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No ar: A dimensão socioambiental dos licenciamentos e o papel do IBAMA, com Rodrigo Agostinho

Novo presidente da autarquia, Rodrigo Agostinho, é o entrevistado de primeiro episódio da temporada do podcast Infraestrutura Sustentável   Após 4 anos de desmonte dos órgãos públicos que zelam pela sustentabilidade socioambiental do Brasil, esses espaços tão fundamentais para a democracia e para a preservação de nossos biomas estão se reestruturando. O GT Infra vê aí uma oportunidade de retomar o diálogo, colocando a infraestrutura que queremos entre as prioridades de ação deste novo período. No primeiro episódio da segunda temporada do podcast Infraestrutura Sustentável, Sérgio Guimarães recebe o novo presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama), Rodrigo Agostinho. O Ibama cuida de agendas estratégicas para o Brasil, como conservação da biodiversidade e licenciamento, e esse foi o enfoque da conversa, que já está disponível no Spotify – ou no Anchor.   Foto: Linkedin

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ARTIGO: Você sabe o que é bom pra mim? E eu, não!?

A democracia exige consulta, participação popular e comum acordo. É na tirania que se impõe a vontade de um ou de poucos a despeito da população, o amazônida deve falar por si Claudio de Oliveira* Você já pensou se uma pessoa ou empresa resolvesse fazer uma obra no quintal da sua casa e sequer lhe consultasse sobre o assunto? Se você, por acaso, já construiu uma casa, sabe bem a importância de um projeto arquitetônico. Nem todo mundo tem a possibilidade ou condição de contratar um arquiteto, mas nunca compraria tijolo, cimento e piso sem calcular a necessidade. Em uma casa familiar, os proprietários conversam antes de decidir quais são suas necessidades e prioridades. O arquiteto, quando contratado, vai conversar com eles para entender as demandas, quantos filhos têm, se recebem hóspedes, quanto tempo passam no quarto, como querem o banheiro, se a cozinha vai ser integrada à sala e se a casa terá quintal. São tantas as variáveis que é inconcebível construir antes de planejar, mas, antes disso, vem a decisão, que precede o planejamento. Quando se trata de uma obra de infraestrutura não é muito diferente. Primeiro, precisamos definir o que vamos fazer, o que de fato precisamos. Na sequência, iniciamos o planejamento. O problema é que as obras na Amazônia, há décadas, são decididas e planejadas por Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro. Muitas vezes são executadas sem a devida consulta livre, prévia e informada (CLPI), exigência da Organização Internacional do Trabalho, em sua convenção 169, assinada e incorporada ao ordenamento brasileiro. Quando falamos em “consulta livre”, entendemos que as populações indígenas ou tradicionais podem ser contra ou a favor da obra. “Prévia” quer dizer que essa consulta deve ocorrer antes de tomada a decisão. E “informada” é para garantir que a população consultada saiba exatamente o que está em jogo, numa linguagem acessível a ela. Quando olhamos para o protocolo padrão no governo, vemos decisões sendo legitimadas depois de já terem sido tomadas internamente. Não há CLPI realmente. Isso sem falar que ainda deveríamos acrescentar, nas consultas, a realidade das cidades. Ou construir uma dúzia de portos em Miritituba não impacta a vida da população urbana? O GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental atua há dez anos capacitando organizações da sociedade, movimentos de base e comunidades para entender melhor o que está em jogo no cenário da energia e do transporte. Há alguns anos, passamos a estudar e promover um entendimento no âmbito das cidades amazônicas, em temas como mudanças climáticas, adaptação, saneamento básico, desenvolvimento sustentável. A pergunta norteadora dos estudos é um mantra dentro da rede: qual é a infraestrutura que queremos? E a resposta tem guiado nossas ações: uma infraestrutura PARA a Amazônia e não NA Amazônia. No ano passado, reunimos quase cem pessoas de 40 organizações, movimentos sociais e indígenas, em Alter do Chão, no Pará, ocasião em que ficou clara a importância da floresta na vida das pessoas. Presente no encontro, Maura Arapiuns, secretária do Conselho Indígena de Tapajós Arapiuns, foi enfática ao dizer: a maior infraestrutura da Amazônia é a floresta em pé. Pensando nisso e em consonância com a demanda local, o GT Infra apresentou à equipe de transição o que espera do novo governo no quesito infraestrutura. Não se trata de dizer o que não queremos, mas daquilo que queremos. Queremos um desenvolvimento sustentável que valorize os arranjos produtivos locais e os produtos da sociobiodiversidade. Queremos que as pessoas que moram na Amazônia tenham saneamento básico, hospitais e condições de escoar os seus produtos. Queremos que as inúmeras instituições de ensino da região tenham verba para estudar a realidade local e sejam consultadas antes das tomadas de decisão, para a construção do planejamento. Queremos que as populações locais tenham voz e vez. Queremos que as pessoas e movimentos sociais de base sejam capacitados para atuarem em cooperativas (se quiserem), que alcancem o mercado brasileiro e o mercado externo, que tenham acesso a crédito. Queremos uma infraestrutura do cuidado com as pessoas. Queremos incentivar a mini e microgeração distribuída que melhor atende à realidade amazônica. Queremos água potável e tratamento de esgoto que contemple as cidades amazônicas, mas também as comunidades isoladas, que dão exemplo de maneiras sustentáveis de garantir esses direitos. Queremos os rios limpos e livres, como fonte de vida. Queremos a substituição de toda a geração de energia a base de óleo diesel na Amazônia. Queremos o BNDES valorizando a sociobiodiversidade. Queremos as instituições financeiras sendo cobradas por investimentos em projetos que geram impacto negativo na vida das pessoas, que as salvaguardas não sejam apenas uma maquiagem verde ou formas de fazer greenwashing. Trabalhamos para que a população conheça os caminhos para pleitear os seus direitos, seja na prefeitura, no governo, na União, seja com auxílio do Ministério Público Estadual e Federal, da Defensoria Pública, dos Tribunais de Contas. A participação popular, a governança e a transparência fazem parte do regime democrático e o processo de capacitação para incidência deve ser permanente, trata-se do “I” da CLPI. Uma boa referência para pensar o desenvolvimento sustentável são os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Eles trazem parâmetros, metas e indicadores. Mas essas diretrizes precisam ser adaptadas à realidade amazônica por sua população, pois foram pensadas fora do país. Ainda que tenham envolvido um grupo maior de pessoas e organizações em relação aos seus antecessores, os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), não são infalíveis ou passíveis de implantação automática. O GT Infraestrutura vê com bons olhos o espaço para diálogo, a abertura de departamentos e secretarias, na estrutura federal e se coloca à disposição para construir o diálogo necessário antes das tomadas de decisão e planejamento. *Claudio de Oliveira é membro da secretaria executiva do GT Infraestrutura, uma rede de mais de 50 organizações engajadas em prol de um Brasil com mais justiça socioambiental Este artigo foi publicado, originalmente, no Um Só Planeta (25/1/23) imagem: depositphotos

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NOTA DE REPÚDIO CONTRA ATOS EM BRASÍLIA

O GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental, seus membros e aliados registram seu total repúdio aos gravíssimos atos de vandalismo, antidemocráticos e terroristas ocorridos em Brasília no domingo (08 de janeiro de 2023), praticados por um grupo de fanáticos violentos, inconformados com o resultado democrático das urnas, e que contaram com a omissão e conivência de autoridades do Governo do Distrito Federal. Reiteramos a necessidade urgente de punir exemplarmente os responsáveis, incluindo quem orquestrou e financiou tais atos, abrangendo aí os indícios de atividades ilegais na Amazônia e setores do agronegócio.  Os que não respeitam as leis e praticam terrorismo são os mesmos que preconizam as infraestruturas mais destrutivas na Amazônia e a conversão do que hoje é crime em atividades admitidas e estimuladas. Fizeram isso por quatro anos e é essa a visão de economia e de Estado que os motiva. É preciso combatê-los. Como lembrou Frei Betto, frente ao autoritarismo só há um antídoto: mais democracia. O fortalecimento das organizações da sociedade, reforçando sua participação nos processos de tomada de decisão e tolerância zero com golpistas e atentados violentos contra a democracia são fundamentais para o Brasil enfrentar seus desafios, reduzir as desigualdades sociais e alcançar o desenvolvimento com sustentabilidade.  

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Organizações da Sociedade Civil apresentam propostas sobre Infraestrutura e Sustentabilidade para a Equipe de Transição do Governo Lula

Sob a liderança do GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental, mais de 90 entidades, redes e movimentos sociais elaboraram documento com dez propostas de ação estratégica para o novo governo, com foco na Amazônia Após um processo eleitoral sem precedentes, que exigiu uma ampla aliança em defesa da democracia, o Presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, em seu primeiro discurso após o anúncio da vitória pelo TSE na noite de 30 de outubro, trouxe expectativas animadoras em relação à abordagem de temas socioambientais pelo novo governo. Ressaltou, entre outras ações urgentes, o resgate da participação da sociedade na construção e implementação das políticas públicas, esforços redobrados no enfrentamento da crise das mudanças climáticas, com ênfase especial para alcançar o desmatamento zero na Amazônia, a desintrusão de garimpos ilegais em terras indígenas, o combate ao crime organizado e a construção de uma economia verde com inclusão social na região. Reconhecendo os enormes desafios a serem enfrentados pelo novo governo, após quatro anos de desmantelamento do Estado a serviço de um projeto de uso predatório e imediatista dos recursos naturais, bem como a necessidade de incorporar lições e evitar erros do passado, o GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental encaminhou em 25/11 uma carta assinada por mais de 90 membros e parceiros – entre movimentos e entidades de base, redes da sociedade civil, entidades socioambientais e instituições públicas e pesquisa e ensino – para o Presidente Eleito Lula e Vice-Presidente eleito Geraldo Alckmin, com dez propostas de ação estratégica relacionadas ao setor de infraestrutura, especialmente na região amazônica. Entre outros temas abordados, a carta apresenta propostas sobre fortalecimento de instrumentos de planejamento estratégico e licenciamento ambiental, ampliação e fortalecimento de espaços de participação cidadã, respeito ao direito de consulta livre, prévia e informada das povos indígenas e outras populações tradicionais, fortalecimento da governança territorial, infraestrutura para o ‘bem viver’ das populações locais, reparação de danos socioambientais sofridas por comunidades afetadas por grandes empreendimentos como Belo Monte, e o papel de instituições financeiras. A carta foi protocolada no CCBB em Brasília, e enviada pessoalmente ao Coordenador Executivo da Equipe de Transição do Governo, Aloizio Mercadante, pedindo seu empenho para garantir atenção às propostas – em grande medida de natureza transversal – entre vários grupos de trabalho temáticos afins, como de Minas e Energia, Infraestrutura, e Desenvolvimento Regional. Logo em seguida, a carta foi apresentada pelo Secretário Executivo do GT Infra, Sérgio Guimarães, em reunião do GT Meio Ambiente, coordenado pelo ex-governador do Acre, Jorge Viana e Pedro Ivo Batista da Associação Alternativa Terrazul, que conta com a participação dos ex-ministros Marina Silva, Isabella Teixeira e Carlos Minc, entre outros integrantes. Segundo Sérgio Guimarães, “deixamos claro que os membros e parceiros do GT Infra estão à disposição da equipe de transição e do novo governo vindouro, para dialogar e colaborar na implementação das dez propostas apresentadas, como contribuição para uma nova agenda de infraestrutura com justiça socioambiental – aproveitando a larga experiência e representatividade das organizações signatárias”. Leia a carta na integra aqui: Carta a Lula e equipe de Transição_Dez foto: depositphotos

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Justiça federal decide pela adequação dos estudos da Usina de Tabajara em relação aos povos indígenas e reservas extrativistas, mas população ajusante segue sendo excluída

