Carta Aberta ao Novo Governo: Infraestrutura para o Desenvolvimento com Sustentabilidade Socioambiental

Aos Exmos. Senhores Luiz Inácio Lula da Silva, Presidente da República Geraldo Alckmin, Vice Presidente da República e Ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços Com cópia para os Exmos. Senhores Márcio Macedo, Ministro da Secretaria Geral/PR Rui Costa, Ministro da Casa Civil/PR Simone Tebet, Ministra do Planejamento Marina Silva, Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima Alexandre Silveira, Ministro de Minas e Energia Renan Filho, Ministro dos Transportes Márcio França, Ministro de Portos e Aeroportos Sônia Guajajara, Ministra dos Povos Indígenas Silvio Almeida, Ministro dos Direitos Humanos Flávio Dino, Ministro da Justiça Anielle Franco, Ministra da Igualdade Racial Margareth Menezes, Ministra da Cultura Nísia Trindade, Ministra da Saúde Fernando Haddad, Ministro da Fazenda Paulo Teixeira, Ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar Waldez Góes, Ministro da Integração e Desenvolvimento Regional Aloizio Mercadante, Presidente do BNDES    O Grupo de Trabalho Infraestrutura e Justiça Socioambiental (GT Infra) é uma rede de organizações da sociedade civil brasileira que vem atuando desde 2012 em prol da sustentabilidade socioambiental em políticas, programas e projetos de infraestrutura, especialmente nos setores de transporte e energia, com destaque para a região amazônica.   Considerando os compromissos assumidos pelo Presidente Lula e seus ministros com a abordagem transversal de temas ambientais como política de governo, inclusive com vistas ao desmatamento zero na Amazônia e outras medidas de enfrentamento da crise das mudanças climáticas, apresentamos, a seguir, um conjunto de recomendações de ações estratégicas para avançar efetivamente nessa direção.   Ressaltamos que esta Carta Aberta traz uma atualização da correspondência enviada a Vossas Excelências e sua equipe de transição governamental em 25/11/22 subscrita por cerca de 100 membros e aliados do GT Infraestrutura. Ademais, a presente carta vem acompanhada por três correspondências com propostas específicas para os setores de transportes e energia, que estão sendo encaminhadas simultaneamente aos titulares das respectivas pastas.   Uma nova visão sobre a infraestrutura para o desenvolvimento sustentável É preciso superar a velha ideia, ainda predominante, de que a infraestrutura é sinônimo de grandes obras de engenharia, caríssimas, altamente visíveis, definidas e executadas pelo governo e por grandes empresas, sem a necessidade de transparência e participação ativa da sociedade.   Nesse sentido, membros e aliados do GT Infra têm trabalhado junto com comunidades locais, especialmente na Amazônia, para buscar respostas à pergunta: qual é a infraestrutura que precisamos para melhorar a nossa qualidade de vida e conservar nosso meio ambiente?   Entendemos que uma nova conceituação sobre a infraestrutura  é essencial para colocar em prática a política do novo governo sobre a transversalidade de temas ambientais, abordando as seguintes questões fundamentais: A natureza como Infraestrutura – lembrando das palavras de Maura Arapiun, secretária do Conselho Indígena Tapajós-Arapiuns: “A principal infraestrutura da Amazônia é a floresta em pé”. As Soluções baseadas na Natureza (SbN) tratam a natureza como uma infraestrutura viva e essencial. Portanto, é preciso buscar soluções baseadas na convivência com os ecossistemas e os biomas endêmicos; A infraestrutura voltada para a qualidade de vida das populações locais: os bens e serviços da infraestrutura devem priorizar melhorias na qualidade de vida dos indivíduos, famílias e comunidades que compõem as populações locais, à luz dos objetivos e metas da Agenda 2030 da ONU, contemplando: a) as atividades produtivas que contribuam para a segurança e soberania alimentar, e para a geração de emprego e renda, valorizando a sociobiodiversidade como caminho para diversificar a oferta de alimentos, fibras e materiais, com a criação de novas oportunidades de negócios e, b) serviços de saúde, educação, mobilidade, conectividade, conforto térmico e habitação, com atenção especial para as crianças e para as pessoas mais frágeis, ressaltando o lema adotado pelas Nações Unidas de “não deixar ninguém para trás”. Nesse esforço, é preciso que os investimentos em infraestrutura tenham efeitos duradouros sobre serviços e organização coletiva, onde as comunidades e suas organizações atuem como protagonistas centrais do desenvolvimento sustentável.  Cuidados com médios e grandes projetos de infraestrutura: uma nova visão sobre infraestrutura para o desenvolvimento sustentável tem importantes implicações para o planejamento, licenciamento e financiamento de médias e grandes obras de infraestrutura, que incluem, entre outras: i) fortalecimento de instrumentos de análise prévia sobre impactos socioambientais (inclusive cumulativos) e viabilidade econômica, abordando cenários e investimentos alternativos, utilizando metodologias robustas, com participação cidadã e transparência, ii) respeito aos direitos de povos indígenas, comunidades tradicionais e outros grupos vulneráveis, e iii) articulação com estratégias de desenvolvimento local e regional com sustentabilidade socioambiental.  Estes e outros pontos chave são abordados nas propostas a seguir.   Fortalecimento do planejamento estratégico de políticas e programas setoriais Uma prioridade fundamental no processo de tomada de decisão sobre políticas e projetos de infraestrutura é a criação e/ou fortalecimento de instrumentos de planejamento na fase pré-projetos, especialmente nos setores de transportes e energia. Tal esforço deve envolver instrumentos inovadores de análise multicriterial, como Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) com  a utilização de metodologias participativas para a análise de oportunidades e riscos socioambientais, facilitando a identificação de melhores alternativas para a sociedade brasileira – incluindo as comunidades locais – em termos econômicos, sociais e ambientais, descartando-se iniciativas que não se justificam sob a ótica do interesse público – considerando fatores como o nível de degradação ambiental e impactos adversos sobre comunidades locais, inclusive violações de seus direitos. Nessa direção, propomos a criação de um Grupo de Trabalho Interministerial, com a participação dos ministérios do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Planejamento, Transportes, Minas e Energia, Povos Indígenas e Direitos Humanos, e com envolvimento de organizações da sociedade civil, para desenvolver um sistema robusto de critérios, indicadores e instrumentos para a avaliação de oportunidades, riscos socioambientais e alternativas no planejamento estratégico de obras de infraestrutura, na fase pré-projetos.  É fundamental que, antes do anúncio e da definição e tomada de decisão sobre quaisquer programas e projetos, o governo federal, em conjunto com governos estaduais, considere e avalie profundamente as diferentes alternativas – por exemplo,  diferentes rotas e modais no setor de transportes, e alternativas de transição energética no setor de energia – com análise antecipada de questões socioambientais e econômicas, inclusive necessidades

