas de prevenção e controle do desmatamento na região e a consequente abertura de espaço para grileiros, garimpeiros e madeireiros ilegais, detalhando as ações e omissões do governo brasileiro que, segundo os signatários, estão diretamente relacionadas ao salto nos altos índices de desmatamento e queimadas registrados em 2019. Assista ao vídeo do seminário “Desmatamento e Queimadas na Amazônia: Tendências, Dinâmicas e Soluções”, realizado no dia 28 de novembro de 2019, na Câmara dos Deputados, em Brasília: Veja a íntegra da carta – Clique Aqui

Lideranças Munduruku do baixo Teles Pires mobilizam alianças pela defesa do rio Teles Pires

Lideranças Munduruku do baixo Teles Pires, em luta por seus direitos, mobilizam alianças pela defesa do rio Teles Pires ameaçado pelo complexo de usinas hidrelétricas que existem na região. Os Munduruku do baixo Teles Pires uniram-se com mais de 4 mil indígenas de 100 etnias de todo Brasil para reivindicar direitos. Segurando faixas, que expressam suas lutas, eles protestaram, em Brasília, durante — Acampamento Terra Livre — ATL2018 entre os dias 23 e 27 de abril de 2018. As lideranças realizaram denúncias, em audiências públicas e assembléias do evento, e reuniram com o Procurador Regional da República, Felício Pontes, da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (6ª CCR do MPF). “O rio Teles Pires é a vida do povo Munduruku! Governo e usinas violam nossos direitos e matam nosso rio”. “As hidrelétricas destruíram nossos locais sagrados! Exigimos justiça pela morte da nossa mãe Karobixexe e Deckoka´a!”, eram as mensagens de denúncia das faixas feitas pelos Munduruku da aldeia Teles Pires, que participaram das mobilizações do ATL. A região onde vivem os indígenas está há oito meses sob intervenção militar. Os graves problemas sociais e ambientais, que acontecem no Teles Pires, seguem sem que haja uma posição do governo, que não seja a intimidação em colocar a Força Nacional para barrar o direito de manifestação dos indígenas e evitar o diálogo. “Por causa do rio Teles Pires que nós viemos participar aqui do ATL. Para mostrar pro governo que a gente não quer mais a barragem no rio Teles Pires”, reforçou Danilo Krixi Munduruku, liderança da aldeia Teles Pires, sobre a intenção da ida para Brasíli O Fórum Teles Pires produziu um dossiê para sistematizar os impactos provocados pelas usinas nas populações do baixo Teles Pires. Leia e compreenda os conflitos que existem na região causados pelas usinas: Clique aqui O GT Infraestrutura, rede de entidades da sociedade civil,, em parceria com diversas outras organizações socioambientais e de defesa dos direitos humanos, divulgou uma nota pública para denunciar as graves violações de direitos, que vivem as populações na região do baixo Teles Pires. Leia a nota na íntegra: Clique aqui Ao longo do rio Teles Pires, afluente do rio Tapajós, quatro grandes usinas estão em fases avançadas de implantação. As UHEs Sinop e Colíder, com licenciamento prévio e de instalação concedidos pela SEMA-MT, juntas com a UHE Teles Pires (já em funcionamento) e a UHE São Manoel (com licença de operação concedida pelo IBAMA) geram inúmeros impactos nas populações e comunidades que vivem ao longo do rio. Visita à aldeia Uma das reivindicações das lideranças Munduruku ao procurador Felício Pontes da 6ª CCR do MPF, foi a solicitação de uma audiência, inspeção e perícia, nas comunidades indígenas do rio Teles Pires, para comprovar os impactos causados pelas usinas São Manoel e Teles Pires sobre seus meios de vida e direitos, conforme repetidas denúncias ao longo dos últimos meses.. Os indígenas realizaram uma assembléia na aldeia Teles Pires, localizada no município de Jacareacanga (PA), antes de irem à Brasília, para construírem suas pautas de reivindicação. Cerca de 150 Munduruku da região do baixo Teles Pires estiveram reunidos na aldeia, no início de abril, e construíram uma carta, encaminhada ao MPF, pedindo soluções para os problemas causados pelos empreendimentos instalados na região que vão desde a repressão da Força Nacional à destruição de locais sagrados. “Queremos que o procurador veja e relate os problemas que estão acontecendo na nossa comunidade por causa das usinas. Porque já tentamos várias vezes diálogo com as empresas e junto com o governo e não nos ouvem. As usinas estão violando todos os nossos direitos, temos problemas no PBAI (Projeto Básico Ambiental Indígena) das duas usinas no rio Teles Pires, impactos em nossa cultura e continua a presença da Força Nacional na Usina de São