Comunidades ribeirinhas seguem sendo excluídas na avaliação de impactos ambientais da usina de Tabajara em Rondônia No dia 24 de junho de 2022, a Justiça Federal deferiu liminarmente que sejam refeitos o Termo de Referência Específico e o Estudo do Componente Indígena do projeto de aproveitamento hidrelétrico Tabajara. O termo de referência é uma espécie de roteiro metodológico que indica o que deve ser analisado no Estudo de Impacto Ambiental de um projeto que pode causar considerável degradação ao meio ambiente e a sociedade. Apenas a Terra Indígena Tenharim-Marmelos estava incluída no escopo do Estudo do Componente Indígena da usina hidrelétrica de Tabajara, embora sequer nesse território os estudos tenham sido realizados de forma completa e adequada. Além da ameaça à povos isolados, diversas terras indígenas vinham sendo excluídas dos estudos. Atendendo ao pedido do Ministério Público Federal deverão ser incluídas as Terras Indígenas Tenharim do Igarapé Preto, Djahui, Igarapé Lourdes, Pirahã, 9 de Janeiro, Tenharim do Rio Sepoti e Ipixuna. O consórcio responsável pelos estudos é formado pelas empresas Eletronorte, Furnas, Queiroz Galvão, Enel, PCE – Projeto e Consultoria de Engenharia Ltda e JGP Consultoria e Participações Ltda. Tanto as empresas, quanto o IBAMA, vinham ignorando sistematicamente as reiteradas recomendações do Ministério Público Federal, elaboradas a partir de laudos periciais especializados, e até mesmo, desconsideraram o pedido tardio da FUNAI de que tais povos também fossem incluídos nos estudos de impacto da usina. Outro ponto importante da decisão se trata da obrigatoriedade de que seja produzido um Estudo do Componente Tradicional, com estrutura semelhante ao do Estudo do Componente Indígena, abrangendo as comunidades tradicionais localizadas na Área de Influência Direta (AID) e na Área de Influência Indireta (AII), o que inclui as 16 reservas extrativistas localizadas na região de Machadinho do Oeste e Vale do Anari. Já constava no Termo de Referênca a obrigatoriedade de estudar os impactos à população tradicional dessas reservas, a partir de dados primários, colhidos in locu com as comunidades, porém, o consórcio e a Diretoria de Licenciamento Ambiental do IBAMA, menosprezaram inclusive as exigências do órgão gestor das unidades de conservação estaduais, a Secretaria de Desenvolvimento Ambiental do Estado de Rondônia. A SEDAM foi categórica ao afirmar que o diagnóstico nas reservas extrativistas simplesmente não foi realizado. Uma das unidades, a Rio Preto Jacundá fica ao lado da área proposta para o barramento e o canteiro de obras, neste caso o empreendimento ficaria totalmente dentro de sua zona de amorteciemento. Apesar da importância da decisão, ainda há comunidades que seguem excluídas e precisam ser contempladas na avaliação de impactos ambientais da usina de Tabajara. Um dos grandes problemas no processo de licenciamento ambiental da hidrelétrica são as definições das áreas de influência do projeto. O barramento está previsto em um sequência de cachoeiras no rio Machado, próximo ao limite entre os municípios de Porto Velho e Machadinho do Oeste, no entanto, os estudos estão desconsiderando os impactos no município de Porto Velho, onde há dois distritos ribeirinhos, Demarcação, abaixo da área do barramento, e Calama, na foz do rio Machado. Essas localidades ficaram fora das áreas de influência direta e indireta, bem como do cadastro socioeconômico da população potencialmente atingida pelo empreendimento. O rio machado é fundamental para a economia dessas comunidades, que tem o pescado como principal fonte de proteína e uma das principais fontes de renda, além disso, o rio Machado é o único meio de transporte das comunidades do distrito de Demarcação. No dia 10 de maio, o Movimento dos Atingidos por Barragens protocolou junto ao processo de licenciamento ambiental de Tabajara, uma denúncia com abaixo assinado em anexo dos dois distritos, reivindicando a inclusão nos estudos de impacto ambiental, bem como o direito à audiência pública após a devida conclusão dos estudos. Até o momento, o IBAMA e o consórcio sequer responderam ao pleito da população ribeirinha. O MAB reivindica a inclusão dessas famílias, assim como a população das reservas extrativistas, no Estudo do Componente Tradicional, considerando as especificidades e o modo de vida tradicional das famílias ribeirinhas da região. Texto: Coletivo de Comunicação MAB RO – publicado originalmente no site do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) Foto: Distrito de Demarcação, no baixo rio Machado/ MAB

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“Grande casa do bem comum”: floresta é a principal infraestrutura da Amazônia

 Carta de lideranças reunidas em Alter do Chão defende um desenvolvimento para as pessoas e com o meio ambiente íntegro para a construção de um novo Brasil a partir de 2023 Sérgio Guimarães* A Amazônia é a maior fábrica de vida do planeta e que zerar o desmatamento é fundamental para a sobrevivência de suas sociedades humanas. Essa é a percepção de povos indígenas que habitam a Amazônia há milhares de anos e que vem sendo confirmada pela ciência moderna. O que está acontecendo, no entanto, é o contrário. No ano passado, pela primeira vez desde o início das medições do INPE, em 1988, a Amazônia teve o quarto ano seguido de aumento na devastação. Somente no mês de junho deste ano, a área derrubada chegou a 1.120 km², um recorde histórico. Os dados mostram que essa é a terceira alta consecutiva sob Bolsonaro, evidenciando um projeto de governo que incentiva a ilegalidade na maior floresta tropical do mundo, ignorando alertas de cientistas, povos indígenas e comunidades tradicionais, que sabem melhor do que ninguém como preservá-la. Os conhecimentos desses guardiões da floresta precisam ser valorizados e o primeiro passo é ouvir os que eles têm a dizer. Nesse sentido, na primeira semana de julho, organizações vinculadas ao GT Infraestrutura e redes aliadas estiveram reunidas com movimentos sociais, em Alter do Chão, no Pará, buscando respostas e delineando ações concretas frente a velhos e novos desafios da região. A infraestrutura, uma das áreas que mais impulsionou o desmatamento e conflitos socioambientais nas últimas décadas, esteve no centro do debate, que deixou claro que a floresta é a principal infraestrutura da Amazônia.  Construímos conjuntamente a Carta de Alter, um documento com propostas para a Amazônia que visa contribuir com os debates do processo eleitoral, bem como com o planejamento e a implementação de políticas públicas a partir de 2023. Nossas propostas têm como base, além da contribuição direta de diversas organizações e movimentos sociais da região presentes, um novo estudo, conduzido pelo professor Ricardo Abramovay da USP, lançado durante o evento. O trabalho, que contou com uma escuta a lideranças da região, é uma reflexão sobre as infraestruturas necessárias à melhoria da qualidade de vida das pessoas e de suas atividades produtivas vinculadas a uma economia sustentável na região. Numa visão contemporânea, o professor apresenta novas dimensões essenciais para repensar o assunto: o cuidado com a natureza, com as pessoas, uma nova economia e a valorização da organização social da região. Em lugar das grandes obras, que contribuem para a destruição da floresta e costumam deixar deixar transtornos para os povos que vivem na região, sem deixar  benefícios, é urgente desenvolver outros projetos. Baseados em uma infraestrutura que considere, prioritariamente, o respeito e a promoção de arranjos socioprodutivos capazes de conviver com a floresta e garantir a quem vive nela o acesso a direitos básicos como saúde, educação, energia e saneamento. O conjunto de propostas começa deixando claro que é preciso retomar as ações de comando e controle, acabando com a cultura onde o “ilegal” é “legal” e garantir a proteção de quem luta para defender a floresta (há centenas de pessoas ameacadas de morte na região). As recentes mortes do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips estão longe de serem casos isolados e fazem parte de uma política de silenciamento de lideranças sociais.  Esse é um momento especial, onde a sociedade brasileira, através do processo eleitoral, está debatendo propostas que possam mudar a realidade dramática que vive a população da região, que hoje convive com a violência, a devastação ambiental e os piores índices sociais do Brasil. A carta  traz propostas nas áreas de energia, cidades e transporte, passando também por temas, como o garimpo, uma das atividades mais destruidoras da atualidade, que precisa ser substituída em benefício de outras cadeias produtivas, capazes de conviver com a floresta. A natureza é a extensão do nosso viver, afirmaram os povos tradicionais e comunidades presentes. Só vivenciando esse vital ensinamento, teremos condições de avançar na construção de políticas e projetos que promovam uma agenda de desenvolvimento sustentável, justo e participativo. *secretário executivo do GT Infraestrutura e Justiça Socioambiental, rede focada no estudo e debate da infraestrutura com justiça socioambiental em busca de uma economia da sociobiodiversidade na região amazônica. Este artigo foi publicado, originalmente, no Um Só Planeta. Foto: deposiphotos

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CARTA DE ALTER: propuestas de infraestructura para la Amazonía

“Estamos en contra de los proyectos que nos matan, matan nuestros ríos y nuestra selva. Estos grandes proyectos no son infraestructura para nosotros, necesitamos pequeños proyectos que nos fortalezcan (…) La principal infraestructura en la Amazonía es el bosque en pie”. Maura Arapiun, secretaria del Consejo Indígena de Tapajós Arapiuns Las organizaciones vinculadas al Grupo de Trabajo de Infraestructura y redes aliadas se reunieron en Alter do Chão (Pará) del 4 al 6 de julio de 2022, con importante participación de organizaciones y movimientos sociales de la región, escuchando informes, buscando respuestas y proponiendo estrategias y acciones concretas enfrentando viejos y nuevos desafíos en la región. En consecuencia, hemos elaborado este documento dirigido a la sociedad brasileña con miras a contribuir a los debates del proceso electoral, así como a la construcción e implementación de políticas públicas a partir de 2023. En las últimas décadas, entre los principales impulsores de la deforestación y de los conflictos socioambientales en la Amazonía brasileña, están previstas obras de infraestructura para apoyar el modelo de explotación depredadora en la región, como centrales hidroeléctricas, puertos y estaciones de transbordo de granos, hidrovías, vías férreas y carreteras La situación empeoró bajo el gobierno de Bolsonaro, que promovió una serie de retrocesos en los derechos de los pueblos indígenas y comunidades tradicionales, desde el incentivo al acaparamiento de tierras públicas y áreas protegidas, que se sumó al desguace de los poderes públicos que actúan en el territorio amazónico. . Muertes brutales, como las del indigenista Bruno Pereira y el periodista Dom Phillips, lejos de ser un caso aislado, forman parte de una política de silenciamiento de líderes sociales sometidos a profundas violaciones a los más elementales derechos humanos. Brasil puede ayudar al planeta a mitigar los efectos de la crisis climática. En cuanto a infraestructura, para eso necesitamos infraestructura para la Amazonía y no solo en la Amazonía. Debemos considerar fundamentalmente el respeto y la promoción de arreglos socioproductivos capaces de convivir con el bosque y garantizar el acceso a derechos básicos como la salud, la educación, la energía y el saneamiento. El GT Infraestructura tiene claro que la selva es la principal infraestructura de la Amazonía . En su obra más reciente, dirigida por Ricardo Abramovay, propone cuatro dimensiones necesarias para repensar el sujeto: naturaleza, cuidado, servicios y organización colectiva. Es sobre esta base que presentamos propuestas de acciones concretas para cuidar el medio ambiente y las personas, impulsando una agenda de desarrollo justo, participativo e incluyente de esta fuente de conocimiento de la cual sus pueblos y comunidades tradicionales son guardianes. Nuestras propuestas: Retomar las acciones de mando y control en la Amazonía, acabando con esta cultura donde lo “ilegal” es “legal”. Reestructurar urgentemente las instituciones públicas encargadas de combatir la economía de destrucción, que consume ríos y bosques, viola los derechos humanos y profundiza la desigualdad social Asegurar la aplicación de políticas de protección forestal y defensores de derechos humanos, mitigando riesgos, para que estos pueblos puedan continuar su lucha junto a los pueblos indígenas, quilombolas, extractivistas y ribereños. Fortalecer la campaña Vida Por Um Fio: Autoprotección de Comunidades y Líderes Amenazados y también la red de protección, a nivel nacional y en cada estado. Discutir un nuevo modelo logístico para la Amazonía, repensando prioridades e institucionalizando el proceso de toma de decisiones, resultando en buenas prácticas de planificación, incluyendo la evaluación de alternativas, amplia participación de la sociedad en todas las etapas y atendiendo las demandas de promoción de los productos de la sociobiodiversidad. Revisar de manera transparente los proyectos de infraestructura logística de transporte de carga actualmente previstos en el Programa de Asociación de Inversión (PPI). Fortalecer las políticas públicas de planificación y licenciamiento ambiental de obras de infraestructura, con el objetivo de permitir mejores opciones que maximicen los beneficios para la sociedad y que eviten la repetición de desastres y violaciones de derechos. Involucrar a los beneficiarios de Amazon en el desarrollo de modelos de energía distribuida para una transición energética justa e inclusiva, asegurando energía limpia y de calidad para todos y anticipándose a las metas de universalización del gobierno federal y brindando condiciones energéticas para el desarrollo local sustentable. Adoptar políticas efectivas para incentivar el incremento de la mini y micro generación distribuida en la Amazonía, como aporte a la matriz eléctrica nacional y a una transición energética verdaderamente justa y popular. Exigir una moratoria a los nuevos grandes proyectos energéticos en la Amazonía hasta que se revise el Plan Nacional de Energía a la luz de los compromisos climáticos del país. Considerar el desarrollo urbano como un proceso fundamental para la sostenibilidad y el bienestar humano en la Amazonía, con infraestructura adecuada al contexto local. Las ciudades y los asentamientos humanos deben ser protagonistas en la implementación de medidas de conservación socioambiental, promoción de la diversidad sociocultural y mitigación y adaptación al cambio climático. Adoptar medidas para proteger los ríos, elementos vitales para el mantenimiento de la vida y la diversidad en el medio ambiente amazónico. Apoyar el seguimiento de las acciones relacionadas con el estrés antrópico impuesto a los ríos, así como aquellas que apoyen el mantenimiento de los recursos hídricos y la integridad de los sistemas fluviales. Respetar el derecho a la consulta y consentimiento libre, previo e informado de los pueblos indígenas y otras poblaciones tradicionales y fortalecer las políticas de gobernanza. Estructurar un plan integral de combate a la minería en tierras indígenas, a fin de hacer cumplir la prohibición constitucional de esta actividad en estos territorios. Reconocer que la minería no es un vector de desarrollo en la Amazonía y que necesita ser reemplazada en beneficio de otras cadenas productivas, capaces de convivir con el bosque y los ríos, asegurando derechos y reduciendo la desigualdad social. Promover y mejorar el control social en todo el ciclo de la infraestructura, incluyendo una relación más estrecha de las organizaciones de la sociedad civil y representantes de los pueblos con los tribunales de cuentas. Asegurar la transparencia de los procesos de toma de decisiones y

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Letter from Alter: infrastructure proposals for the Amazon