Carta ao Ministro de Portos e Aeroportos: Propostas de Ação para a Política de Transportes Fluviais no Novo Governo

Ao Exmo Sr. Márcio França, Ministro de Portos e Aeroportos com cópia: Exmo. Sr.  Márcio Macedo, Ministro da Secretaria Geral/PR Exmo. Sr. Rui Costa, Ministro da Casa Civil/PR Exma. Sra. Simone Tebet, Ministra do Planejamento Exma. Sra. Marina Silva, Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima Exma. Sra. Sônia Guajajara, Ministra dos Povos Indígenas Exmo. Sr. Aloizio Mercadante, Presidente do BNDES    Prezado Ministro, O Grupo de Trabalho Infraestrutura e Justiça Socioambiental (GT Infra) é uma rede de organizações da sociedade civil brasileira que vem atuando desde 2012 em prol da sustentabilidade socioambiental em políticas, programas e projetos de infraestrutura, especialmente nos setores de transporte e energia, com destaque para a região amazônica.   Nesta carta, apresentamos um conjunto de propostas de ação estratégica para o novo governo, referentes às políticas públicas para o setor de transportes, com foco sobre  transporte aquaviário. Ressaltamos que as propostas contidas neste documento complementam a Carta Aberta ao Novo Governo: A Infraestrutura para o Desenvolvimento com Sustentabilidade Socioambiental, sendo apresentada simultaneamente ao novo governo do Presidente Lula. De forma geral, os processos de tomada de decisão sobre políticas, planos, programas e projetos de infraestrutura no Brasil têm sido marcados por lacunas, inconsistências técnicas e a falta de transparência, que o distanciam das boas práticas verificadas em nível internacional. Assim, é fundamental o fortalecimento e aperfeiçoamento de instrumentos de planejamento, com a definição de um novo marco legal/institucional do processo decisório, antes da tomada de decisões sobre o portfólio dos projetos a serem incluídos no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) e no Plano Plurianual (PPA).  Tal esforço deve envolver instrumentos inovadores de análise multicriterial de cenários de logística que possibilitem a identificação das melhores alternativas para a sociedade brasileira (incluindo comunidades locais) em termos econômicos, sociais e ambientais. De forma semelhante, é preciso garantir melhorias na análise prévia de riscos e impactos socioambientais entre os principais instrumentos de planejamento de projetos de infraestrutura: Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental – EVTEA e Estudos de Impacto Ambiental (EIAs). Nessa direção, entendemos que é fundamental fortalecer o marco legal e institucional sobre o planejamento e o licenciamento ambiental de hidrovias, garantindo a realização de análises robustas sobre riscos socioambientais, inclusive impactos cumulativos com outros empreendimentos, e alternativas, com transparência e participação popular, respeitando o direito à consulta livre, prévia e informada junto aos povos indígenas e outras comunidades tradicionais.  Assim, juntamente com a antecipação da análise socioambiental em nível de políticas e programas na fase pré-projetos, é preciso garantir melhorias na análise prévia de riscos e impactos socioambientais entre instrumentos de planejamento de projetos de hidrovias e portos, no âmbito de Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental – EVTEA e Estudos de Impacto Ambiental (EIAs).  Frente a esse desafio, propomos que seja instituído um grupo de trabalho liderado pela ANTAQ e representantes deste ministério e do MMA, para definir e implementar metodologías participativas de análise de riscos socioambientais no planejamento de hidrovias (inclusive, o papel de terminais portuários) bem como a proposição de regramento sobre processos de licenciamento ambiental com participação social, levando em conta necessidades de adequação e passivos de projetos existentes. Nesse sentido, merecem atenção especial as hidrovias em funcionamento e propostas nas bacias do Tapajós, Tocantins e Madeira.  Considerando o exposto, propomos a realização de reunião com o Senhor Ministro e membros de sua equipe, com a brevidade possível, a respeito da implementação dessas propostas de ação no setor de transportes fluviais como parte integrante da agenda do novo governo federal.     Brasília, D.F.,  22 de março  de 2023   Cordialmente,   GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental   Confira a original, em pdf, aqui: Carta ao Ministro de Portos e Aeroportos

Carta ao Ministro de Transportes: Propostas de Ação para a Política de Transportes no Novo Governo