Manoel”, relata trecho da carta encaminhada ao MPF. O documento foi levado à Brasília e debatido com o procurador Felício Pontes durante a programação do ATL. “Essa Força Nacional (no rio Teles Pires) é trágica. Eu não vejo nenhuma necessidade de isso acontecer. Isso faz com que haja um movimento contrário aos direitos dos povos indígenas. Bloqueia participações que para mim são democráticas, porque eles estão defendendo seus direitos e não são quaisquer direitos, são direitos fundamentais dos povos indígenas, que estão em jogo, afirmou o procurador. Segundo Pontes, o MPF vai construir estratégias conjuntas com as populações que vivem na região do Teles Pires para garantir os direitos dessas comunidades, que estão sendo violados nesse momento. “O MPF não pode se furtar a estar próximo dos povos indígenas, sobretudo numa situação dramática essa, eles perderam praticamente aquilo que tem de mais importante pra eles que é o rio Tapajós e o rio Teles Pires ali naquela região”, ressaltou. De acordo com a comunidade, os estudos feitos pelos empreendimentos da Companhia Hidrelétrica Teles Pires (CHTP) e da Empresa de Energia São Manoel (EESM) não são confiáveis e os Projetos Básicos Ambientais Indígenas (PBAIs), que existem para promover mitigações e compensações de impactos causados pelos empreendimentos, foram construídos sem o diálogo com as comunidades. Ao longo dos últimos 10 anos o MPF ingressou na Justiça Federal com mais de 18 Ações Civis Públicas (ACP’s) sobre irregularidades nos processos de planejamento e licenciamento ambiental das usinas Teles Pires e São Manoel. A grande maioria das ACP’s tiveram decisões favoráveis na justiça, em caráter liminar e de mérito das ações; no entanto, essas decisões têm sido inviabilizadas pela utilização da Suspensão de Segurança, instrumento autoritário com origens na ditadura militar, que permite a presidentes de tribunais em instância superior, a pedido do governo, suspender sentenças judiciais, invocando uma suposta ameaça à ‘ordem social e econômica’ nacional. Articulações por direitos Após agenda em Brasília, as lideranças Munduruku seguiram para a cidade de Sinop (MT) e realizaram uma audiência com o Procurador da República, Leandro Musa, que é um dos responsáveis direto, no MPF, pela defesa dos direitos dos povos indígenas da região do baixo Teles Pires. Na ocasião os indígenas entregaram a carta de reivindicações ao procurador, que afirmou que irá tomar providências e

Nota Pública: Violação de direitos indígenas na construção de hidrelétricas no Rio Teles Pires

Força Nacional, atuando como segurança privada, reprime povos indígenas em hidrelétrica na Amazônia. Os movimentos sociais e demais organizações da sociedade civil, abaixo-assinados, vêm registrar seu repúdio à continua violação dos direitos de povos indígenas e da legislação ambiental pelos empreendedores, licenciadores e financiadores de um conjunto de quatro grandes barragens hidrelétricas no rio Teles Pires, na fronteira entre os estados de Mato Grosso e Pará. O episódio mais recente desse descaso com os direitos humanos no rio Teles Pires envolve uma portaria do recém-criado Ministério da Segurança Pública – publicada no Diário Oficial da União na quinta-feira, 01/03 – que determina a prorrogação por mais 90 dias da presença da Força Nacional, iniciada em outubro passado, nos canteiros da Usina Hidrelétrica (UHE) São Manoel, alegando uma suposta ameaça à “ordem pública” por parte do povo indígena Munduruku. Desde 2011, os povos indígenas Kayabi, Apiaka e Munduruku, assim como pescadores e agricultores familiares, têm denunciado sucessivos casos de desrespeito aos seus direitos e da legislação ambiental no planejamento, licenciamento e construção de um conjunto de quatro grandes barragens no rio Teles Pires (UHEs Sinop, Colíder, Teles Pires e São Manoel). Somente no caso da UHE São Manoel, o Ministério Público Federal já ajuizou sete Ações Civis Públicas, citando ilegalidades que incluem a falta de consulta e consentimento livre, prévio e informado junto aos povos indígenas, estudos de impacto ambiental incompletos, ameaças a indígenas em isolamento voluntário, e o repetido descumprimento das condicionantes de licenças ambientais pelos empreendedores. Chegou-se ao ponto do Ministério de Minas e Energia ter pressionado o antropólogo responsável pelo componente indígena do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da usina São Manoel, a modificar seu relatório, cuja conclusão principal era de que o projeto – previsto para construção