“We are against projects that kill us, kill our rivers and our forest. These big projects are not infrastructure for us, we need small projects that strengthen us (…) The main infrastructure in the Amazon is the standing forest.”  Maura Arapiun, secretary of the Tapajós Arapiuns Indigenous Council The civil society organizations connected to the Infrastructure Working Group (GT Infraestrutura) and allied networks met in Alter do Chão (Pará State) from July 4th to 6th, 2022, with significant participation of organizations and social movements in the region.  Together we listened to reports, sought answers and proposed strategies and concrete actions that face old and new challenges in the region. As a result, we have prepared this document aimed at Brazilian society with a view to contributing to the debates of the electoral process, as well as the construction and implementation of public policies from 2023 onwards. In recent decades, large infrastructure projects – such as the opening and paving of highways, industrial waterways and transhipment port facilities, railways and hydroelectric dams – have been among the main drivers of deforestation and socio-environmental conflicts in the Brazilian Amazon.   The situation worsened under the Bolsonaro government, which promoted a series of setbacks in the rights of indigenous peoples and traditional communities, incentives to land grabbing on public lands and exploitation of protected areas, as well as the scrapping of public institutions.  The brutal deaths of the indigenist Bruno Pereira and journalist Dom Phillips are far from being an isolated case; rather they are part of a policy of silencing social leaders subjected to profound violations of the most basic human rights. Brazil can help the planet to mitigate the effects of the climate crisis. For this, we need infrastructure FOR the Amazon and not just IN the Amazon. We must fundamentally consider the respect and promotion of socio-productive arrangements capable of coexisting with the forest and guaranteeing access to basic rights such as health, education, energy and sanitation. GT Infrastructure is clear that the forest is the main infrastructure of the Amazon . In our most recent publication, led by Ricardo Abramovay, it is proposed that four dimensions are necessary to rethink the subject of infrastructure: nature, care, services and collective organization. It is on this basis that we present proposals for concrete actions to care for the environment and people, promoting an agenda of fair, participatory and inclusive development, based on watersheds of knowledge of which traditional peoples and communities are guardians. Our proposals: Resume command and control actions in the Amazon, ending a culture where what is “illegal” becomes “legal”. Urgently restructure public institutions responsible for combating the economy of destruction, which consumes rivers and forests, violates human rights and deepens social inequality. Ensure the application of policies to protect forest and human rights defenders, mitigating risks, so that these people can continue their struggles together with indigenous peoples, quilombolas, extractivists and riverine people. Strengthen the Vida Por Um Fio: Self-protection of Threatened Communities and Leaders campaign and also the protection network, nationally and in each state. Discuss a new transportation logistics model for the Amazon, rethinking priorities and institutionalizing a decision-making process that results in good planning practices, including the evaluation of alternatives, broad participation of society at all stages and meeting the demands of promoting the supply chains of products based on social and biological diversity. Revise, in a transparent manner, the freight transport logistics infrastructure projects currently included in the public-private Investment Partnership Program (PPI). Strengthen public policies for planning and environmental licensing of infrastructure projects, with the objective of allowing better choices that maximize benefits for society and that avoid the repetition of disasters and violations of rights. Involve Amazon beneficiaries in the development of distributed energy models for a fair and inclusive energy transition, ensuring clean, quality energy for all and anticipating the federal government’s universalization goals, providing energy conditions for local sustainable development. Adopt effective policies to encourage the increase of distributed mini and micro generation in the Amazon region, as a contribution to the national electricity matrix and as a basis for a truly fair and popular energy transition. Demand a moratorium on new large energy projects in the Amazon until the National Energy Plan is reviewed in light of the country’s climate commitments. Consider urban development as a fundamental process for sustainability and human well-being in the Amazon, with infrastructure appropriate to local contexts. Cities and human settlements must be protagonists in the implementation of socio-environmental conservation measures, promotion of sociocultural diversity and mitigation and adaptation to climate change. Adopt measures to protect rivers, vital elements for the maintenance of life and diversity in the Amazon environment. Support the monitoring of actions related to anthropogenic stress imposed on rivers, as well as those that support the maintenance of water resources and the integrity of river systems. Respect the right of indigenous peoples and other traditional populations to  free, prior and informed consultation and consent, strengthening governance policies. Structure an integrated plan to combat mining in indigenous lands, in order to enforce the constitutional prohibition of this activity in these territories. Recognize that mining is not a vector of development in the Amazon and that it needs to be substituted in favor of other economic activities, capable of coexisting with the forest and rivers, ensuring rights and reducing social inequality. Promote and improve social control throughout the entire cycle of planning and licensing infrastructure, including a closer relationship between civil society organizations and representatives of peoples with tribunals that monitor public accounting. Ensure the transparency of decision-making processes and access to comprehensive, accessible and real-time information on specific policies, plans and projects, promoting integrity and the fight against corruption in entities, public bodies and companies in the infrastructure sector. Ensure accountability of financial institutions and companies so that they have the obligation to assume commitments and robust mechanisms regarding human rights, environmental protection and the construction of a sustainable economy. Encourage economic activities that prioritize people and the maintenance of the

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“A principal infraestrutura da Amazônia é a floresta em pé”

A Carta de Alter, documento final do maior encontro de organizações ambientais, associações locais e institutos de pesquisa da Amazônia, defende um desenvolvimento para as pessoas e com o meio ambiente  Após três dias de debates em Alter do Chão (PA), organizações socioambientais, pesquisadores e cientistas atuantes em todo o país, lideradas pelo GT Infraestrutura, lançaram um documento com recomendações para a participação da sociedade no debate eleitoral deste ano. A Carta de Alter traz propostas de infraestrutura que o grupo considera prioritárias para a construção de um novo Brasil e de uma Amazônia que cuide da floresta, das suas cadeias de valor e das pessoas que nela vivem a partir de 2023. O encontro reuniu e articulou movimentos locais, lideranças indígenas e ribeirinhas, movimentos dos atingidos por barragens, organização da sociedade, academia e jornalistas para conversar sobre os caminhos para a construção coletiva de uma economia sustentável na região. O agravamento do processo de devastação da Amazônia e as ameaças e assassinatos de lideranças e de defensores foram alguns dos motivadores da iniciativa. “Somos contra projetos que nos matam, matam nossos rios e nossa floresta. Esses grandes projetos não são infraestrutura para nós, precisamos de pequenos projetos, que nos fortaleçam (…) A principal infraestrutura da Amazônia é a floresta em pé”, afirma Maura Arapiun, secretária do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns. “Queremos buscar respostas e articular ações e soluções frente aos velhos e novos desafios da região, agravados por um governo que apoia ilegalidades e atividades desestruturadoras da floresta e de suas comunidades”, completa Sérgio Guimarães, secretário executivo do GT Infra.  “O Brasil pode ajudar o planeta a mitigar os efeitos da crise climática. No quesito infraestrutura, para tanto precisamos de infraestrutura PARA a Amazônia e não apenas NA Amazônia. Devemos considerar fundamentalmente o respeito e a promoção de arranjos socioprodutivos capazes de conviver com a floresta e garantir o acesso a direitos básicos como saúde, educação, energia e saneamento”, diz trecho da carta. Foto: Projeto Saúde e Alegria Texto: Angélica Queiroz

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CARTA DE ALTER: propostas de infraestrutura para a Amazônia

“Somos contra projetos que nos matam, matam nossos rios e nossa floresta. Esses grandes projetos não são infraestrutura para nós, precisamos de pequenos projetos, que nos fortaleçam (…) A principal infraestrutura da Amazônia é a floresta em pé.”  Maura Arapiun, secretária do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns As organizações vinculadas ao GT Infraestrutura e redes aliadas reuniram-se em Alter do Chão, PA, de 4 a 6 de julho de 2022, com participação significativa de organizações e movimentos sociais da região, ouvindo relatos, buscando respostas e propondo estratégias e ações concretas frente a velhos e novos desafios da região. Como resultado, preparamos este documento dirigido à sociedade brasileira com vistas a contribuir com os debates do processo eleitoral, bem como com a construção e a implementação de políticas públicas a partir de 2023.    Nas últimas décadas, entre os principais vetores de desmatamento e conflitos socioambientais na Amazônia brasileira, estão obras de infraestrutura planejadas para sustentar o modelo de exploração predatória da região, tais como hidroelétricas, portos e estações de transbordo de grãos, hidrovias, ferrovias e rodovias. A situação se agravou no governo Bolsonaro, que promoveu uma série de retrocessos nos direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais, a partir do incentivo à grilagem de terras públicas e áreas protegidas, que se somam ao sucateamento das autarquias públicas que atuam no território amazônico. Mortes brutais, como as do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips estão longe de ser um caso isolado, e fazem parte de uma política de silenciamento de lideranças sociais submetidas a violações profundas dos mais básicos direitos humanos. O Brasil pode ajudar o planeta a mitigar os efeitos da crise climática. No quesito infraestrutura, para tanto precisamos de infraestrutura PARA a Amazônia e não apenas NA Amazônia. Devemos considerar fundamentalmente o respeito e a promoção de arranjos socioprodutivos capazes de conviver com a floresta e garantir o acesso a direitos básicos como saúde, educação, energia e saneamento. O GT Infraestrutura tem clareza de que a floresta é a principal infraestrutura da Amazônia. Em seu mais recente trabalho, conduzido por Ricardo Abramovay, propõe quatro dimensões necessárias para repensar o assunto: natureza, cuidado, serviços e organização coletiva. É com essa base que apresentamos propostas de ações concretas para cuidar do ambiente e das pessoas, movimentando uma agenda de desenvolvimento justo, participativo e inclusivo desse manancial de saberes dos quais são guardiões seus povos e comunidades tradicionais. Nossas propostas: Retomar as ações de comando e controle na Amazônia e em outros biomas, como o Cerrado, acabando com essa cultura onde o “ilegal” é “legal”. Reestruturar urgentemente as instituições públicas responsáveis pelo combate à economia da destruição, que consome rios e florestas, viola direitos humanos e aprofunda a desigualdade social.  Garantir a aplicação de políticas de proteção dos defensores da floresta e dos Direitos Humanos, mitigando riscos, para que essas pessoas possam seguir suas lutas junto com os povos indígenas, quilombolas, extrativistas e ribeirinhos. Fortalecer a campanha Vida Por Um Fio: Autoproteção das Comunidades e Lideranças Ameaçadas e também a rede de proteção, nacional e em cada estado. Discutir um modelo novo de logística para a Amazônia, repensando prioridades e institucionalizando o processo decisório, resultando em boas práticas de planejamento, incluindo a avaliação de alternativas, ampla participação da sociedade em todas as etapas e o atendimento às demandas de promoção dos produtos da sociobiodiversidade. Revisar de forma transparente, os projetos de infraestrutura de logística de transportes de cargas atualmente previstos no Programa de Parceria de Investimentos (PPI). Fortalecer políticas públicas de planejamento e licenciamento ambiental de obras de infraestrutura, com o objetivo de permitir melhores escolhas que maximizem benefícios para a sociedade e que evitem a repetição de desastres e as violações de direitos.   Envolver os beneficiários das comunidades no desenvolvimento de modelos energéticos distribuídos para a transição energética justa e inclusiva, garantindo energia limpa e de qualidade para todos e antecipando as metas de universalização do governo federal e dando condições energéticas para o desenvolvimento sustentável local. Adotar políticas efetivas de incentivo para o aumento da mini e micro geração distribuída na região amazônica, como contribuição à matriz elétrica nacional e a uma transição energética verdadeiramente justa e popular. Reivindicar um processo de moratória para novos grandes empreendimentos energéticos na Amazônia enquanto não houver a revisão do Plano Nacional de Energia à luz dos compromissos climáticos do país.  Considerar o desenvolvimento urbano como processo fundamental para a sustentabilidade e bem estar humano na Amazônia, com infraestruturas adequadas ao contexto local. Cidades e assentamentos humanos devem ser protagonistas na implementação de medidas de conservação socioambiental, de promoção da diversidade sociocultural e de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Adotar medidas para proteger os rios, elementos vitais para a manutenção da vida e da diversidade no ambiente amazônico. Apoiar o monitoramento de ações relacionadas ao estresse antropogênico imposto aos rios, bem como aquelas de suporte à manutenção dos recursos hídricos e da integridade dos sistemas fluviais. Respeitar o direito de consulta e consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas e outras populações tradicionais e fortalecer políticas de governança  Estruturar um plano integrado de combate ao garimpo em terras indígenas, a fim de fazer cumprir a vedação constitucional desta atividade nestes territórios. Reconhecer que o garimpo não é um vetor de desenvolvimento da Amazônia e que precisa ser substituído em benefício de outras cadeias produtivas, capazes de conviver com a floresta e os rios, assegurar direitos e reduzir a desigualdade social. Promover e aprimorar o controle social, em todo o ciclo da infraestrutura, incluindo uma maior aproximação das organizações da sociedade civil e representantes de povos com os tribunais de contas.  Garantir a transparência dos processos decisórios e o acesso à informação de forma integral, acessível e em tempo real sobre políticas, planos e projetos específicos, promovendo a integridade e o combate à corrupção nas entidades, órgãos públicos e empresas do setor de infraestrutura. Responsabilizar instituições financeiras e empresas para que tenham a obrigação de assumir compromissos e mecanismos robustos a respeito dos direitos humanos, da proteção ambiental e da construção de uma

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As quatro dimensões para planejar a infraestrutura na Amazônia