Exmo Sr. Renan Filho, Ministro de Transportes com cópia: Exmo. Sr.  Márcio Macedo, Ministro da Secretaria Geral/PR Exmo. Sr. Rui Costa, Ministro da Casa Civil/PR Exma. Sra. Simone Tebet, Ministra do Planejamento Exma. Sra. Marina Silva, Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima Exma. Sra. Sônia Guajajara, Ministra dos Povos Indígenas Exmo. Sr. Aloizio Mercadante, Presidente do BNDES   Prezado Ministro, O Grupo de Trabalho Infraestrutura e Justiça Socioambiental (GT Infra) é uma rede de organizações da sociedade civil brasileira que vem atuando desde 2012 em prol da sustentabilidade socioambiental em políticas, programas e projetos de infraestrutura, especialmente nos setores de transporte e energia, com destaque para a região amazônica.   Nesta carta, apresentamos, um conjunto de propostas de ação estratégica para o novo governo, referentes ao setor de transportes.  Ressaltamos que as propostas contidas neste documento complementam a Carta Aberta ao Novo Governo:  Infraestrutura para o Desenvolvimento com Sustentabilidade Socioambiental sendo apresentada simultaneamente ao novo governo do Presidente Lula.   Fortalecimento de Instrumentos de Planejamento Estratégico Os processos de tomada de decisão sobre políticas, planos, programas e projetos de infraestrutura no Brasil têm sido marcados por enunciados genéricos, lacunas e inconsistências técnicas e falta de transparência.  O resultado é que a inclusão de projetos no Plano Plurianual (PPA) e no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), bem como a respectiva programação orçamentária se dão principalmente em função de pressões políticas e empresariais e sem a necessária transparência e debate público.  É fundamental o fortalecimento e aperfeiçoamento do planejamento de infraestrutura de transportes, com a definição de um novo marco normativo/institucional do processo decisório.  Tal marco deve prever instrumentos inovadores de análise multicriterial de cenários de logística que possibilitem a identificação das melhores alternativas para a sociedade brasileira (incluindo comunidades locais) em termos econômicos, sociais e ambientais, antes da definição dos portfólios de projetos do PPA e do PPI. De forma semelhante, é preciso garantir melhorias na análise prévia de riscos e impactos socioambientais, inclusive sob a ótica dos compromissos nacionais sobre as mudanças climáticas, entre os principais instrumentos de planejamento de projetos de infraestrutura de transportes: Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental – EVTEA e Estudos de Impacto Ambiental (EIAs).  1.1  Revisar o atual Plano Nacional de Logística (PNL 2035),  de modo a incorporar análise de alternativas de projetos e de rotas de escoamento de cargas.  Ao contrário das  boas práticas internacionais de planejamento de infraestrutura, o PNL 2035 não apresenta os prós e contras de um leque de opções de investimentos, em especial no que se refere aos riscos econômicos, sociais e ambientais.  Deste modo, não se pode garantir que o portfólio de projetos resultantes do plano seja o mais apropriado para atender às necessidades logísticas do país. Vale destacar que tais lacunas e outras inconsistências já haviam sido apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em seu relatório de auditoria operacional do PNL 2035, realizado no ano de 2021.  1.2  Revisar o Plano Nacional de Viação de 2018, que atualmente orienta os investimentos para construção de estradas na Amazônia, seguindo diretrizes estabelecidas no ainda período do governo militar, desconsiderando os conhecimentos e estudos mais recentes sobre a biodiversidade na Amazônia e a população de povos indígenas existente na região. 1.3  Viabilizar a realização de Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) com metodologias participativas no setor de transportes, em situações como dos corredores logísticos de transporte de commodities, abordando riscos socioambientais e o potencial de impactos cumulativos e sinérgicos entre empreendimentos no mesmo território (p.ex. rodovias, hidrovias e portos, ferrovias) considerando as alternativas. Assim, cabe priorizar o Corredor Logístico Tapajós-Xingu (BR-163, Ferrogrão, portos e hidrovia no rio Tapajós) para realização de Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), incluindo a análise de alternativas de rotas de escoamento, objetivando desdobramentos de ações e políticas voltadas para o fortalecimento da governança territorial, inclusive resolução de passivos socioambientais, e promoção do desenvolvimento regional sustentável (veja itens 2 e 3) 1.4   Fortalecer o marco legal e institucional sobre o planejamento e o licenciamento ambiental de hidrovias, garantindo a realização de análises robustas sobre riscos socioambientais, inclusive impactos cumulativos com outros empreendimentos, e alternativas, com transparência e participação popular, respeitando o direito à consulta livre, prévia e informada junto aos povos indígenas e outras comunidades tradicionais. Tal processo deve servir de base para a tomada de decisões sobre o prosseguimento de empreendimentos, de forma articulada com planos de gestão de bacias hidrográficas e de desenvolvimento territorial. Propomos que seja instituído um grupo de trabalho liderado pelo MMA e ANTAQ para definir e implementar metodologías participativas de análise de riscos socioambientais no planejamento de hidrovias (inclusive, o papel de terminais portuários) bem como a proposição de regramento sobre processos de licenciamento ambiental com participação social, levando em conta necessidades de adequação e passivos de projetos existentes. Nesse sentido, merecem atenção especial as hidrovias em funcionamento e propostas nas bacias do Tapajós, Tocantins, Madeira.  1.5   Revisitar o marco legal das ferrovias: A Nova Lei das Ferrovias (Lei nº 14.273/2021), em razão de veto do ex-Presidente, não contemplou a necessidade de apresentação dos Estudos de Viabilidade, Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA), tampouco explicita como os eventuais projetos propostos deverão se articular com o Plano Nacional de Logística de modo a consolidar uma rede integrada e coerente.  Os EVTEA, por sua vez, são fundamentais para antecipar a análise dos aspectos socioambientais dos projetos e servir de subsídio à elaboração dos Estudos de Impacto Ambiental (EIAs) e ao licenciamento ambiental. O atual Ministro dos Transportes, Renan Filho, já indicou que irá revisar o referido marco legal. É importante, portanto, que esse veto à necessidade de apresentação dos EVTEA seja incluído nessa revisitação, bem como sua articulação com o Plano Nacional de Logística.  Ações prioritárias de prevenção e mitigação de danos socioambientais entre projetos específicos 2.1  Rodovia Cuiabá-Santarém (BR-163): qualquer iniciativa voltada para a duplicação da BR-163 deve ser precedida pela retomada urgente de ações de fortalecimento da governança e ordenamento territorial na área de influência da rodovia (regularização fundiária e proteção dos territórios de de povos indígenas e

Carta ao Ministro de Minas e Energia: Propostas de Ação para a Política Energética no Novo Governo 