a poucos metros do limite de um território indígena, onde vivem as três etnias logo rio abaixo – era inviável, do ponto de vista de suas consequências socioambientais. Ademais, decisões judiciais favoráveis às ações do Ministério Público Federal têm sido paralisadas repetidamente por meio da “Suspensão de Segurança”, manobra jurídica da época da ditadura que permite a presidentes de tribunais suspenderem decisões judiciais de instâncias inferiores, alegando ameaça à “ordem social e econômica”, apontada de forma genérica. Utilizado sem a necessária fundamentação, o instituto da Suspensão de Segurança serve a arbitrariedades no âmbito do Judiciário, atendendo a interesses de empresas e aliados políticos, em detrimento da proteção constitucional dada ao meio ambiente, aos povos indígenas e a outras populações tradicionais. Nesse contexto de ilegalidades, o complexo de usinas hidrelétricas no rio Teles Pires tem destruído espaços sagrados para os povos Munduruku, Kayabi e Apiaka – como o Morro dos Macacos e Sete Quedas, a morada da Mãe dos Peixes (Dekuka´a e Karobixexe, respectivamente, no idioma Munduruku) provocando danos irreversíveis ao patrimônio cultural e espiritual das comunidades indigenas da região. Em julho de 2017, os Munduruku ocuparam o canteiro da usina São Manoel, protestando contra a destruição de lugares sagrados e outros impactos devastadores das usinas São Manoel e Teles Pires, como o comprometimento da qualidade da água e consequências sobre os peixes e a pesca, base da segurança alimentar, dentro dos territórios indígenas rio abaixo. Juntamente com outros integrantes do Fórum Teles Pires, coalização de organizações da sociedade civil que acompanha as violações a direitos no âmbito do complexo hidrelétrico na região, os indígenas apresentaram um dossiê com fartas evidências das consequências das barragens. Na época, o Presidente da FUNAI e representantes do IBAMA e empresas assumiram uma série de compromissos com os Munduruku que, na sequência, foram descumpridos. Em setembro de 2017, a Presidência do IBAMA concedeu a Licença de Operação (LO) para a UHE São Manoel, contando com o aval do Presidente da FUNAI. Ambos desconsideraram frontalmente os pareceres técnicos desfavoráveis à concessão da LO, elaborados pelas equipes do IBAMA e da FUNAI, que destacaram o descontrole de impactos socioambientais da UHE São Manoel e usinas a montante no rio Teles Pires, além do descumprimento de condicionantes de licenças anteriores pelo empreendedor e um grande risco de agravamento de conflitos com os povos indígenas. Em seguida, o MPF recomendou ao IBAMA a suspensão da LO da usina São Manoel, mas foi ignorado. Desde setembro de 2017 – muito antes da chegada da Força Nacional ao canteiro da São Manoel – lideranças indígenas do baixo Teles Pires têm cobrado o cancelamento da Licença de Operação para a usina da São Manoel, citando as diversas violações de seus direitos. Ao mesmo tempo, reivindicaram uma audiência com o governo na aldeia Teles Pires, do povo Munduruku. Porque suas solicitações foram ignoradas pelo governo, cerca de 150 munduruku foram até o canteiro de obras da usina São Manoel, no último dia 13 de outubro, para reivindicar seus direitos e o cumprimento dos compromissos firmados na ocupação de julho de 2017 – em especial, sobre a destinação de urnas funerárias em posse do consórcio da UHE Teles Pires Os indígenas também pretendiam fazer rituais e visitar um dos seus territórios sagrados, o Dekuka’a (Morro dos Macacos), destruído pelo canteiro de obras da usina São Manoel. Ao invés de aceitar o diálogo, a resposta do governo federal foi o envio da Força Nacional para o canteiro da usina São Manoel para conter a mobilização indígena, composta em grande parte por mulheres e crianças. De acordo com o Movimento Munduruku Iperegayu, que coordenou a mobilização, a Força Nacional não apenas impediu a realização dos rituais, como chegou a utilizar bombas de efeito moral para reprimir a mobilização munduruku. Esse emprego da Força Nacional foi autorizado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), em atendimento a uma solicitação do Ministério de Minas e Energia (MME). Seguindo a mesma lógica perversa da ‘Suspensão de Segurança’, que visa criar um estado de exceção para a construção de barragens na Amazônia marcadas pelo desrespeito às leis, a Força Nacional é utilizada agora para reprimir os protestos dos povos indígenas do rio Teles Pires, atuando como segurança privada do consórcio EESM (Empresa de Energia São Manoel) liderado pelas