“Infraestrutura para o desenvolvimento sustentável da Amazônia”, novo livro de Ricardo Abramovay, da USP, oferece uma abordagem para investimentos bons para as pessoas e para o meio ambiente da região. Será lançado nesta quarta-feira (6/7), em Alter do Chão (PA) O Brasil tem condições de sair na frente na busca por soluções que ajudem o planeta a mitigar os efeitos da crise climática. Apesar disso, está se tornando um pária internacional no quesito proteção da natureza. Em resposta ao paradoxo, o professor Ricardo Abramovay, lança um novo trabalho durante o Encontro do GT Infraestrutura, em Alter do Chão (PA), nesta quarta-feira (6/7). No livro “Infraestrutura para o desenvolvimento sustentável da Amazônia” (Elefante), o pesquisador desenvolve um novo modelo para promover, de fato, o desenvolvimento sustentável na Amazônia, virando referência para o mundo. O novo trabalho responde a uma solicitação elaborada pelo GT Infraestrutura, uma rede com mais de 40 organizações socioambientais, em torno da pergunta: quais as infraestruturas necessárias à melhoria da qualidade de vida das pessoas, na Amazônia, e a suas atividades produtivas vinculadas ao uso sustentável da biodiversidade? Numa visão contemporânea, Ricardo Abramovay apresenta ao leitor quatro dimensões necessárias para repensar o assunto: natureza, cuidado, serviços e organização coletiva. Essa organização nos ajuda a pensar a infraestrutura tirando o foco dos megaprojetos, transferindo o olhar para essas quatro dimensões, que resultam num cuidado maior com as pessoas, tanto no campo quanto nas cidades. Só na parte brasileira da Amazônia, vivem mais de 29,6 milhões de pessoas. Abramovay sugere que, as políticas públicas para a região, precisam, antes de mais nada, focar nelas, numa economia do cuidado. Suas provocações apontam alternativas para enfrentar um dos mais importantes desafios contemporâneos: como melhorar as condições de vida e reduzir as desigualdades, não apenas evitando a destruição, mas fazendo uso e regenerando a riqueza natural da qual a própria vida na Terra depende? “Mas tão importante quanto as iniciativas voltadas a preencher as necessidades em infraestrutura das populações da Amazônia e de suas atividades econômicas (sobretudo as ligadas ao uso sustentável da biodiversidade) é a reflexão sobre o próprio sentido destas infraestruturas e os valores aos quais elas devem obedecer. E na discussão brasileira, latino-americana e global sobre Amazônia é fundamental redefinir o que se entende por infraestrutura do desenvolvimento sustentável”, afirma o autor no sumário executivo do livro. Para Abramovay, a floresta “é a mais importante e promissora infraestrutura para o desenvolvimento sustentável” e precisa ser olhada como tal. O trabalho, que organiza a reflexão em torno de infraestruturas voltadas às pessoas e ao desenvolvimento sustentável, termina com um conjunto de propostas, das quais a primeira é a criação de um Observatório das Infraestruturas voltadas ao uso sustentável da biodiversidade na Amazônia. O novo livro pode ser adquirido no site da editora Elefante e em livrarias do país. Em 2 de agosto, haverá outro lançamento com a presença do autor, em São Paulo. Infraestrutura no centro do debate Os caminhos da infraestrutura brasileira, principalmente os que dizem respeito às regiões brasileiras mais afetadas pelos grandes empreendimentos, como a Amazônia, são o tema central de um evento que reúne, entre os dias 4 e 6 de julho em Alter do Chão (PA), movimentos representativos locais, lideranças indígenas e ribeirinhas, movimentos dos atingidos por barragens, organização da sociedade, academia e jornalistas. A proposta do encontro é a de promover a articulação das organizações e movimentos sociais na defesa do território e a construção de propostas para uma economia sustentável na Amazônia, cuidando da floresta, das suas cadeias de valor e das pessoas que nela vivem. Sobre o autor Ricardo Abramovay é Professor Sênior do Programa de Ciência Ambiental do IEE/USP. Autor de “Amazônia: Por uma Economia do Conhecimento da Natureza”, também da editora Elefante. Foto: Rodrigo Vargas/ ICV

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Em ano eleitoral, pesquisadores apresentam 12 recomendações para o futuro da infraestrutura terrestre na Amazônia

Novo levantamento do Climate Policy Initiative/PUC-Rio aponta propostas de ação para desassociar projetos de desmatamento Infraestrutura em quantidade e de qualidade reduz os custos de produção e provisão de  serviços básicos à população, gerando crescimento econômico e qualidade de vida. No entanto, no Brasil, a infraestrutura de transporte terrestre é um dos indutores do desmatamento na Amazônia — até 2006, aproximadamente 95% ocorreu em uma  distância de 5,5 km das estradas. Visando recuperar a economia, num cenário pós-Covid, o governo federal tem investido em portfólio de empreendimentos de infraestrutura na região. Mas, para que eles contribuam, de fato, para o desenvolvimento do país e da Amazônia, precisamos desassociar desmatamento e infraestrutura terrestre. Um novo estudo do Climate Policy Initiative/Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (CPI/PUC-Rio) apresenta propostas concretas para apoiar a tomada de decisão a esse respeito. Lançado nesta segunda-feira (04/07) durante o painel “Infraestrutura para uma economia da sustentabilidade na Amazônia”, que contou com a presença do pesquisador da Universidade de São Paulo, Ricardo Abramovay, no encontro da rede GT Infraestrutura em Alter do Chão (PA), o trabalho faz doze recomendações capazes de ter um impacto positivo relevante na condução do processo decisório, na redução de riscos de execução dos projetos e na qualidade da infraestrutura terrestre, especialmente na Amazônia. Somente no estado do Pará, estão previstos três grandes investimentos federais do gênero – Ferrogrão, BR-155/158 e BR-163/230/MT/PA –, com o  potencial de desmatar 6.989 km² em 30 anos.  Apresentadas sob a forma de uma agenda propositiva para o futuro da infraestrutura terrestre na Amazônia, a agenda é baseada em três pilares: I) o processo de tomada de decisão da Administração Pública visando à antecipação da análise socioambiental; II) a qualidade dos estudos socioambientais; III) e a transparência. Para cada pilar, esta agenda propõe ações concretas e indica os entes governamentais responsáveis por impulsionar aprimoramentos. Entre elas, a de incluir componentes socioambientais em qualquer planejamento, de curto, médio e longo prazo, do setor. Outras recomendações apontadas pelos pesquisadores dizem respeito à necessidade de implementação de base de dados e códigos única e pública sobre projetos de infraestrutura, bem como a construção e manutenção frequente de um Sistema de Informações Geográficas (SIG) com a localização e a condição dos empreendimentos de infraestrutura e das Unidades de Conservação, Terras Indígenas, comunidades quilombolas e tradicionais, assentamentos, áreas privadas e terras públicas não designadas. “Neste ano eleitoral, são necessários debates qualificados para se pensar em uma estratégia de desenvolvimento para o país e a infraestrutura é um poderoso instrumento para alcançar os objetivos nacionais. Em nosso estudo, apesar de se aplicarem para projetos de infraestrutura terrestre implementados em todo o país, as recomendações são particularmente relevantes para o desenvolvimento da infraestrutura terrestre na Amazônia porque os impactos socioambientais dos projetos ali localizados são tipicamente maiores do que no resto do país”, explica Joana Chiavari, diretora associada de Direito e Governança do CPI/PUC-Rio e coordenadora do estudo. Para acessar o estudo completo, clique aqui. Sobre o CPI O CPI possui parceria com a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) por meio do Núcleo de Avaliação de Políticas Climáticas (NAPC). Atua dando apoio à formulação de políticas públicas no Brasil através de rigorosa análise e pesquisa baseada em evidência, parcerias estratégicas com membros do governo e da sociedade civil, por meio de uma abordagem construtiva e colaboração direta com tomadores de decisão. Contando com um longo histórico acerca de políticas de conservação e uso da terra, o CPI Brasil conduziu significativas pesquisas e avaliações de políticas de desmatamento e conservação da terra na Amazônia, tornando-se referência acadêmica na área. O CPI utiliza seu conhecimento institucional junto com seu entendimento sobre políticas de conservação e rigorosa análise econômica e legal. Foto: Rodrigo Vargas – ICV    

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Indígenas denunciam que foram excluídos de estudos sobre a usina Tabajara

Os povos Arara, Gavião e Jiahui, junto com grupos de indígenas em isolamento voluntário, foram ignorados no Estudo de Componente Indígena (ECI) da Usina Hidrelétrica Tabajara, que deve alagar uma área de pelo menos 100 quilômetros quadrados em Rondônia, na divisa com o Amazonas, e barrar o rio Ji-Paraná. Ainda assim, o Ibama autorizou a realização de duas audiências públicas no início de abril deste ano, na cidade de Machadinho do Oeste, em Rondônia. A reportagem é de Alicia Lobato, publicada por Amazônia Real, 02-06-2022. O ECI é um dos estudos obrigatórios que integram as etapas do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) do licenciamento de todo empreendimento que causa impactos em terras indígenas. Ele garante que os povos indígenas sejam ouvidos e consultados sobre a obra. O líder indígena Josias Cebirop Gavião, da Aldeia Ikolen, localizada na Terra Indígena Igarapé Lourdes, em Rondônia, afirmou à Amazônia Real que desde o início do projeto a comunidade foi contra o empreendimento. O povo Gavião tem seu território demarcado e conta com cerca de 800 pessoas. Segundo ele, apesar do território não estar na área de influência direta da usina, determinada como “área de impacto”, o povo Arara considera necessário ser ouvido e consultado, ou seja, incluído no Estudo de Componente Indígena. Conforme Josias, o território está distante de 200 a 300 km do ponto da obra e será afetado indiretamente, com impactos em cursos d´água e fontes de alimento. “Uma parte da terra indígena nós sabemos que vai afetar. Acreditamos que, de uma certa forma, pode afetar os igarapés e os rios que passam pela terra indígena, assim como a caça”, diz. O Estudo de Componente Indígena do empreendimento abrangeu apenas a Terra Indígena Tenharim/Marmelos, localizada no município de Humaitá, no sul do Amazonas. Ainda assim, segundo o líder Angelisson Tenharim, os indígenas deste povo estão descontentes com o resultado. Segundo ele, o principal ponto é a maneira duvidosa como o estudo foi feito. Ele solicita a mudança da empresa JPG Consultoria e Participações Ltda, que elaborou o documento. De acordo com Angelissom Tenharim, o ECI está incompleto e precisa ser refeito. Representantes dos Tenharim não participaram das audiências públicas realizadas no início de abril. Angelisson afirma que o assunto está “suspenso”. “Nós não íamos nos fazer presentes na audiência porque temos a organização própria do nosso povo e, quando chegar o momento certo, a partir do momento que a Eletronorte contratar uma outra empresa para fazer o estudo do componente indígena, vamos recebê-los na nossa aldeia para discutirmos sobre o assunto. Fora isso, o assunto da Tabajara com o povo Tenharim está suspenso”. As audiências públicas foram realizadas para apresentação e discussão do Estudo de Impacto Ambiental e do Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) da usina. Elas são fundamentais no processo de licenciamento ambiental e têm o objetivo de apresentar os resultados dos estudos ambientais, elucidar dúvidas e ouvir críticas e sugestões das pessoas presentes. Elton Jiahui, coordenador da Associação do Povo Indígena Jiahui da TI Jiahui, conta que em nenhum momento seu povo foi consultado sobre a obra, apesar de estarem localizados próximos da TI Tenharim/Marmelos. Ele afirma também que recentemente os Jiahui foram a Brasília buscar apoio em uma ação contra o projeto da usina. O povo Jiahui tem seu território localizado no sul do Amazonas, no município de Humaitá, com uma população reduzida de 90 pessoas, distribuídas em 23 famílias. “Nós não fomos consultados até agora se vamos ser atingidos ou não, mas moramos aqui, sabemos que vamos ser atingidos. Estávamos em Brasília falando sobre a usina, mas aqui mesmo na aldeia nós não fomos procurados”. Elton Jiahui enfatiza que, apesar da comunidade ter certeza dos impactos que irá sofrer com a obra, no estudo é afirmado que eles não serão afetados. Em relação a povos indígenas isolados, no ECI emitido em junho de 2020 há um trecho relatando que os Tenharim foram explícitos sobre os parentes sem contato. O documento afirma que em vários momentos os Tenharim comentaram sobre vestígios e encontros com grupos indígenas em situação de isolamento. Em outro trecho, é compartilhado que os Tenharim explicaram que os indígenas isolados são pessoas da própria comunidade que migraram para áreas distantes das aldeias, ocupando outros espaços da floresta. Apesar disso, a conclusão do estudo diz o seguinte: “Sugere que ainda não havia, até o momento de realização deste ECI, a mobilização institucional que comprovasse a existência dos grupos isolados. Nem a FUNAI, nem as ONGs, nem as próprias instituições da chefia Tenharim foram capazes de confirmar a presença ou não destes grupos”. No segundo volume do ECI da Terra Indígena Tenharim/Marmelos também consta que os indígenas deste povo são contrários ao empreendimento e apenas aceitaram receber a equipe técnica da obra. “É importante ressaltar que os Tenharim não estão de acordo com a construção do empreendimento, posição esta que é defendida, ainda que tenham aceitado receber a equipe técnica para a realização deste ECI e discutir os impactos e as medidas de mitigação e/ou compensação cabíveis”, diz o documento. O posicionamento é baseado no conhecimento dos indígenas de experiências vividas por outros grupos, como no caso da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, que provocou interferências importantes nos traços culturais, modo de vida e uso das terras pelos povos indígenas impactados pelo empreendimento. Os Tenharim têm certeza que a construção e operação da usina Tabajara causarão impactos negativos no seu modo de vida. Além disso, segundo o Comin (Conselho de Missão entre Povos Indígenas), estudos iniciais sobre os impactos ambientais do empreendimento apontaram que ao menos dez terras indígenas seriam impactadas. No entanto, as portarias ministeriais 419/211 e 60/2015 restringiram os impactos em terras indígenas até 40 km do reservatório hidrelétrico, o que fez a Funai limitar a área a ser estudada à TI Tenharim/Marmelos. Para o Comin, isso foi feito sem levar em conta critérios técnicos. Audiências em abril Realizadas no mês de abril, as duas audiências públicas na cidade de Machadinho do Oeste, em Rondônia, foram duramente criticadas por organizações de povos ribeirinhos e indígenas. No dia 5 do mesmo mês, uma rede de movimentos sociais e aliados divulgou nota pedindo a anulação das audiências. Na nota, as organizações reuniram uma série de denúncias divulgadas em anos anteriores, como a carta do Encontro de Guerreiras e Guerreiros em Defesa dos Povos e do Rio Ji-Paraná (Machado), de 2018, na qual os indígenas citam territórios que serão impactados pelo empreendimento e que não foram levados em conta nos estudos. “Denunciamos que a Funai apresentou no Termo de Referência da UHE-Tabajara só a TI Tenharim/Marmelos como a