Exmo Sr. Alexandre Silveira, Ministro de Minas e Energia com cópia: Exmo. Sr.  Márcio Macedo, Ministro da Secretaria Geral/PR Exmo. Sr. Rui Costa, Ministro da Casa Civil Exmo. Sra Simone Tebet, Ministra do Planejamento Exma. Sra. Marina Silva, Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima Exma. Sra. Sônia Guajajara, Ministra dos Povos Indígenas Exmo. Sr. Aloizio Mercadante, Presidente do BNDES    Prezado Ministro, Como organizações e redes da sociedade civil brasileira que atuam sobre a política energética, dentro de uma visão de justiça social e sustentabilidade ambiental, apresentamos, a seguir, um conjunto de propostas de ação estratégica para o novo governo, referentes às políticas públicas para o setor de energia. Ressaltamos que as propostas contidas neste documento complementam a Carta Aberta ao Novo Governo:  Infraestrutura para o Desenvolvimento com Sustentabilidade Socioambiental sendo apresentada simultaneamente ao novo governo do Presidente Lula. Realização da Conferência Nacional de Energia como espaço de diálogo qualificado com a sociedade civil sobre os rumos da política energética nacional e regional, com atenção especial para a visão estratégica e para o marco regulatório de uma transição energética sustentável, justa, popular e inclusiva.   Revisão do Plano Nacional de Energia (PNE 2050), do Plano Decenal de Energia (PDE), do Plano Nacional de Eficiência Energética, do Plano Indicativo de Gasodutos de Transporte (PIG 2022), do Plano Decenal de Expansão da Malha de Transporte Dutoviário (PEMAT 2022) e do Programa de Expansão da Transmissão/Plano de Expansão de Longo Prazo (PET/PELP 2022) orientados por uma visão estratégica de uma transição energética sustentável, justa, popular e inclusiva, alinhada com as políticas setoriais sobre mudanças climáticas, biodiversidade, gestão das águas, direitos humanos e economia verde de baixo carbono.   Incluir a participação de pelo menos mais três representantes de organizações da sociedade civil no Conselho Nacional de Política Energética – CNPE, assegurando a representação de movimentos sociais e de entidades que atuam em prol de direitos socioambientais, de defesa do consumidor e de alternativas de energias renováveis em base comunitária.   Criação de um programa nacional de eficiência energética, com instrumentos e metas voltados para diferentes setores da indústria, o setor comercial e prédios públicos, envolvendo parcerias entre o governo federal, estados e municípios.     Criação de um programa federal de incentivo à adoção da mini e micro geração distribuída de energias renováveis, com prioridade para grupos de baixa renda.  Nessa direção, propomos que o programa inclua entre suas metas a instalação de pelo menos quatro milhões de sistemas fotovoltaicos residenciais durante o atual governo, priorizando as regiões com os menores índices de desenvolvimento social e as maiores tarifas de energia elétrica do país. Assim, propomos que todas as construções do Programa “Minha Casa, Minha Vida” a partir de agora, já utilizem a energia solar ou outras energias de fonte limpa, levando em conta as diferenças geográficas, socioeconômicas e culturais.     Aceleração na implantação do Programa Mais Luz Para Amazônia, com antecipação de metas, respeito ao direito à consulta, e capacitando as populações de regiões remotas para ocupar as vagas de trabalho geradas na instalação, gestão e manutenção dos sistemas.  Na mesma direção, é preciso avançar na implementação pelo BNDES e Eletrobras do Pacto de Energia da ONU para descarbonização na Amazônia, voltado para viabilizar projetos de energias renováveis para substituir o uso intensivo do diesel na região, com participação ativa das comunidades locais.     No marco legal e institucional do planejamento dos médios e grandes empreendimentos de geração de energia renovável (parques eólicos e  fotovoltaicos, hidrogênio verde, etc.), garantir análises robustas de riscos socioambientais e de viabilidade econômica, assim como o pleno respeito aos direitos das comunidades locais, inclusive quanto à consulta livre, prévia e informada dos povos indígenas, povos quilombolas e outras populações tradicionais.     Criação de um programa governamental, com marco legal e recursos adequados, voltado para a mitigação e reparação de danos socioambientais provocados por grandes empreendimentos de geração de energia, em que ocorreram violações de direitos de comunidades locais, a exemplo das hidrelétricas de Belo Monte no rio Xingu, Santo Antônio e Jirau no rio Madeira, e as quatros barragens no rio Teles Pires.     Suspensão de planos para a construção de novas hidrelétricas em regiões sensíveis como a Amazônia e o Pantanal, no âmbito do PDE e do PPI, inclusive as UHEs Castanheira, Tabajara, Ribeirão, Bem Querer e o Complexo Tapajós – Jamanxim, assim como CGHs e PCHs nas bacias do Juruena e Alto Paraguai (MT), particularmente o Complexo Hidrelétrico rio Cabaçal, considerando seu alto risco socioambiental, inclusive quanto a impactos cumulativos.     Considerando os elevados riscos de poluição de aquíferos, lençóis freáticos e corpos d’água, com graves implicações para serviços ecossistêmicos, conservação da biodiversidade, saúde pública e atividades econômicas (por exemplo, a agropecuária e o turismo) e levando em conta ainda os riscos de abalos sísmicos, especialmente em áreas urbanas, propomos a suspensão de projetos de fraturamento hidráulico (‘fracking’) enquanto persistirem tais riscos.     Propomos a declaração do bioma Amazônico como zona de exclusão dos planos para novas explorações de petróleo e gás no Brasil, considerando seus elevados riscos socioambientais e incompatibilidade com diversas políticas públicas e compromissos internacionais.   Considerando o exposto, propomos a realização de reunião com Vossa Senhoria e membros de sua equipe, com a brevidade possível, sobre a inclusão dessas propostas de ação estratégica na agenda do governo federal, objetivando a transição para uma nova política energética para o Brasil.            Brasília, D.F.,  21 de março  de 2023   Assinam esta carta: Grupo de Trabalho sobre Infraestrutura e Justiça Socioambiental  (GT Infra) Frente por uma Nova Política Energética para o Brasil  (FNPE) Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental (FMCJS) Movimento Tapajós Vivo Fórum de Energias Renováveis de Roraima Operação Amazônia Nativa (OPAN) Instituto Fronteiras International Rivers – Brasil 350.org Brasil Comitê de Energia Renovável do Semiárido – CERSA International Energy Initiative – IEI Brasil Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento – Formad   Confira a original, em pdf, aqui: Carta ao Ministro de Minas e Energia