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Direitos humanos e defensoras do meio ambiente são tema de nova publicação do Fundo Casa

O Fundo Casa Socioambiental, em parceria com a Embaixada da França no Brasil, lança a publicação “Direitos humanos e defesa do ambiente: relações de gênero, cumprimento do Acordo de Escazú e oportunidades para filantropia”. O lançamento será no dia 19 de maio às 15h pelo Zoom. A obra é o resultado dos debates que surgiram no Encontro de Defensoras de Meio Ambiente como Líderes nas Ações pelo Clima, realizado em 2021, organizado pela Embaixada da França no Brasil e pelo Fundo Casa, com a colaboração do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), ONU Mulheres, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), WWF-Brasil, Front Line Defenders. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) também assina esta publicação. Os encontros tiveram como objetivo proporcionar um espaço de acolhimento, com foco especial em mulheres defensoras do meio ambiente, um espaço para o diálogo, a troca de experiência e o fortalecimento das redes já existentes. O evento também trouxe à tona os grandes desafios dessas pessoas, alguns deles em destaque no livro, como no capítulo “Racismo Ambiental e Mulheres Defensoras”, escrito pela autora Elionice Conceição Sacramento. Mulher preta, Elionice é pescadora de profissão, tradição e por decisão política, como gosta de afirmar. Militante da Articulação Nacional das Mulheres Pescadoras e do Movimento de Pescadoras e Pescadores, compõe a coordenação da Associação de Pescadoras/es Artesanais e Quilombolas de Conceição de Salinas. Mestra no Saber Tradicional e em Sustentabilidade junto Povos e Terras Tradicionais pela UnB e doutoranda em Antropologia. Sacramento é autora do Livro ‘Da Diáspora Negra ao Território de Terra e Águas – Ancestralidade e Protagonismo de Mulheres na Comunidade Pesqueira e Quilombola Conceição de Salinas – BA’ e co-autora de outras como ‘Salinas, o mar, a lama e a vida’. Vanessa Purper, Gestora de Programas do Fundo Casa, fala sobre a importância das Rodas de Conversas promovidas junto às mulheres defensoras. “É sempre muito importante ouvir as pessoas, especialmente as mulheres que são a linha de frente de atuação onde as maiores injustiças socioambientais acontecem. Escutar sobre a vivências, as particularidades e detalhes de cada região e de cada desafio que essas mulheres enfrentam é o que nos alimenta de detalhes, dados, informações e registros direto da fonte de quem está vivendo esses desafios e esses perigos, e isso é imprescindível para o nosso trabalho enquanto Fundo para fazer captação de recursos que sejam melhor investidos e melhor canalizadas para esses territórios e para essas comunidades”. A publicação, é escrita a várias mãos, fornece dados, detalhes, experiências e conteúdos que poderão ser levados para espaços estratégicos, visando também facilitar dados importantes aos financiadores para que se sensibilizem e ampliem seus apoios a projetos liderados por mulheres defensoras do meio ambiente. De 2019 a março de 2022, o Programa de Defensores e Defensoras de Meio Ambiente e Justiça Climática do Fundo Casa realizou 214 apoios a lideranças e coletividades em situação de ameaça e violação de direitos, totalizando R$2.838.215,32 doados diretamente para esses defensores e defensoras. Além disso, para Vanessa “a obra também tem um significado para as próprias defensoras, porque é importante que elas se percebam escutadas, documentadas com respeito e com fidelidade ao que elas estão vivendo.” A produção conta ainda com a colaboração de Rubens Harry Born, doutor em saúde pública e ambiental e membro do conselho deliberativo do Fundo Casa, e Rodrigo Montaldi Morales, gestor de programas do Fundo Casa e responsável pelo Programa de Apoio a Defensores e Defensoras. O evento de lançamento da publicação será aberto a todo o público e contará com interpretação simultânea em espanhol. As inscrições estão abertas no link. Fonte: Fundo Casa Socioambiental

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Como construir uma economia capaz de conviver com a floresta

Precisamos conter a economia da destruição e iniciar a devida transição ecológica Danicley de Aguiar* Basta uma passada rápida pelo noticiário para que qualquer um perceba que a Amazônia passa por um momento difícil e está gravemente ameaçada. Mas, mais que falar de todos os problemas, precisamos começar a apontar caminhos de para onde a gente quer ir. Como vamos construir uma economia capaz de conviver com a floresta? A resposta é complexa mas, ao mesmo tempo, simples: substituir esse modelo de desenvolvimento econômico que temos na Amazônia hoje. Um modelo que impõe à Amazônia a condição de província, mineral, energética ou agropecuária. É urgente rompermos com a lógica que há mais de quatro séculos condiciona o desenvolvimento regional a uma matriz extrativista que aprisiona a Amazônia aos interesses externos e condena sua população a conviver com os piores índices sociais do país, subjugando gerações a uma eterna espera pelo desenvolvimento. Entre os muitos desafios postos, um deles tem ganhado notória atenção da mídia recentemente e está intimamente ligado a todos os demais: a mineração. Em franco processo de expansão na Amazônia, a matriz mineral precisa ser superada e substituída por outros vetores econômicos capazes de promover o desenvolvimento de uma matriz econômica fundada no convívio com a floresta, no respeito aos direitos e na superação da pobreza. Não será com o aprofundamento da mineração que libertaremos a Amazônia da lógica que aprisiona ao eterno subdesenvolvimento que alimenta a destruição das florestas e dos muitos modos de vida que sustentam a convivência dos povos e comunidades tradicionais com seus territórios. Na bacia do Tapajós, já é perceptível que está em curso um processo de territorialização de uma matriz mineral que tende a substituir os garimpos por grandes empreendimentos de mineração, em grande medida financiado com capital internacional que transferem as riquezas minerais para fora da região sem entregar o tão esperado desenvolvimento da região. Para além da transferência da riqueza regional, esse processo ignora os milhares de garimpeiros que em pouco tempo devem se tornar a principal força a pressionar as dezenas de terras indígenas e unidades de conservação que contribuem para a manutenção do equilíbrio ecológico da região e do bioma amazônico. A questão energética na região da Amazônia como um todo é outro desafio que precisa ser devidamente entendido e equacionado sob a luz dos interesses regionais e da conservação do bioma; não havendo mais espaço para um modelo energético baseado na geração centralizada, que menospreza a diversificação e produz um conjunto amplo de impactos sobre os recursos naturais e viola direitos e garantias fundamentais da população local. Romper com a economia da destruição que se baseia no monocultivo de soja e na pecuária extensiva também está entre os desafios que demandam nossa atenção máxima, haja vista que a infraestrutura imposta para viabilizar tal economia, segue aprofundando as desigualdades e reproduzindo o subdesenvolvimento que se alimenta da concentração de renda e terra. Se ainda não carecemos de um debate regional para definir os passos para transição ecológica da atual ordem econômica que nos aprisiona nessa espiral de destruição, já passa da hora de exigirmos que o poder público assuma compromissos concretos com a contenção dessa matriz econômica extrativa, e inicie o caminho que rompa com o aprofundamento dessa matriz e de toda infraestrutura que a sustenta. Por último, é chegada a hora da sociedade brasileira exigir um debate nacional capaz de ressignificar o papel da Amazônia para o desenvolvimento nacional e exigir que o processo de construção de soluções para a Amazônia se dê em profundo diálogo com a sociedade regional e rompa com a lógica histórica de pensar a Amazônia de fora para dentro, sem respeito aos saberes e fazeres de quem aqui aprendeu a conviver com a floresta. Do contrário, seguiremos reproduzindo a lógica que nos aprisiona ao eterno subdesenvolvimento, que segue produzindo infraestrutura na e não para a Amazônia e seus povos. *Danicley de Aguiar é coordenador de campanhas no Greenpeace Brasil e membro do GT Infraestrutura, uma rede de mais de 40 organizações unidas para debater modelos sustentáveis de desenvolvimento. Este artigo foi, originalmente, publicado na coluna do O Mundo Que Queremos, no Um Só Planeta. Foto: deposiphotos

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Movimentos sociais e aliados dizem não à Hidrelétrica De Tabajara, mais um mega-projeto destrutivo na Amazônia

NOTA PÚBLICA Os movimentos sociais e organizações aliadas da sociedade civil que assinam esta Nota, em conjunto com pesquisadores da comunidade científica, vêm expressar a sua preocupação com as graves irregularidades que têm caracterizado o licenciamento ambiental da Usina Hidrelétrica (UHE) Tabajara – proposta pela Eletronorte como grande barragem no rio Machado, afluente do Madeira, na fronteira entre os estados de Rondônia e Amazonas. Considerando as graves violações da legislação ambiental e dos direitos de povos indígenas e de outras populações tradicionais ameaçados, na condução de um empreendimento sem viabilidade econômica, social e ambiental, os signatários desta Nota registram o seu firme posicionamento contrário à realização de Audiências Públicas convocadas pelo IBAMA para os dias 06 e 07 de abril de 2022, considerando os motivos abaixo expressos: a) Em carta divulgada no final do Encontro de Guerreiras e Guerreiros em Defesa dos Povos e do Rio Ji-Paraná (Machado), realizado entre os dias 13 a 15 de setembro de 2018, com a presença de lideranças dos Povos Tenharim do sul do Amazonas, Karo Arara, Karipuna, Oro Waram Xijein de Rondônia – com a participação do Instituto Madeira Vivo – IMV, Conselho Indigenista Missionário – CIMI, Conselho de Missão entre Povos Indígenas – COMIN, e Comissão Pastoral da Terra – CPT/Rondônia – convocados pela Associação do Povo Indígena Tenharim Morogitá – APITEM, Organização dos Povos Indígenas do Alto Madeira – OPIAM e Aliança dos Rios Panamazônicos / Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social, os povos indígenas deixam claro que: “Somos contrários à UHE Tabajara porque ameaça a vida de vários povos indígenas em condições de isolamento e risco e nós temos o compromisso de defender a vida destes povos. Além dos dois povos já mencionados no laudo pericial do MPF, ainda existem outros três grupos em condições de isolamento que perambulam fugindo dos invasores no Maici, próximos da TI Jiahui, próximos da T.I. Igarapé Preto e na Reserva Biológica do Jarú”. Em outro trecho do documento destacam a preocupação com a situação de indígenas isolados: “Nossa preocupação aumenta porque na Bacia do Rio Madeira havia vários grupos em condição de isolamento e risco, de conhecimento da própria FUNAI, e só citados por ela posteriormente ao licenciamento da UHE Santo Antônio e Jirau. Não foi constituída nenhuma ação de proteção aos mesmos e ainda extinguiram a Frente Etnoambiental do Madeira, responsável pela localização e proteção desses povos. Por isso, denunciamos que os vestígios dos isolados na Serra Três Irmãos e Jacareúba desapareceram, o que pode significar o genocídio destes grupos em decorrência do forte processo de migração e desconfiguração da floresta por desmatamento e alagação, o que coloca o governo e empresas construtoras na condição de criminosas”. No tocante ao papel da Funai foram enfáticos: “Denunciamos que a FUNAI apresentou no Termo de Referência da UHE Tabajara só a T.I. Tenharim Marmelos como a única Terra Indígena atingida, ignorando as demais do entorno e principalmente os indígenas em condição de isolamento e risco. Esta omissão permitiu que os estudos feitos pela empresa JGP para viabilizar o projeto da UHE Tabajara, fossem incompatíveis com a realidade. Reafirmamos nosso posicionamento de que o Termo de Referência, de qualquer projeto de infraestrutura, deve ser feito junto a todos os povos afetados para evitar os erros cometidos”. No que diz respeito às demais populações tradicionais e unidades de conservação pontuaram: “Denunciamos o governo brasileiro pela omissão e pela violação de territórios ambientais de vital importância para o bioma Amazônia, com a supressão de partes de Unidades de Conservação como da Rebio Jaru e do PARNA Campos Amazônicos. Assim como a total omissão frente às graves ameaças sofridas na reserva do Rio Preto Jacundá que, sequer aparece como território ameaçado, hoje já violado por madeireiros”. b) Em documento datado em 28 de janeiro deste ano, o Comitê de Defesa da Vida Amazônica na Bacia do Rio Madeira – COMVIDA emitiu Nota Pública onde vem: “manifestar nossa indignação frente a decisão monocrática proferida pelo desembargador federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, que, analisando recurso interposto pela AGU, cassou decisão proferida pela 5ª Vara Federal de Rondônia, nos autos de uma Ação Civil Pública movida pelos Ministérios Públicos Federal e do Estado de Rondônia”, que suspendeu em dezembro de 2020 a realização de audiências públicas virtuais sobre a UHE Tabajara, em função de graves riscos à saúde de populações locais no contexto da pandemia, assim como sérios impedimentos logísticos de transporte e de comunicação, além de um conjunto de falhas e lacunas no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) que seria objeto de discussão. Segundo a carta do COMVIDA, a decisão monocrática do desembargador do TRF-1, de reverter essa decisão judicial em primeira instância, “coloca em risco a sobrevivência física e cultural de Povos e Comunidades Tradicionais da bacia do rio Machado e do rio Madeira, dadas as suas conexões hidrográficas”, uma vez que a implantação da UHE Tabajara, ignorando uma série de ilegalidades, “poderá representar o escancarar da porteira na região dos Campos Amazônicos, assim como o extermínio de indígenas em condição de isolamento, a morte da floresta e do próprio rio Machado”. c) No último dia 17 de março, os povos Karo Arara e Ikólóéhj Gavião, por meio de suas representações sociais: a Associação Indígena Karo Paygap, a Associação Indígena Ma’pâyrap Karorap e a Associação Indígena Zavidjaj Djiguhr-ASSlZA, ambas da Terra Indígena Igarapé Lourdes, em documento enviado à Procuradoria da República em Rondônia, recordaram: “que em 2018 o MPF, por meio da Antropóloga Rebeca A.A. de Campos Ferreira realizou diversas perícias técnicas apontando falhas do Estudo de Impacto Ambiental da Usina Hidrelétrica de Tabajara, o que motivou o MPF a fazer uma Recomendação à FUNAI para que incluísse no Termo de Referência as Ter ras Indígenas Tenharim do Rio Sepoti, Tenharim do Igarapé Preto, Pirahã, Ipixuna, Nove de Janeiro, Igarapé Lourdes e TI Djahui. Também, que este Parquet moveu duas ações na Justiça Federal, uma para evitar que a audiência de dezembro de 2020 acontecesse em formato virtual e outra para a inclusão dessas Terras Indígenas no referido

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Movimentos sociais se posicionam contra hidrelétrica em afluente do Rio Madeira

Proposta viola legislação ambiental e direitos dos povos indígenas e de outras populações tradicionais. Organizações pedem que Ibama cancele audiências públicas previstas para os dias 6 e 7 de abril Mais de 40 representantes de movimentos sociais e outras organizações da sociedade civil, em conjunto com pesquisadores científicos, divulgaram uma nota expressando preocupação com as graves irregularidades que têm caracterizado o licenciamento ambiental da Usina Hidrelétrica (UHE) Tabajara – proposta pela Eletronorte como grande barragem no rio Machado, afluente do Madeira, na fronteira entre os estados de Rondônia e Amazonas. A nota pede que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) não realize audiências públicas sobre o assunto, previstas para os dias 6 e 7 de abril de 2022. Segundo o texto, o projeto de mais uma megaobra na Amazônia viola a legislação ambiental, ameaçando os direitos de povos indígenas e de outras populações tradicionais. De acordo com os signatários do documento, o empreendimento não tem viabilidade econômica, social e ambiental e ignora as normativas nacionais e internacionais que exigem a participação das comunidades afetadas no processo de licenciamento ambiental, inclusive o direito à consulta e consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas e outras populações tradicionais. O documento lista vários motivos que endossam o argumento, entre eles o fato de que esse tipo de projeto hidrelétrico negligencia os efeitos sobre a sociobiodiversidade, ou seja, as interconexões entre a diversidade sociocultural e a biodiversidade. “Com a UHE Tabajara, repete-se um cenário de atropelos dos últimos anos em processos de licenciamento de empreendimentos hidrelétricos na Amazônia, como Santo Antônio, Jirau, e Belo Monte, com graves prejuízos a populações atingidas e ao meio ambiente, comprometendo oportunidades na região para um desenvolvimento com justiça social e sustentabilidade ambiental e econômica”, diz o texto. “É absolutamente inaceitável que, no caso da UHE Tabajara, se persista na mesma repetição de erros do passado, com graves consequências socioambientais e o desperdício do dinheiro público”, completa a nota, que você pode conferir, na íntegra, aqui. Foto: Cachoeira Dois de Novembro, lugar cogitado para a barragem Tabajara no Rio Machado/ Artur Moret

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Organizações da sociedade civil cobram transparência, participação e inclusão de comunidades tradicionais no Pacto de Letícia e iniciativas financeiras para sua implementação

– Grupos denunciam que o Pacto de Letícia não contempla soluções que garantam a sustentabilidade da Amazônia, um dos principais ecossistemas dos quais a humanidade depende. – Existe a preocupação de que as medidas propostas no Pacto de Letícia afetem áreas sociais e ambientais altamente sensíveis. Em 2019, os governos do Peru, Colômbia, Brasil, Guiana, Suriname, Equador e Bolívia assinaram o Pacto de Letícia e junto com o apoio de recursos financeiros, tem o objetivo de conter o desmatamento e atividades ilegais. No entanto, observou-se que seu desenho, na prática, o configura como uma ameaça às comunidades tradicionais e povos indígenas da região. Nesse contexto, mais de 70 organizações da sociedade civil da América Latina e de outras regiões se pronunciam sobre o Pacto de Letícia, com o objetivo de enviar suas solicitações aos representantes dos estados e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), e reformular o pacto em direção a uma perspectiva intercultural, com abordagem de direitos humanos, com governança socioambiental, e que integre a bacia amazônica como um ecossistema que passa por uma crise sem precedentes. Em 2020, a Amazônia perdeu cerca de 2,3 milhões de hectares de florestas nos 9 países amazônicos, número superior ao de 2019. Atualmente, o Pacto coloca em risco os esforços de combate ao desmatamento, ao deixar de fora a criação do Pacto os povos indígenas e comunidades tradicionais, não levando em conta a situação que os defensores ambientais e indígenas estão passando. Cada vez mais registra-se um aumento da violência contra estes líderes na bacia amazônica; Brasil, Colômbia e Peru são os países mais perigosos para quem defende a natureza e o território, situação esta que deve ser levada em consideração, se você deseja promover uma Amazônia segura e protegida. Por outro lado, um dos principais parceiros do Pacto é atualmente o BID. Até o momento, propõe-se transferir aos governos amazônicos a soma repassar aos governos amazônicos a quantia de aproximadamente 334 milhões de dólares, por meio de iniciativas como; o Programa Sementes Estratégicas para a Amazônia (US$ 20 milhões), o Fundo Multidoador de Bioeconomia e Florestas da Amazônia (US$ 35 milhões) e o Fundo de Bioeconomia da Amazônia (US$ 279 milhões), este último testado pelo Fundo Verde para o Clima. Nesse sentido, a bioeconomia é atualmente uma tendência de investimento pouco conhecida, e “não está claro quais são os objetivos para combater o desmatamento e a restauração florestal e como lidar com atividades predatórias e mudanças no uso da terra com base na bioeconomia”, explica Claudio de Oliveira, do Grupo de Trabalho de Infraestrutura. Com base nessa relação, um comunicado foi lançado no âmbito do evento organizado pelas organizações da sociedade civil realizado em 30 de março, intitulado “O papel do Banco Interamericano de Desenvolvimento no contexto pós-pandemia: Desafios e oportunidades para uma recuperação mais justa e sustentável “, cujo objetivo é apresentar as observações da sociedade civil sobre as deficiências, lacunas que o BID tem na implementação de seus empréstimos na região; evidenciando assim a falta de espaços de participação da sociedade civil na reunião anual do banco. No evento, Denisse Linares, especialista do programa Amazônia do DAR (Peru), destacou que “o Pacto de Letícia não previa um diálogo intercultural com os povos indígenas. Tampouco aborda em sua narrativa os grandes problemas da Amazônia e as iniciativas que os povos já têm, como seus projetos de vida. Por isso, a declaração publicada hoje por organizações da sociedade civil pede ao BID que financie respeitando os direitos humanos e ambientais”. Nesse sentido, essas iniciativas também implicam um risco, pois estão sendo aprovadas com as mesmas deficiências do Pacto. Portanto, é preciso dizer ao BID que as instituições financeiras são obrigadas a mudar a lógica do mercado de exploração da natureza. Por isso, as comunidades tradicionais, afrodescendentes e outras organizações da sociedade civil da América Latina exigem mudanças dos representantes dos Estados, comos seguintes pedidos: – Processo de diálogo multissetorial para revisão do Pacto e suas estratégias de implementação. – Tornar o planejamento do Pacto transparente em nível nacional. – Inclusão de instrumentos, estratégias para garantir o reconhecimento e regularização dos direitos territoriais dos povos indígenas e demais comunidades tradicionais. – Inclusão das iniciativas dos povos indígenas para a proteção da Amazônia. – Proteção dos defensores ambientais e indígenas, sendo o Acordo de Escazú um elemento chave para o desenvolvimento do Pacto. – Incorporação de uma visão inclusiva da bioeconomia. – Construir uma estratégia clara e inovadora sobre infraestrutura sustentável e inclusiva. Finalmente, é necessário desenvolver o debate sobre o Pacto e as iniciativas do BID em nível regional com os representantes dos estados, para que sejam propostas soluções integrais e respeitem os direitos de todos. Veja o pronunciamento: Espanhol / Português / Inglês Imagem: depositphotos

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A Amazônia que queremos e precisamos

Pacto de Letícia pretende ser instrumento para que países amazônicos colaborem mutuamente, mas não responde a várias perguntas fundamentais Por Claudio de Oliveira* A Amazônia não é brasileira. Nem colombiana, nem peruana, nem equatoriana… a Amazônia atravessa fronteiras como os rios que não pedem permissão para seguir com sua trajetória rumo ao mar. Nós, brasileiros, temos sim a maior fatia desse inigualável patrimônio da biodiversidade; água, clima, saberes ancestrais, mas enxergar a Amazônia sob a ótica do desenvolvimento sustentável, por mais desgastado que pareça estar esse conceito, exige transpor fronteiras, pensar fora da caixa. Em setembro de 2019, sete países amazônicos aprovaram o Pacto de Letícia. Representantes de Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru e Suriname se reuniram na cidade homônima, que fica na Colômbia, mas faz uma fronteira tríplice que inclui Brasil e Peru, e assinaram um acordo que estabelece 16 pontos nos quais concordaram em colaborar mutuamente, entre eles: combate ao desmatamento, uso sustentável dos recursos, enfrentamento de desastres naturais, incentivo à bioeconomia, etc. Apesar de ter nascido como uma política de enfrentamento aos graves incêndios que assolaram a região, o Pacto pretendeu ir além, como uma iniciativa plurinacional para a abordagem dos desafios e o aproveitamento das oportunidades. Mas será que conseguiu? Quais pontos exigem nossa atenção? O Pacto foi celebrado de forma genérica, apenas por governos, sem a participação das pessoas que vivem na Amazônia. Não há definições mais precisas do que é entendido como bioeconomia e como esta se relaciona com a população e a economia local; nem está claro quais são as metas assumidas para o desmatamento e para a restauração florestal e como enfrentar as atividades predatórias e a mudança do uso do solo pressionada por grandes vetores econômicos. Como melhorar a proteção dos defensores ambientais? Como garantir o respeito aos territórios indígenas? Como incorporar a visão de mundo amazônida, “o bem viver”, em detrimento da exploração capitalista sem medida? O Pacto de Letícia foi pensado de cima para baixo, ou seja, sem a participação das comunidades tradicionais, dos indígenas, das organizações socioambientais que atuam na região há anos. Como se um arquiteto lhe apresentasse um projeto para a sua casa sem conversar com você. Não há um processo transparente de participação no âmbito do planejamento e tampouco no monitoramento dos recursos e ações. O contexto de violação de direitos humanos e de crimes ambientais e fundiários pode ser agravado ainda mais se não houver monitoramento e governança adequados. Somente em 2020, a Amazônia perdeu quase 2,3 milhões de hectares de floresta primária nos nove países amazônicos, o que representa um aumento de 17% em relação ao ano anterior (2019), e o terceiro maior valor desde 2000. A insistência na implantação de mega infraestruturas como a UHE Belo Monte, por exemplo, também agrava as violações. No final de 2021, em torno de 70 organizações da sociedade dos países signatários do Pacto de Letícia e de outros países firmaram uma Carta de recomendações aos membros do Pacto. Entre as propostas prioritárias estão: – Estabelecer processo de diálogo multi-stakeholder para rever o Pacto e suas estratégias de implementação; – Tornar o planejamento do Pacto transparente a nível nacional e garantir mecanismos de monitoramento e avaliação participativos e independentes inclusive na implementação do mesmo; – Incluir instrumentos, estratégias e metas para garantir o reconhecimento e a regularização dos direitos territoriais dos povos indígenas e outras comunidades tradicionais; – Incluir iniciativas dos povos indígenas para a proteção da Amazônia; – Proteger os defensores ambientais e indígenas. Nesse aspecto, o acordo de Escazú é um elemento chave para o desenvolvimento do Pacto; – Incorporar uma visão inclusiva da bioeconomia, bem como, eliminar créditos e incentivos fiscais ao desmatamento, com apoio para a recuperação de áreas degradadas; – Construir uma estratégia clara e inovadora de infraestrutura sustentável e inclusiva em nível local e regional, incorporando lições para evitar a repetição de erros históricos, com prioridade para as necessidades e iniciativas de subsistência das comunidades amazônicas no campo e nas cidades. -A Iniciativa Amazônica do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, que foi aprovada na Terceira Reunião de Cúpula do Pacto de Letícia prevê o investimento direto via Fundo Verde do Clima (GCF) de U$ 279 milhões em Bioeconomia que, segundo critérios apresentados vai favorecer a agrofloresta sustentável, o cultivo de palmeira nativas, espécies nativas para produção madeireira, produtos florestais naturais não-madeireiros, aquicultura e turismo de natureza focado em comunidades locais. A luta é para que as populações que moram na Amazônia, nas cidades, nas aldeias, nas vilas; sejam elas indígenas, quilombolas, ribeirinhos ou organizações que lhes dão suporte, possam ter acesso a esses recursos, participar do processo de planejamento desses investimentos, de modo a manter uma consonância com os anseios locais e não olhar, passivamente, enquanto o capital avança sobre a floresta, sobre os recursos naturais e sobre os direitos humanos atendendo a meia dúzia de pessoas e grupos econômicos que muitas vezes nem a Amazônia conhecem. Esperamos que a infraestrutura seja para a Amazônia e suas populações e não na Amazônia, que possa atender às cadeias de valor e aos empreendimentos locais. No início da reunião anual do BID, neste 28 de março de 2022, a sociedade civil organizada dos países amazônicos fez um pronunciamento de alerta. A transparência, a governança e as salvaguardas apregoadas pelo BID precisam ser colocadas em prática e não ficarem penduradas em quadro na parede do departamento de Sustentabilidade – pra inglês ou indígena ver. * Claudio de Oliveira é jornalista, consultor do Instituto Centro de Vida/ICV, membro do GT Infraestrutura, mestre em Estudos de Cultura Contemporânea (ECCO/UFMT). Este artigo foi, originalmente, publicado no Um Só Planeta.  