CARTA DE ALTER: propuestas de infraestructura para la Amazonía

“Estamos en contra de los proyectos que nos matan, matan nuestros ríos y nuestra selva. Estos grandes proyectos no son infraestructura para nosotros, necesitamos pequeños proyectos que nos fortalezcan (…) La principal infraestructura en la Amazonía es el bosque en pie”. Maura Arapiun, secretaria del Consejo Indígena de Tapajós Arapiuns Las organizaciones vinculadas al Grupo de Trabajo de Infraestructura y redes aliadas se reunieron en Alter do Chão (Pará) del 4 al 6 de julio de 2022, con importante participación de organizaciones y movimientos sociales de la región, escuchando informes, buscando respuestas y proponiendo estrategias y acciones concretas enfrentando viejos y nuevos desafíos en la región. En consecuencia, hemos elaborado este documento dirigido a la sociedad brasileña con miras a contribuir a los debates del proceso electoral, así como a la construcción e implementación de políticas públicas a partir de 2023. En las últimas décadas, entre los principales impulsores de la deforestación y de los conflictos socioambientales en la Amazonía brasileña, están previstas obras de infraestructura para apoyar el modelo de explotación depredadora en la región, como centrales hidroeléctricas, puertos y estaciones de transbordo de granos, hidrovías, vías férreas y carreteras La situación empeoró bajo el gobierno de Bolsonaro, que promovió una serie de retrocesos en los derechos de los pueblos indígenas y comunidades tradicionales, desde el incentivo al acaparamiento de tierras públicas y áreas protegidas, que se sumó al desguace de los poderes públicos que actúan en el territorio amazónico. . Muertes brutales, como las del indigenista Bruno Pereira y el periodista Dom Phillips, lejos de ser un caso aislado, forman parte de una política de silenciamiento de líderes sociales sometidos a profundas violaciones a los más elementales derechos humanos. Brasil puede ayudar al planeta a mitigar los efectos de la crisis climática. En cuanto a infraestructura, para eso necesitamos infraestructura para la Amazonía y no solo en la Amazonía. Debemos considerar fundamentalmente el respeto y la promoción de arreglos socioproductivos capaces de convivir con el bosque y garantizar el acceso a derechos básicos como la salud, la educación, la energía y el saneamiento. El GT Infraestructura tiene claro que la selva es la principal infraestructura de la Amazonía . En su obra más reciente, dirigida por Ricardo Abramovay, propone cuatro dimensiones necesarias para repensar el sujeto: naturaleza, cuidado, servicios y organización colectiva. Es sobre esta base que presentamos propuestas de acciones concretas para cuidar el medio ambiente y las personas, impulsando una agenda de desarrollo justo, participativo e incluyente de esta fuente de conocimiento de la cual sus pueblos y comunidades tradicionales son guardianes. Nuestras propuestas: Retomar las acciones de mando y control en la Amazonía, acabando con esta cultura donde lo “ilegal” es “legal”. Reestructurar urgentemente las instituciones públicas encargadas de combatir la economía de destrucción, que consume ríos y bosques, viola los derechos humanos y profundiza la desigualdad social Asegurar la aplicación de políticas de protección forestal y defensores de derechos humanos, mitigando riesgos, para que estos pueblos puedan continuar su lucha junto a los pueblos indígenas, quilombolas, extractivistas y ribereños. Fortalecer la campaña Vida Por Um Fio: Autoprotección de Comunidades y Líderes Amenazados y también la red de protección, a nivel nacional y en cada estado. Discutir un nuevo modelo logístico para la Amazonía, repensando prioridades e institucionalizando el proceso de toma de decisiones, resultando en buenas prácticas de planificación, incluyendo la evaluación de alternativas, amplia participación de la sociedad en todas las etapas y atendiendo las demandas de promoción de los productos de la sociobiodiversidad. Revisar de manera transparente los proyectos de infraestructura logística de transporte de carga actualmente previstos en el Programa de Asociación de Inversión (PPI). Fortalecer las políticas públicas de planificación y licenciamiento ambiental de obras de infraestructura, con el objetivo de permitir mejores opciones que maximicen los beneficios para la sociedad y que eviten la repetición de desastres y violaciones de derechos. Involucrar a los beneficiarios de Amazon en el desarrollo de modelos de energía distribuida para una transición energética justa e inclusiva, asegurando energía limpia y de calidad para todos y anticipándose a las metas de universalización del gobierno federal y brindando condiciones energéticas para el desarrollo local sustentable. Adoptar políticas efectivas para incentivar el incremento de la mini y micro generación distribuida en la Amazonía, como aporte a la matriz eléctrica nacional y a una transición energética verdaderamente justa y popular. Exigir una moratoria a los nuevos grandes proyectos energéticos en la Amazonía hasta que se revise el Plan Nacional de Energía a la luz de los compromisos climáticos del país. Considerar el desarrollo urbano como un proceso fundamental para la sostenibilidad y el bienestar humano en la Amazonía, con infraestructura adecuada al contexto local. Las ciudades y los asentamientos humanos deben ser protagonistas en la implementación de medidas de conservación socioambiental, promoción de la diversidad sociocultural y mitigación y adaptación al cambio climático. Adoptar medidas para proteger los ríos, elementos vitales para el mantenimiento de la vida y la diversidad en el medio ambiente amazónico. Apoyar el seguimiento de las acciones relacionadas con el estrés antrópico impuesto a los ríos, así como aquellas que apoyen el mantenimiento de los recursos hídricos y la integridad de los sistemas fluviales. Respetar el derecho a la consulta y consentimiento libre, previo e informado de los pueblos indígenas y otras poblaciones tradicionales y fortalecer las políticas de gobernanza. Estructurar un plan integral de combate a la minería en tierras indígenas, a fin de hacer cumplir la prohibición constitucional de esta actividad en estos territorios. Reconocer que la minería no es un vector de desarrollo en la Amazonía y que necesita ser reemplazada en beneficio de otras cadenas productivas, capaces de convivir con el bosque y los ríos, asegurando derechos y reduciendo la desigualdad social. Promover y mejorar el control social en todo el ciclo de la infraestructura, incluyendo una relación más estrecha de las organizaciones de la sociedad civil y representantes de los pueblos con los tribunales de cuentas. Asegurar la transparencia de los procesos de toma de decisiones y