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Da Amazônia gritamos pela paz

A guerra atual na Ucrânia é um evento de dimensão histórica que já está remodelando o sistema internacional nos níveis econômico, comercial, geopolítico, social e ambiental. Existem outras guerras e agressões armadas no planeta que também condenamos (Palestina, Somália, Síria, etc.), mas nenhuma delas tem o potencial de escalar e desencadear uma catástrofe nuclear com consequências imprevisíveis. Esta é uma guerra que está ocorrendo no contexto do ressurgimento das lutas inter-imperialistas. Da Amazônia fazemos um chamado à paz, exigimos o fim imediato dos bombardeios e a retirada das tropas russas da Ucrânia e somos solidários com o povo da Ucrânia. Não temos dúvidas de que a OTAN, com sua política expansionista e militarista, contribuiu fortemente para criar as condições para esta guerra, mas hoje é Putin quem está bombardeando, massacrando e forçando um êxodo de milhões de ucranianos. A invasão russa deve parar para que cessem as mortes e as negociações entre as partes leve à restauração da paz e à reconstrução da Ucrânia. Não estamos com nenhuma das potências imperialistas. Defendemos o fim de todas as armas nucleares e de destruição em massa dos EUA, Rússia, OTAN, China e de todos os sub-imperialismos regionais. A ideia de que a paz pode ser garantida através de armas é um absurdo que fracassou. Defendemos o desmantelamento da OTAN e de todas as alianças e iniciativas militares que promovem o armamento e a expansão de suas esferas de influência, a fim de supostamente garantir a paz. Convocamos à criação de um bloco mundial para a paz a partir da perspectiva dos povos contra todas as guerras e do distensionamento mundial. Queremos denunciar a toda a comunidade internacional que a guerra na Ucrânia está sendo usada para aprofundar a agressão contra a Amazônia e seus povos. A Amazônia está sofrendo a exacerbação das práticas mais conservadoras: nacionalismo, machismo, racismo, fanatismo religioso, individualismo e outros que geram e fortalecem regimes autoritários para melhor explorar os povos e a natureza. A Câmara dos Deputados busca aprovar, em regime de urgência, a Lei nº 191/20 que autoriza a mineração, extração de petróleo e atividades similares em territórios indígenas. A justificação de Bolsonaro é que a guerra na Ucrânia está colocando em risco o fornecimento de fertilizantes para o setor agroindustrial, apesar de ser sabido que os atuais estoques de potássio, em sua maioria localizados fora dos territórios indígenas, são suficientes para abastecer o Brasil por várias décadas. O que realmente se busca através destas leis é a expansão da mineração, particularmente da mineração de ouro, que se espalhou por toda a Amazônia. A Amazônia foi profundamente fragilizada pela crise sanitária e climática, à qual as potências nacionais e internacionais não foram capazes de dar uma resposta estrutural. A pandemia aprofundou o extrativismo e agora a guerra está acelerando ainda mais a expansão da fronteira agrícola e do agronegócio. Os altos preços de certas commodities (petróleo, ouro, alumínio, zinco, cereais, soja, carne e outros) estão fortalecendo o autoritarismo e as ações anti-indígenas para desapossar os povos amazônicos de seus territórios e apoderar-se dos recursos naturais. Nossa casa comum está sob ataque. Estamos testemunhando uma violação em larga escala dos direitos da Natureza na Amazônia e no mundo. A guerra está exacerbando o ecocídio, o etnocídio e provocando um novo genocídio. A militarização do planeta está fortalecendo as estruturas patriarcais onde reina a lei do mais forte e autoritárismo. A exploração da natureza e dos territórios é também a exploração dos corpos das mulheres e das comunidades feminizadas. Testemunhamos a masculinização patriarcal da sociedade, através da guerra, em vez de avançarmos em direção a uma eco-sociedade do cuidado, com respeito e reciprocidade com todas as vidas. A guerra na Ucrânia está produzindo um retrocesso da agenda climática e consumindo bilhões de dólares que são necessários para enfrentar a crise climática. Defendemos o corte dos orçamentos mundiais de guerra e defesa, utilizando esses recursos para enfrentar a crise ecológica e o agravamento da pobreza global. O último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC), que é um aviso terrível para a humanidade, foi ofuscado pela crise humanitária causada pelo bombardeio da Ucrânia. Países como a Alemanha estão discutindo a expansão da mineração de carvão para enfrentar a crise energética. O conflito militar encoraja as indústrias sujas de combustíveis fósseis e adia a ação global contra a crise climática. A busca da paz tem que acontecer em todos os níveis. Não pode haver paz na Terra se não houver paz com a Terra, se não houver paz com os povos indígenas, se não houver paz com as mulheres, se não houver paz com todas as culturas, se não houver paz com a natureza. Neste caminho, queremos chamar todas as organizações sociais do mundo a participar ativamente do processo em direção ao X Fórum Social Pan-Amazônico que acontecerá de 28 a 31 de julho em Belém do Pará, Brasil. A terrível crise da guerra deveria nos fazer refletir sobre alternativas estruturais e sistêmicas que levem a uma reengenharia do multilateralismo das Nações Unidas, que se mostrou anacrônica ao lidar com um conflito entre as potências com poder de veto no Conselho de Segurança da ONU. Assim como uma nova organização multilateral surgiu após a Segunda Guerra Mundial, após esta guerra e diante do agravamento das crises climática e ecológica, devemos construir um multilateralismo que incorpore não apenas os Estados em pé de igualdade, mas também os povos e a natureza. Nosso chamado pela paz é um apelo para repensar e reconstruir as estruturas internacionais, nacionais e locais que desencadeiam e alimentam a guerra e o autoritarismo em todos os níveis. ASSEMBLEIA MUNDIAL PARA A AMAZÔNIA 28 de março de 2022 Para se juntar ao clamor da Amazônia, preencha o formulário no link. Español English

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A água nossa de cada dia e as violações de direitos

Vários projetos os ameaçam no Norte do país, o que também prejudica o direito à água de quem vive na região. Saiba em que tipo de projetos deveríamos estar pensando Iremar Antonio Ferreira* Hoje, dia 22 de março, é o Dia Mundial da Água, um recurso que perpassa várias infraestruturas fundamentais para as comunidades de qualquer localidade. A data comemorativa é também um lembrete de que não temos muito a comemorar, especialmente na região da Amazônia. Além de boa parte da população ainda não ter acesso a serviços básicos, como água e esgoto, os rios da região estão ameaçados. Como explicar que viver cercado de água nem sempre significa ter água para beber? No primeiro episódio de 2022 do podcast Infraestrutura Sustentável, produção do GT Infraestrutura, eu conversei com o secretário executivo da rede, Sérgio Guimarães, sobre alguns desses motivos. Seja nas bacias dos rios Madeira ou do Xingu, nos rios Teles Pires, Tapajós ou Juruena, um conjunto de obras do governo federal tem provocado consequências irreparáveis nos direitos dos povos e populações que habitam esses territórios. Essas ameaças nos remetem a um processo de colonização desenfreada, desencadeada a partir da década de 1970, com motivações de ocupar para não integrar — lemas do regime militar —, numa tônica que prevalece até hoje. São grandes projetos, que “favorecem a nação”, sem pensar nas comunidades tradicionais, povos indígenas e migrantes que foram chegando à região. Desde então, a bacia do Rio Madeira vem sofrendo, desenfreadamente, ofensivas. Dentro de uma perspectiva desenvolvimentista e para atender a uma demanda energética sob o fantasma do “apagão”, no início dos anos 2000, começaram estudos para o chamado Complexo Hidrelétrico do Rio Madeira, que é uma dessas grandes ameaças, com licenciamento vicioso, que não considerou participação popular, para começar a citar os problemas. Essa obra também está associada à expansão de uma uma hidrovia, que, aos poucos, está se consolidando, para viabilizar o escoamento de soja, outro ponto que merece destaque, pois coloca veneno dentro dos rios. Os impactos já podem ser vistos. Há pouco tempo, o Rio Jamari transbordou, ocupando a BR 364 por três dias, resultado do desmatamento desenfreado, que acelera o processo de assoreamento. Esse conjunto de obras se somam gerando impactos e violações de direitos aos nossos povos e comunidades e afetam o direito à água. A água na Bacia do Rio Madeira está poluída e contaminada por essas intervenções mal feitas em nome desse “desenvolvimento”, que arranca as pessoas de seus lugares e se ocupa de um processo mercantilista de escoamento de riquezas, que deixa suas populações, literalmente, à margem. A cidade de Porto Velho, capital de Rondônia, não tem 2% de água tratada. Até lençol freático já está contaminado, o que nos leva também ao tema do saneamento básico, que afeta o direito à saúde da nossa população. Quem tem dinheiro compra água mineral, quem não tem usa a água que tem, muitas vezes contaminada. A insegurança alimentar e nutricional gerada a partir da implementação desses projetos é um outro problema pouco falado, mas grave. Toda a produção de várzea que as populações tinham, se perdeu, pois não temos mais o tempo das cheias naturais. As áreas ou estão extremamente secas ou alagadas antes da hora, porque quem domina o percurso dessas águas são as empresas. Temos hoje comunidades que vivem na beira do Rio Madeira e precisam comprar farinha na cidade porque não conseguem mais ter produção de mandioca. Nem peixe tem mais, pois o barramento do rio proibiu a migração natural das espécies que lá viviam. É importante lembrar que, na Amazônia, os rios também são estradas. E a implementação de hidrovias está afetando o direito de ir e vir das populações, principalmente para as pequenas embarcações, já que as grandes balsas, carregadas de petróleo e soja, estão destruindo o rio. Isso sem falar em um dos assuntos do momento: os garimpos ilegais. É muito mercúrio sendo jogado no Rio Madeira, que virou um depósito de contaminantes para alimentar uma cadeia produtiva. O problema aumenta porque, lamentavelmente, esta é uma atividade motivada por quem deveria fiscalizá-la, como nos mostra claramente este projeto que quer legalizar a extração de minérios em territórios indígenas. Tão grave, que diversos setores da economia que até poderiam se beneficiar disso, se manifestaram contra. O GT Infraestrutura trabalha com a “infraestrutura que queremos”, que diz respeito a projetos que atendam as pessoas da Amazônia e não que sejam apenas na Amazônia. Pensando nessa lógica, acredito que precisamos mudar a lógica atual, que é de saque. Temos que olhar para a floresta, com toda a sua diversidade, como um sujeito de direito. E, principalmente, a água. Nesse sentido, temos muito a aprender com os povos indígenas, que vêm demonstrando resistência há mais de 520 anos, junto com as populações tradicionais, que foram aprendendo a conviver com a natureza, respeitando-a. Sem esquecer que cuidar da floresta é também garantir chuva e água nos rios. Muito mais que um serviço ambiental, estamos falando de um serviço ecossistêmico que está ameaçado porque a Amazônia de hoje está perdendo milhares de hectares ano a ano e não é mais a mesma. Precisamos considerar a Amazônia como um todo, com seus povos e culturas e sua etnobiodiversidade, entendendo que ela é formada por ecossistemas diferentes e cada um tem o seu potencial. É preciso que as políticas públicas olhem para isso, garantindo os territórios, fundamentais para o equilíbrio do Brasil e do planeta como um todo, que precisa de uma floresta em pé, não deitada. As soluções já existem. Embarcações, por exemplo, podem funcionar com energia solar e não com combustível poluente. Nossas comunidades da beira do rio precisam de potabilizador de água para não continuarem tomando água contaminada. Ao invés de hidrelétricas, podemos investir em fontes de energia renováveis. Nós temos caminhos, mas é preciso ter esse carinho de olhar e ver que a Amazônia não é um balcão de negócio, mas é um grande negócio sim. Para o futuro, para a vida, não para alimentar lucro. Temos

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No ar: Iremar Ferreira fala sobre água e violações de direitos

Em primeiro episódio de 2022, membro-fundador do Instituto Madeira Vivo, conta como é viver às margens de um dos rios mais importantes da região Norte Em novo episódio do podcast Infraestrutura Sustentável, Sérgio Guimarães conversa com um Iremar Antonio Ferreira, do Instituto Madeira Vivo, sobre um assunto de fundamental importância para várias das pautas de infraestrutura: a água. Na semana do Dia Mundial da Água, dia 22 de março, o convidado lembra que não temos muito a comemorar, especialmente na região da Amazônia. Além de boa parte da população ainda não ter acesso a serviços básicos, como água e esgoto, os rios também estão ameaçados. Nas bacias dos rios Madeira ou do Xingu, nos rios Teles Pires, Tapajós ou Juruena, um conjunto de obras do governo federal tem provocado consequências irreparáveis nos direitos dos povos e populações que habitam esses territórios. Iremar explica como viver cercado de água nem sempre significa ter água para beber. Disponível no Spotify.

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Sinais trocados: a quem interessa novas grandes hidrelétricas na Amazônia?

Alessandra Mathyas, Sérgio Guimarães e Brent Millikan* Em meados de janeiro, duas notícias de certa forma antagônicas surpreenderam quem acompanha o setor energético brasileiro. A primeira foi a abertura de consulta pública do Plano Decenal de Energia – PDE 2031, desenvolvido por equipe multidisciplinar da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ligada ao Ministério de Minas e Energia. A outra, o anúncio da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) de prorrogação de estudos de viabilidade de três grandes hidrelétricas na Bacia do Tapajós. Por que esses dois fatos são antagônicos? Vamos discorrer. O PDE 2031 detalha em um capítulo inteiro sobre questões socioambientais, o impacto das mudanças climáticas no setor energético, fazendo alusão às “incertezas quanto à disponibilidade hídrica futura”. Segundo a análise apresentada no plano, “embora haja imprecisões e limitações dos modelos de projeção climática, há conclusões concretas de que ocorre uma mudança nos padrões de temperatura”, o que deverá acarretar “prováveis reflexos nas precipitações”. Soma-se aí a questão pluviométrica, a demanda pelo uso da água em outros setores e mudanças no uso e cobertura do solo (desmatamento), que afetam diretamente o regime de chuvas e as reservas subterrâneas que chegam aos rios. Ainda assim, o plano traz um cenário com oito novas usinas hidrelétricas previstas para entrarem em operação nos próximos dez anos. Os últimos dois anos já colocaram em xeque o parque gerador hídrico brasileiro. Não à toa foi necessário acionar mais térmicas, sobretudo desde julho de 2021, chegando a um montante de 26% do total de energia consumido no país (17 mil MWmed). As chuvas do fim do ano trouxeram um certo alívio na vazão e nos reservatórios, mas a população brasileira continua e continuará pagando a conta dessa geração termelétrica, em sua maioria fóssil — com fortes implicações para as emissões de gases de efeito estufa —, pelo menos nos próximos 5 anos. O que nos leva a concluir que fica muito difícil planejar à luz da disponibilidade dos reservatórios, sobretudo quando há excessiva dependência na hidroeletricidade, lembrando que estudos indicam que os efeitos do clima sobre o regime de chuvas e reservas hídricas serão cada vez maiores, com previsão de redução de vazões, inclusive na Amazônia. Anunciar agora estudos de mais três grandes hidrelétricas na Amazônia, além das três barragens mencionadas que já constam do PDE 2031, passa a impressão de que se trata de uma “medição da temperatura” de agentes do governo em ano eleitoral. Segundo notícias da ANEEL, as três usinas seriam localizadas no Rio Jamanxim, afluente do Rio Tapajós, sendo denominadas Jamanxim, Cachoeira do Caí e Cachoeira dos Patos, totalizando 2,2 MW de potência. Juntas as barragens alagariam mais de 60 mil hectares, inclusive áreas significativas do Território Indígena Sawre Muybu, do povo Munduruku, do Parque Nacional de Jamanxim e das Florestas Nacionais Jamanxim, Itaituba 1 e Itaituba 2. Na realidade, a ANEEL está tirando do baú projetos antigos, previstos há mais de dez anos como parte do chamado “Complexo Tapajós”, que incluiria grandes barragens polêmicas no eixo principal do rio Tapajós: São Luiz do Tapajós, Jatobá e Chacorão. Em 2016, o IBAMA suspendeu o licenciamento da UHE São Luiz do Tapajós, por graves falhas nos estudos de impacto ambiental, inclusive quanto a seus efeitos cumulativos com outros projetos. Somou-se à justificativa pela suspensão o fato de que alagaria parte do Território Indígena Sawre Muybu, resultando no deslocamento forçado de comunidades indígenas, o que seria inconstitucional. Nos últimos anos houve um esvaziamento de empresas internacionais, como a Engie (ex-GDF Suez) e a EDF do consórcio de empresas “Grupo de Estudos Tapajós” liderado pela Eletrobras, que estava conduzindo os estudos de impacto ambiental e viabilidade de grandes barragens. Agora, com a privatização da Eletrobras e ameaças de graves retrocessos na legislação sobre o licenciamento ambiental e direitos indígenas, há ainda mais dúvidas sobre a governança de tais projetos, gerando mais insegurança sobre riscos jurídicos, financeiros e de reputação, com fortes implicações para a atratividade desses projetos para investidores internacionais. Há ainda outros fatores que temperam esse caldeirão de contradições que tenta ressuscitar hidrelétricas já rejeitadas no passado. O Brasil cada vez mais quer entrar na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), mas para isso precisa seguir critérios socioambientais bastante rígidos. As questões jurídicas e judiciais que envolvem até hoje as últimas grandes usinas hidrelétricas na Amazônia (Santo Antônio, Jirau, Belo Monte, e Teles Pires, entre outras), somadas aos danos ambientais e à violação de direitos de povos originários são pontos negativos para o país. O Brasil estaria mesmo disposto a ampliar a negatividade no ambiente internacional ao continuar defendendo grandes hidrelétricas, num contexto de mudança climática acelerada e sobretudo num bioma já tão ameaçado? Bioma este que, por outro lado, dispõe de um potencial energético bastante grande para energia solar e as mais variadas fontes de biomassa? Estaria disposto a pôr em risco o bioma e seus habitantes, em disputas jurídicas intermináveis que atrasam e inviabilizam economicamente um empreendimento do porte de uma grande hidrelétrica e das linhas de transmissão necessárias? Lembremos que o custo inicial de Belo Monte foi de R$ 16 bilhões mas até a inauguração da última turbina, em 2019, já passava de R$ 40 bilhões, sem contar o valor do dano ambiental, orçado timidamente em mais de R$ 1 bilhão. Voltando ao PDE 2031, onde prevê-se para o decênio a insistência na construção das hidreletricas de Bem Querer, Tabajara e Castanheira na Amazônia, e tendo como supostos argumentos os custos da mudança do clima sobre o setor energético, não faz sentido, num ano eleitoral tão importante, que volte à baila a ameaça de grandes barragens em bacias hidrográficas já tão sensíveis a outros danos como o garimpo ilegal, o desmatamento, a perseguição a lideranças indígenas e comunitárias. As justificativas de que tais usinas também levariam desenvolvimento sustentável para a região, empregos, infraestrutura além de serem mais baratas que outras fontes, não se sustentam inclusive pelo histórico desse tipo de empreendimento na região. Os municípios sede dos empreendimentos têm IDHs mais baixos na região. E os empregos

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Como o agro se beneficia do desmatamento?

O desmate foi um elemento estruturante de consolidação da nossa economia agroexportadora no século passado e continua sendo prática corrente para expansão da fronteira agrícola nos dias de hoje *Jaqueline Ferreira A ministra Tereza Cristina já afirmou que não é mais necessário desmatar para produzir, assim como fizeram outros que ocuparam a pasta. Muitas lideranças do setor agropecuário dizem não ter nenhuma relação com o desmatamento e a expansão da fronteira agrícola porque não estão com a motosserra na mão. “É preciso prender quem desmata”, “é preciso coibir a grilagem de terras”, “nós seguimos o Código Florestal”, “se 90% do desmatamento é ilegal, bastaria aplicar a lei que tudo estaria resolvido”, afirmam. O que se omite nessa narrativa é que o destino da terra desmatada, legal ou ilegalmente, é o mercado de terras. Terra é um insumo fundamental para a produção agropecuária. E no caso do Brasil, a disponibilidade desse insumo parece não ter fim. Entre 1985 e 2020, desde o início do monitoramento sistemático do uso da terra no país, 82 milhões de hectares de vegetação nativa foram ao chão. No mesmo período, a área ocupada pela agropecuária teve um incremento total de 81 milhões de hectares. Não faltam evidências sobre o que vem acontecendo com as áreas desmatadas: viram pasto e área de cultivo agrícola. O desmatamento foi um elemento estruturante de consolidação da nossa economia agroexportadora no século passado e continua sendo prática corrente para expansão da fronteira agrícola nos dias de hoje. Mesmo em 2012, ano que registrou menores taxas de desmatamento, nós perdemos 4,6 mil km² de florestas nativas na Amazônia. Não é pouco. A expansão de área cultivada é uma estratégia do agronegócio brasileiro para aumentar sua produção e competitividade. Os cultivos mais modernos, que usam de alta tecnologia para produzir mais por hectare, como é o caso da soja, também apresentam tendência crescente de aumento da área cultivada. O estudo do Instituto Escolhas, Como o Agro se beneficia do desmatamento?, lançado na quinta-feira (17/02), traz dados relevantes para entendermos melhor esse imbricamento do setor com o desmatamento. Ao analisar o efeito econômico dessa prática sobre o preço da terra e dos produtos agropecuários, o estudo revela que o desmatamento ocorrido entre 2011 e 2014 desvalorizou o estoque de terra de 93,5% dos municípios brasileiros. Se ele não tivesse ocorrido, elas valeriam R$ 136,7 bilhões a mais em 2017. A depreciação foi maior nos municípios onde a fronteira agrícola expandiu, localizados em sua maioria na Amazônia Legal e na região conhecida como Matopiba – fronteiriça entre o Mato Grosso, Tocantins, Piauí e Bahia –, onde a depreciação do valor do estoque de terra chegou a 25%, o que soma mais de R$ 83 bilhões. 50% de toda a desvalorização da terra observada no país está concentrada em 61 municípios com esse perfil. O valor do hectare de terra em São Félix do Xingu, no Pará, município com maior depreciação verificada, foi de R$ 2.476 em 2017. Sem o desmatamento dos anos anteriores, o preço teria chegado a R$ 6.606 por hectare. O desconto significativo de R$ 4.130 por hectare beneficiou o produtor desse município que expandiu sua área de cultivo, mesmo que ele não tenha derrubado uma só árvore. O efeito também é sentido no preço das commodities, cujo principal produto afetado é a soja. O desmatamento provocou redução de R$ 3,10 no preço médio da saca de 60kg, o que se percebe de maneira mais intensa, mais uma vez, nos municípios em expansão da fronteira agrícola. Preços mais baixos de terra e de commodities trazem maior competitividade para o setor. O que o estudo mostra é que o desmatamento torna mais barato para o Brasil cumprir sua grande vocação na visão do agronegócio: fornecer soja e carne para o mundo. Entretanto, fica mais barato para uns produtores do que para outros, prejudica aqueles que não podem expandir sua área de cultivo e deprecia o ativo terra do país como um todo. A conta desastrosa nem leva em consideração a perda da biodiversidade e o agravamento da crise climática, que já prejudica a própria produção agropecuária. Também não considera que fatores de produtividade, como acesso a orientação técnica e infraestrutura, trazem ganhos muito maiores de competitividade do que o desmatamento pode trazer, conforme mostrou o estudo. Será mesmo que, para acabar com o desmatamento, basta aplicar a legislação existente? Enquanto o setor mais promissor do país, com grande representação nos poderes executivo e legislativo, não abandonar a lógica de operação que consiste em expansão de área, o problema vai continuar. Atos oficiais de regulação fundiária que premiam quem desmata e disponibilizam a entrada de novas áreas no mercado de terra precisam cessar. E se é o bolso que fala mais alto na hora de expandir a área cultivada, é pelo bolso que vamos conseguir constranger o setor a mudar. Já passou da hora de clientes e financiadores exigirem o fim do desmatamento nas cadeias produtivas do agronegócio brasileiro. Assim como, os inúmeros instrumentos de financiamento público – crédito, anistia de dívida, isenção fiscal, entre outros – precisam parar de beneficiar o produtor que desmata e seus compradores. *Jaqueline Ferreira é gerente de Portfólio do Instituto Escolhas Este artigo foi originalmente publicado na coluna do O Mundo Que Queremos, no Um Só Planeta.

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