Letter from Alter: infrastructure proposals for the Amazon

“We are against projects that kill us, kill our rivers and our forest. These big projects are not infrastructure for us, we need small projects that strengthen us (…) The main infrastructure in the Amazon is the standing forest.”  Maura Arapiun, secretary of the Tapajós Arapiuns Indigenous Council The civil society organizations connected to the Infrastructure Working Group (GT Infraestrutura) and allied networks met in Alter do Chão (Pará State) from July 4th to 6th, 2022, with significant participation of organizations and social movements in the region.  Together we listened to reports, sought answers and proposed strategies and concrete actions that face old and new challenges in the region. As a result, we have prepared this document aimed at Brazilian society with a view to contributing to the debates of the electoral process, as well as the construction and implementation of public policies from 2023 onwards. In recent decades, large infrastructure projects – such as the opening and paving of highways, industrial waterways and transhipment port facilities, railways and hydroelectric dams – have been among the main drivers of deforestation and socio-environmental conflicts in the Brazilian Amazon.   The situation worsened under the Bolsonaro government, which promoted a series of setbacks in the rights of indigenous peoples and traditional communities, incentives to land grabbing on public lands and exploitation of protected areas, as well as the scrapping of public institutions.  The brutal deaths of the indigenist Bruno Pereira and journalist Dom Phillips are far from being an isolated case; rather they are part of a policy of silencing social leaders subjected to profound violations of the most basic human rights. Brazil can help the planet to mitigate the effects of the climate crisis. For this, we need infrastructure FOR the Amazon and not just IN the Amazon. We must fundamentally consider the respect and promotion of socio-productive arrangements capable of coexisting with the forest and guaranteeing access to basic rights such as health, education, energy and sanitation. GT Infrastructure is clear that the forest is the main infrastructure of the Amazon . In our most recent publication, led by Ricardo Abramovay, it is proposed that four dimensions are necessary to rethink the subject of infrastructure: nature, care, services and collective organization. It is on this basis that we present proposals for concrete actions to care for the environment and people, promoting an agenda of fair, participatory and inclusive development, based on watersheds of knowledge of which traditional peoples and communities are guardians. Our proposals: Resume command and control actions in the Amazon, ending a culture where what is “illegal” becomes “legal”. Urgently restructure public institutions responsible for combating the economy of destruction, which consumes rivers and forests, violates human rights and deepens social inequality. Ensure the application of policies to protect forest and human rights defenders, mitigating risks, so that these people can continue their struggles together with indigenous peoples, quilombolas, extractivists and riverine people. Strengthen the Vida Por Um Fio: Self-protection of Threatened Communities and Leaders campaign and also the protection network, nationally and in each state. Discuss a new transportation logistics model for the Amazon, rethinking priorities and institutionalizing a decision-making process that results in good planning practices, including the evaluation of alternatives, broad participation of society at all stages and meeting the demands of promoting the supply chains of products based on social and biological diversity. Revise, in a transparent manner, the freight transport logistics infrastructure projects currently included in the public-private Investment Partnership Program (PPI). Strengthen public policies for planning and environmental licensing of infrastructure projects, with the objective of allowing better choices that maximize benefits for society and that avoid the repetition of disasters and violations of rights. Involve Amazon beneficiaries in the development of distributed energy models for a fair and inclusive energy transition, ensuring clean, quality energy for all and anticipating the federal government’s universalization goals, providing energy conditions for local sustainable development. Adopt effective policies to encourage the increase of distributed mini and micro generation in the Amazon region, as a contribution to the national electricity matrix and as a basis for a truly fair and popular energy transition. Demand a moratorium on new large energy projects in the Amazon until the National Energy Plan is reviewed in light of the country’s climate commitments. Consider urban development as a fundamental process for sustainability and human well-being in the Amazon, with infrastructure appropriate to local contexts. Cities and human settlements must be protagonists in the implementation of socio-environmental conservation measures, promotion of sociocultural diversity and mitigation and adaptation to climate change. Adopt measures to protect rivers, vital elements for the maintenance of life and diversity in the Amazon environment. Support the monitoring of actions related to anthropogenic stress imposed on rivers, as well as those that support the maintenance of water resources and the integrity of river systems. Respect the right of indigenous peoples and other traditional populations to  free, prior and informed consultation and consent, strengthening governance policies. Structure an integrated plan to combat mining in indigenous lands, in order to enforce the constitutional prohibition of this activity in these territories. Recognize that mining is not a vector of development in the Amazon and that it needs to be substituted in favor of other economic activities, capable of coexisting with the forest and rivers, ensuring rights and reducing social inequality. Promote and improve social control throughout the entire cycle of planning and licensing infrastructure, including a closer relationship between civil society organizations and representatives of peoples with tribunals that monitor public accounting. Ensure the transparency of decision-making processes and access to comprehensive, accessible and real-time information on specific policies, plans and projects, promoting integrity and the fight against corruption in entities, public bodies and companies in the infrastructure sector. Ensure accountability of financial institutions and companies so that they have the obligation to assume commitments and robust mechanisms regarding human rights, environmental protection and the construction of a sustainable economy. Encourage economic activities that prioritize people and the maintenance of the

CARTA DE ALTER: propostas de infraestrutura para a Amazônia

“Somos contra projetos que nos matam, matam nossos rios e nossa floresta. Esses grandes projetos não são infraestrutura para nós, precisamos de pequenos projetos, que nos fortaleçam (…) A principal infraestrutura da Amazônia é a floresta em pé.”  Maura Arapiun, secretária do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns As organizações vinculadas ao GT Infraestrutura e redes aliadas reuniram-se em Alter do Chão, PA, de 4 a 6 de julho de 2022, com participação significativa de organizações e movimentos sociais da região, ouvindo relatos, buscando respostas e propondo estratégias e ações concretas frente a velhos e novos desafios da região. Como resultado, preparamos este documento dirigido à sociedade brasileira com vistas a contribuir com os debates do processo eleitoral, bem como com a construção e a implementação de políticas públicas a partir de 2023.    Nas últimas décadas, entre os principais vetores de desmatamento e conflitos socioambientais na Amazônia brasileira, estão obras de infraestrutura planejadas para sustentar o modelo de exploração predatória da região, tais como hidroelétricas, portos e estações de transbordo de grãos, hidrovias, ferrovias e rodovias. A situação se agravou no governo Bolsonaro, que promoveu uma série de retrocessos nos direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais, a partir do incentivo à grilagem de terras públicas e áreas protegidas, que se somam ao sucateamento das autarquias públicas que atuam no território amazônico. Mortes brutais, como as do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips estão longe de ser um caso isolado, e fazem parte de uma política de silenciamento de lideranças sociais submetidas a violações profundas dos mais básicos direitos humanos. O Brasil pode ajudar o planeta a mitigar os efeitos da crise climática. No quesito infraestrutura, para tanto precisamos de infraestrutura PARA a Amazônia e não apenas NA Amazônia. Devemos considerar fundamentalmente o respeito e a promoção de arranjos socioprodutivos capazes de conviver com a floresta e garantir o acesso a direitos básicos como saúde, educação, energia e saneamento. O GT Infraestrutura tem clareza de que a floresta é a principal infraestrutura da Amazônia. Em seu mais recente trabalho, conduzido por Ricardo Abramovay, propõe quatro dimensões necessárias para repensar o assunto: natureza, cuidado, serviços e organização coletiva. É com essa base que apresentamos propostas de ações concretas para cuidar do ambiente e das pessoas, movimentando uma agenda de desenvolvimento justo, participativo e inclusivo desse manancial de saberes dos quais são guardiões seus povos e comunidades tradicionais. Nossas propostas: Retomar as ações de comando e controle na Amazônia e em outros biomas, como o Cerrado, acabando com essa cultura onde o “ilegal” é “legal”. Reestruturar urgentemente as instituições públicas responsáveis pelo combate à economia da destruição, que consome rios e florestas, viola direitos humanos e aprofunda a desigualdade social.  Garantir a aplicação de políticas de proteção dos defensores da floresta e dos Direitos Humanos, mitigando riscos, para que essas pessoas possam seguir suas lutas junto com os povos indígenas, quilombolas, extrativistas e ribeirinhos. Fortalecer a campanha Vida Por Um Fio: Autoproteção das Comunidades e Lideranças Ameaçadas e também a rede de proteção, nacional e em cada estado. Discutir um modelo novo de logística para a Amazônia, repensando prioridades e institucionalizando o processo decisório, resultando em boas práticas de planejamento, incluindo a avaliação de alternativas, ampla participação da sociedade em todas as etapas e o atendimento às demandas de promoção dos produtos da sociobiodiversidade. Revisar de forma transparente, os projetos de infraestrutura de logística de transportes de cargas atualmente previstos no Programa de Parceria de Investimentos (PPI). Fortalecer políticas públicas de planejamento e licenciamento ambiental de obras de infraestrutura, com o objetivo de permitir melhores escolhas que maximizem benefícios para a sociedade e que evitem a repetição de desastres e as violações de direitos.   Envolver os beneficiários das comunidades no desenvolvimento de modelos energéticos distribuídos para a transição energética justa e inclusiva, garantindo energia limpa e de qualidade para todos e antecipando as metas de universalização do governo federal e dando condições energéticas para o desenvolvimento sustentável local. Adotar políticas efetivas de incentivo para o aumento da mini e micro geração distribuída na região amazônica, como contribuição à matriz elétrica nacional e a uma transição energética verdadeiramente justa e popular. Reivindicar um processo de moratória para novos grandes empreendimentos energéticos na Amazônia enquanto não houver a revisão do Plano Nacional de Energia à luz dos compromissos climáticos do país.  Considerar o desenvolvimento urbano como processo fundamental para a sustentabilidade e bem estar humano na Amazônia, com infraestruturas adequadas ao contexto local. Cidades e assentamentos humanos devem ser protagonistas na implementação de medidas de conservação socioambiental, de promoção da diversidade sociocultural e de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Adotar medidas para proteger os rios, elementos vitais para a manutenção da vida e da diversidade no ambiente amazônico. Apoiar o monitoramento de ações relacionadas ao estresse antropogênico imposto aos rios, bem como aquelas de suporte à manutenção dos recursos hídricos e da integridade dos sistemas fluviais. Respeitar o direito de consulta e consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas e outras populações tradicionais e fortalecer políticas de governança  Estruturar um plano integrado de combate ao garimpo em terras indígenas, a fim de fazer cumprir a vedação constitucional desta atividade nestes territórios. Reconhecer que o garimpo não é um vetor de desenvolvimento da Amazônia e que precisa ser substituído em benefício de outras cadeias produtivas, capazes de conviver com a floresta e os rios, assegurar direitos e reduzir a desigualdade social. Promover e aprimorar o controle social, em todo o ciclo da infraestrutura, incluindo uma maior aproximação das organizações da sociedade civil e representantes de povos com os tribunais de contas.  Garantir a transparência dos processos decisórios e o acesso à informação de forma integral, acessível e em tempo real sobre políticas, planos e projetos específicos, promovendo a integridade e o combate à corrupção nas entidades, órgãos públicos e empresas do setor de infraestrutura. Responsabilizar instituições financeiras e empresas para que tenham a obrigação de assumir compromissos e mecanismos robustos a respeito dos direitos humanos, da proteção ambiental e da construção de uma

Movimentos sociais e aliados dizem não à Hidrelétrica De Tabajara, mais um mega-projeto destrutivo na Amazônia

NOTA PÚBLICA Os movimentos sociais e organizações aliadas da sociedade civil que assinam esta Nota, em conjunto com pesquisadores da comunidade científica, vêm expressar a sua preocupação com as graves irregularidades que têm caracterizado o licenciamento ambiental da Usina Hidrelétrica (UHE) Tabajara – proposta pela Eletronorte como grande barragem no rio Machado, afluente do Madeira, na fronteira entre os estados de Rondônia e Amazonas. Considerando as graves violações da legislação ambiental e dos direitos de povos indígenas e de outras populações tradicionais ameaçados, na condução de um empreendimento sem viabilidade econômica, social e ambiental, os signatários desta Nota registram o seu firme posicionamento contrário à realização de Audiências Públicas convocadas pelo IBAMA para os dias 06 e 07 de abril de 2022, considerando os motivos abaixo expressos: a) Em carta divulgada no final do Encontro de Guerreiras e Guerreiros em Defesa dos Povos e do Rio Ji-Paraná (Machado), realizado entre os dias 13 a 15 de setembro de 2018, com a presença de lideranças dos Povos Tenharim do sul do Amazonas, Karo Arara, Karipuna, Oro Waram Xijein de Rondônia – com a participação do Instituto Madeira Vivo – IMV, Conselho Indigenista Missionário – CIMI, Conselho de Missão entre Povos Indígenas – COMIN, e Comissão Pastoral da Terra – CPT/Rondônia – convocados pela Associação do Povo Indígena Tenharim Morogitá – APITEM, Organização dos Povos Indígenas do Alto Madeira – OPIAM e Aliança dos Rios Panamazônicos / Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social, os povos indígenas deixam claro que: “Somos contrários à UHE Tabajara porque ameaça a vida de vários povos indígenas em condições de isolamento e risco e nós temos o compromisso de defender a vida destes povos. Além dos dois povos já mencionados no laudo pericial do MPF, ainda existem outros três grupos em condições de isolamento que perambulam fugindo dos invasores no Maici, próximos da TI Jiahui, próximos da T.I. Igarapé Preto e na Reserva Biológica do Jarú”. Em outro trecho do documento destacam a preocupação com a situação de indígenas isolados: “Nossa preocupação aumenta porque na Bacia do Rio Madeira havia vários grupos em condição de isolamento e risco, de conhecimento da própria FUNAI, e só citados por ela posteriormente ao licenciamento da UHE Santo Antônio e Jirau. Não foi constituída nenhuma ação de proteção aos mesmos e ainda extinguiram a Frente Etnoambiental do Madeira, responsável pela localização e proteção desses povos. Por isso, denunciamos que os vestígios dos isolados na Serra Três Irmãos e Jacareúba desapareceram, o que pode significar o genocídio destes grupos em decorrência do forte processo de migração e desconfiguração da floresta por desmatamento e alagação, o que coloca o governo e empresas construtoras na condição de criminosas”. No tocante ao papel da Funai foram enfáticos: “Denunciamos que a FUNAI apresentou no Termo de Referência da UHE Tabajara só a T.I. Tenharim Marmelos como a única Terra Indígena atingida, ignorando as demais do entorno e principalmente os indígenas em condição de isolamento e risco. Esta omissão permitiu que os estudos feitos pela empresa JGP para viabilizar o projeto da UHE Tabajara, fossem incompatíveis com a realidade. Reafirmamos nosso posicionamento de que o Termo de Referência, de qualquer projeto de infraestrutura, deve ser feito junto a todos os povos afetados para evitar os erros cometidos”. No que diz respeito às demais populações tradicionais e unidades de conservação pontuaram: “Denunciamos o governo brasileiro pela omissão e pela violação de territórios ambientais de vital importância para o bioma Amazônia, com a supressão de partes de Unidades de Conservação como da Rebio Jaru e do PARNA Campos Amazônicos. Assim como a total omissão frente às graves ameaças sofridas na reserva do Rio Preto Jacundá que, sequer aparece como território ameaçado, hoje já violado por madeireiros”. b) Em documento datado em 28 de janeiro deste ano, o Comitê de Defesa da Vida Amazônica na Bacia do Rio Madeira – COMVIDA emitiu Nota Pública onde vem: “manifestar nossa indignação frente a decisão monocrática proferida pelo desembargador federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, que, analisando recurso interposto pela AGU, cassou decisão proferida pela 5ª Vara Federal de Rondônia, nos autos de uma Ação Civil Pública movida pelos Ministérios Públicos Federal e do Estado de Rondônia”, que suspendeu em dezembro de 2020 a realização de audiências públicas virtuais sobre a UHE Tabajara, em função de graves riscos à saúde de populações locais no contexto da pandemia, assim como sérios impedimentos logísticos de transporte e de comunicação, além de um conjunto de falhas e lacunas no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) que seria objeto de discussão. Segundo a carta do COMVIDA, a decisão monocrática do desembargador do TRF-1, de reverter essa decisão judicial em primeira instância, “coloca em risco a sobrevivência física e cultural de Povos e Comunidades Tradicionais da bacia do rio Machado e do rio Madeira, dadas as suas conexões hidrográficas”, uma vez que a implantação da UHE Tabajara, ignorando uma série de ilegalidades, “poderá representar o escancarar da porteira na região dos Campos Amazônicos, assim como o extermínio de indígenas em condição de isolamento, a morte da floresta e do próprio rio Machado”. c) No último dia 17 de março, os povos Karo Arara e Ikólóéhj Gavião, por meio de suas representações sociais: a Associação Indígena Karo Paygap, a Associação Indígena Ma’pâyrap Karorap e a Associação Indígena Zavidjaj Djiguhr-ASSlZA, ambas da Terra Indígena Igarapé Lourdes, em documento enviado à Procuradoria da República em Rondônia, recordaram: “que em 2018 o MPF, por meio da Antropóloga Rebeca A.A. de Campos Ferreira realizou diversas perícias técnicas apontando falhas do Estudo de Impacto Ambiental da Usina Hidrelétrica de Tabajara, o que motivou o MPF a fazer uma Recomendação à FUNAI para que incluísse no Termo de Referência as Ter ras Indígenas Tenharim do Rio Sepoti, Tenharim do Igarapé Preto, Pirahã, Ipixuna, Nove de Janeiro, Igarapé Lourdes e TI Djahui. Também, que este Parquet moveu duas ações na Justiça Federal, uma para evitar que a audiência de dezembro de 2020 acontecesse em formato virtual e outra para a inclusão dessas Terras Indígenas no referido

Infraestrutura para a Amazônia: que projetos a região realmente precisa?

Sérgio Guimarães, diretor executivo do GT Infra A pandemia do Covid-19, com grande número de infectados e mortos – mais de 210 mil só no Brasil – expôs de forma inédita uma série de fragilidades sociais e econômicas, escancarando ainda mais a imensa desigualdade social existente em nosso país. Além da saúde, os impactos atingem em cheio a economia e os empregos, desafiando a capacidade do estado apoiar as populações mais desfavorecidas. Não é à toa que a palavra de ordem em todo o mundo é a retomada da economia, incluindo-se aí, de forma definitiva, as dimensões da sustentabilidade social e ambiental. Há uma forte convergência de que investimento em infraestrutura é um dos pilares para essa retomada. Mas, qual é a infraestrutura que não leva às mesmas contradições, à concentração de renda e às crises social e ambiental? Aquela que tenha como foco a geração de empregos e renda, a melhoria dos serviços essenciais para a população e a sustentabilidade ambiental, particularmente o enfrentamento da crise climática, e contribua para o alcance dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Na Amazônia, quando se fala em infraestrutura, logo pensamos em mega obras, sejam grandes hidrelétricas ou estradas que “viabilizem a exploração” dos recursos naturais, sem considerar os impactos sobre as populações locais e o meio ambiente. Mas, será que é disso mesmo que a região precisa? A quem servem esses empreendimentos? Será que que contribuem para melhorar de alguma forma a vida das comunidades rurais e urbanas? O questionamento que deve ser feito é que infraestrutura pode contribuir efetivamente para a retomada da economia regional, reduzindo os impactos negativos sobre o meio ambiente com base em cadeias produtivas regionais, visando a construção de uma economia que valorize a floresta, em vez de destruí-la, que gere benefícios para as comunidades, em vez de impactá-las. É uma pergunta que ainda não está totalmente respondida, mas existem alguns pontos fundamentais que, necessariamente, precisam ser considerados: Uma infraestrutura voltada para a Amazônia, deve contribuir para reduzir impactos negativos sobre o clima e a biodiversidade e, ao mesmo tempo, para melhorar as condições de vida das populações locais, precisa ter como referência os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Gestão de resíduos sólidos, saneamento básico, acesso à saúde, universalização da energia elétrica, educação, melhoria nos transportes e internet de qualidade são alguns dos componentes de uma infraestrutura voltada para as pessoas e seus produtos. A participação social é fundamental em todas as fases dos projetos e esses devem incluir no total dos custos os componentes sociais e ambientais. As definições e decisões devem passar, necessariamente, por ouvir as populações locais, protagonistas e verdadeiros interessados, que podem indicar os caminhos da infraestrutura necessária e mais efetiva para a região e suas populações rurais e urbanas. Nesse sentido, uma pesquisa de percepção da população local realizada em outubro de 2020 pelo Ideia Big Data para os Institutos O Mundo que Queremos e Clima e Sociedade mostra importantes indicadores das carências regionais, das prioridades das populações locais, e traz resultados bem interessantes: A área mais carente é a saúde, indicada por 74% dos entrevistados, seguida da educação (50%) e geração de empregos. A preservação ambiental é condição fundamental para o desenvolvimento econômico na avaliação de 86% dos brasileiros que vivem na Amazônia. A atividade econômica com maior potencial a ser desenvolvida na Amazônia é o turismo (oportunidade de lucro sem necessidade de desmatamento). Por outro lado, apenas 8% dos entrevistados acreditam que a preservação ambiental interfere no crescimento econômico do país. Para 66% dos entrevistados a floresta representa o maior bem da humanidade para 66%, sendo a principal ameaça à natureza atualmente o desmatamento das florestas (56%). Quase metade dos entrevistados (49%) afirmam ainda que a opinião da população não é levada em consideração pelos políticos locais. Temos aí fortes indicadores do caminho a seguir. Uma visão muito distante das políticas públicas e decisões tomadas para a região por diferentes governos, desde os militares até o PT. É hora de ouvir as populações locais e construir uma nova economia para a região, em benefício do Brasil e sua população. Este artigo foi, originalmente, publicado no site Plurale. *A pesquisa foi realizada entre os dias 11 a 23 de outubro de 2020, com 1400 entrevistados. A margem de erro é de três pontos percentuais. Foto: Pixabay